sexta-feira, 30 de junho de 2017

Pergunta de Leitora - Teste




Já estou casada há 6 anos e estou completamente entediada. Não sinto mais prazer em cuidar da casa e nem do meu casamento. Posso dizer que estou bem insatisfeita com minha vida. Abandonei meu trabalho quando me casei e acabei virando uma dona de casa. Mas acho que posso esperar mais da vida e quem sabe até um novo amor, que seja muito mais quente. Acontece que estou pensando em me separar dele, pelo menos por um tempo, para saber de verdade o que está acontecendo. Acho que ele não é o homem da minha vida. Ele, primeiro, não aceitou, mas depois disse que se é isso mesmo que eu quero a gente pode fazer essa experiência. Ele facilitou as coisas, mas agora não sei por onde começar, mas sei que preciso mais da vida.

            Quando alguém está insatisfeito com a própria vida uma hipótese possível é que esse alguém possui fantasias de uma vida maravilhosa e perfeita, mas impossível de existir na realidade. A pessoa acaba se agarrando à fantasia, que é alucinação, e espera que a realidade seja como ela gostaria que fosse e não como ela é. Agora, pode ser também o fato de que você está vivendo abaixo de suas possibilidades, ou seja, de que possa realmente realizar mais na vida. É preciso que você descubra qual é o seu caso.
            Se você, realmente, acredita que precisa se separar para saber de si, é porque talvez você precise trilhar esse caminho para testar na vida real a força dos seus desejos. Para alguns essa maneira é a única possível, mesmo que assim corram riscos que podem, no futuro, não ter mais volta. Você tem uma vontade, muito intensa, de viver na vida real aquilo que você imagina, porém para realiza-la é preciso aceitar pagar todos os preços.
            Pode ser que ao viver essa sua vontade você descubra que tudo não passou de ilusão e retorne para o seu casamento. Entenderá, assim, que suas fantasias de uma vida maravilhosa não eram tão boas e caso retorne ao antigo relacionamento poderá viver de uma maneira mais real com seu companheiro. Porém, pode ser também que descubra que vivia aquém do que podia e ficará livre para ser quem de fato você é. Não há como saber de antemão o que vai se suceder.
            Agora, o que você pode levar em consideração é que um casamento de 6 anos não se deve abrir mão tão facilmente. É preciso refletir se você ter abandonado sua carreira não implicou em esperar que seu marido fosse responsável pela sua satisfação. Será que você não espera demais dele e o que ele, e ninguém mais, não tem como te dar? A falta de emoções e vitalidade que você sente atualmente não significa necessariamente que o problema esteja no casamento, mas como você o vem vivendo. Nesse caso se separar não vai resolver a sua vida. Enfim, a questão que você precisa se fazer é se é o casamento ou algo em você mesma que está te deixando entediada. Ao responder isso muitas coisas poderão ser iluminadas. Boa sorte.

segunda-feira, 26 de junho de 2017

Transar não é o mesmo que viver a Sexualidade



            Uma notícia me chamou a atenção para algo muito importante que vem acontecendo. Um garoto de apenas onze anos já é pai devido uma relação sexual com uma menina de treze anos. Essas duas crianças são pais biológicos de um bebê. Acredita-se que eles vivem a sexualidade precoce, mas talvez não seja tão simples assim.
            Um dia ouvi de uma diretora de escola que eles não precisavam de palestras sobre educação sexual porque os jovens já sabiam tudo sobre sexualidade, até mais do que ela mesma. Realmente acredito que os jovens saibam de muitas coisas mesmo, mas o que sabem nada tem a ver com a sexualidade de fato, mas apenas com a mecânica do ato sexual. Porque há uma diferença entre viver a sexualidade, poder pensar sobre ela e simplesmente transar por aí.
            Cada vez mais cedo os jovens fazem uso do sexo. Transam com todos, de todos os jeitos, sem ligar para doenças e perigos que uma vida sexual embute e nem ao menos se dão conta do que é uma sexualidade. Seus corpos reagem a estímulos, buscam o prazer e o alívio de tensões, mas são incapazes de poder lidar com a sexualidade já que não têm maturidade para isso. Em outras palavras, possuem sexo mas não a representação da sexualidade.
            O que a diretora da escola não entendeu é que esses jovens estão perdidos numa ditadura do prazer. O que procuram na sexualidade tem a ver com descarga de impulsos biológicos, mas nada a ver com o vivenciar uma relação e um contato com o outro e consigo mesmo. Essa dimensão da sexualidade está inacessível a esses pequenos que são bombardeados sobre as delícias do sexo, porém nada são preparados para enfrentar os problemas e demandas que uma vida sexual exige.
            Obviamente que esse dois jovens: a menina de treze e o menino de onze não têm a menor capacidade de serem pais. Afinal, eles nem mesmo sabem o que é ser casal, nem sabem o que é responsabilidade. São crianças que geram crianças. Ocorre que crianças necessitam de adultos para cuidar delas, pois crianças não cuidam de crianças. Onde será que estão os adultos na nossa sociedade? Talvez ainda sejam crianças, com medo de crescer e assumir responsabilidades. Esses “adultos” estão por toda a parte, com diversas idades cronológicas, buscando desesperadamente o prazer, mas sem capacidade para tolerar o que é de fato uma vida adulta. 

sexta-feira, 23 de junho de 2017

Pergunta de Leitor - Esbravejando



Sempre fui um profissional sério e comprometido. Nunca passei por cima de ninguém, nunca roubei, nunca corrompi, nunca menti para me dar bem. E o que acontece comigo? Não tenho dinheiro, tenho que muitas vezes engolir sapos, não tenho esperanças e perspectivas. Muita gente que sempre considerei que não tinham valor estão muito melhor do que eu. Estão até nadando em dinheiro, mas eu nada. Nunca nem sequer tive multa de trânsito e tudo isso para nada. Chego a pensar que devia me aproveitar das pessoas, mentir, roubar, enganar. Aí seria rico e respeitado. Estou cansado de ser bom e nada de bom acontecer para mim. Cansado dessa vida ingrata e injusta. O que me falta?


            O que lhe falta é compreensão, mas vamos por parte. Primeiro quem lhe impede de roubar, enganar, corromper, mentir, etc.? Se é isso que você quer vá em frente. Eu não vou pedir para você não fazer essas coisas. Elas estão aí ao seu alcance e basta você esticar o braço e se servir delas. Com certeza essas atitudes podem ser financeiramente muito lucrativas. Veja nossos políticos como nadam em dinheiro. Provavelmente será até admirado por muitos e quem sabe até poderá ter seguidores que vão ficar de queixo caído com seu “sucesso” e vão querer te imitar. Por que não?
            Nada nem mesmo o impede de se aproveitar das pessoas. Talvez se você fizer algo ilegal possa vir a ter problemas na justiça, mas muitos resolvem essa simples questão contratando “ótimos” advogados. É uma forma de se viver assim. O caminho está aí aberto, basta você decidir trilha-lo. Se você acha que isso vai lhe trazer alguma coisa não se acanhe, siga adiante e pisa em tudo.
            Agora, o que não dá é para você esperar ser ético e querer ser recompensado por isso. Será que você quer ser ético para ganhar algo em troca? Se for está se enganando e é aí que reside sua falta de compreensão. A única recompensa que a ética gera é a própria ética e nada mais. Se está barganhando com a vida no modelo “vou ser bom para receber coisas boas” está perdendo tempo. Até porque nem seria ética, mas uma máscara de ética. Há um abismo de diferenças entre a ética de fato e a pseudo ética que é sempre interesseira.
            A gente deve viver eticamente não se utilizando de meios escusos não porque isso não se faz ou porque seja moralmente incorreto, mas porque não conseguiria viver de outro jeito. Aí pode-se fazer o bem somente pelo bem que isso significa e representa sem querer recompensas futuras. Essa é a única maneira de se viver eticamente. O resto é puro comércio e encenação.
            Levar uma vida ética não significa ter que sofrer misérias. Esse parece ser outro equívoco que você comete. Que tal ao invés de maldizer a vida você repensar como vem se relacionando com sua parte profissional para que entenda o que não está te satisfazendo? Talvez assim você seja mais justo com você e possa fazer de fato algo que te tire da sua atual posição. 

segunda-feira, 19 de junho de 2017

A Boa Morte



Quase todos, claro que há exceções, nascemos em hospitais com ajuda de enfermeiros e médicos. Temos toda uma assistência que traz da melhor forma possível um pequeno bebê ao mundo. Não só o bebê se beneficia dessa ajuda como também a mãe e todos os outros parentes envolvidos e ansiosos quando um parto está para ocorrer. Uma gestante, sozinha, até pode ter condições de parir e tudo ir bem, mas o sentimento de medo seria massacrante e desumano de forma que não medimos esforços para ajudar alguém nascer. E para morrer? Será que não poderíamos em alguns casos receber ajuda?
            A palavra eutanásia vem do grego e significa a boa morte. Define-se eutanásia como o ato de proporcionar morte sem sofrimento a um doente atingido por afecção incurável que produz dores intensas. Em outras palavras: é quando a vida já não é mais vida e passa a ser intolerável e desumana trazendo sofrimentos e desesperança destruidores. Entretanto, falar em eutanásia é o mesmo que mexer no vespeiro, pois desperta medos em muita gente.
            Médicos são, geralmente, contra a eutanásia. Ao meu ver isso tem a ver com o narcisismo deles já que muitos médicos tem  o interesse de apenas prolongar indefinidamente a vida como se assim vencessem a morte. A grande verdade é que morrer não é indigno, ao contrário, a própria natureza nos proporciona a morte tornando-a uma benção quando a vida já não se faz mais possível. Indigno é viver de maneira desumana ou prolongar-se naquilo que não é a vida, mas um arremedo dela.
            Cada um é responsável por si e por suas decisões. Se uma pessoa decide que não quer prolongar-se artificialmente ou continuar suportando dores infernais ela tem o direito de assim decidir. E por que ela não poderia receber ajuda para tal? Se recebemos ajuda para nascer por que não poderíamos ser ajudados a morrer dignamente em casos específicos? Infelizmente o preconceito e a ignorância afirmam que isso não se faz e ponto; e todo o debate necessário para essa questão fica censurado e envolto em véus de tabu.
            Mas quem vai decidir quando um caso não dá mais esperanças de vida e recuperação? Qual a fronteira entre um ato de humanidade de alívio aos sofrimentos para de um simples assassinato? Por isso que o debate se faz necessário e vital. No entanto, debater requer não se guiar por preconceitos, crenças religiosas e afirmações prontas, mas se abrir ao que nos torna verdadeiramente humanos. Por seus medos e ignorâncias a humanidade e muitos profissionais que deveriam se manter abertos prestam um desserviço e geram muitos sofrimentos desnecessários. Canadá, Suíça e Holanda são países onde a eutanásia é permitida e neles essas questões foram e ainda são debatidas seriamente e o que move essas discussões é colocar, acima de tudo, a dignidade humana como ponto principal. 

sexta-feira, 16 de junho de 2017

Pergunta de Leitor - Em Cima do Muro




Minha mãe não gosta da menina que eu namoro. Ela diz que minha namorada é muito simplória e não é de família rica e que vou me arrepender se eu um dia casar com ela. Minha mãe diz que ela só quer saber de subir na vida. Acontece que nós já namoramos uns cinco anos e durante o namoro minha mãe nunca reclamou dela. Mas agora que falamos em casamento ela ficou brava e irritada. Não sei como fazer minha mãe gostar dela. Não quero me separar de nenhuma das duas, mas me parece ser algo impossível. Tenho medo de desagradar minha mãe porque sou financeiramente dependente dela. Nunca trabalhei e já tenho dois cursos universitários e estou estudando o terceiro. Tenho 34 anos, mas ainda preciso pedir dinheiro para a minha mãe para tudo. Pensei que se eu cassasse poderia morar na casa da minha mãe que é grande, mas agora acho que ela não deixaria. Minha namorada está cansada de esperar e quer que eu assuma um relacionamento sério. Não sei mais o que fazer.

            Seu problema parece ser menos o que fazer em relação à sua namorada e sua mãe e mais o que fazer em relação a você mesmo. Sua mãe quer uma coisa e sua namorada quer outra, mas você parece não saber o que quer. Fica dividido e numa posição muito mais característica da criança do que a do homem adulto.
            Já está no terceiro curso universitário, mas nunca trabalhou e aos 34 anos é dependente da mãe. Qual será essa posição que você atualmente ocupa? E por que precisa ser assim? Provavelmente a dependência a que você se refere não é apenas a financeira, mas outro tipo de dependência que tem mais a ver com as ansiedades de separação. O seu problema é de se separar, seja de quem for, porque não suporta cuidar de si.
            Quem evita se separar não é capaz de construir uma identidade própria. Em outras palavras, não é capaz de crescer, já que crescer implica o processo de separação. O fato de você não trabalhar e se dedicar apenas aos estudos demonstra, provavelmente, que você evita trabalhar em sua vida interna, na construção da sua identidade. Parece que você evita assumir responsabilidades para ser quem de fato você pode ser. Sua namorada, aparentemente, já percebeu isso, tanto que quer que você se decida em assumir um relacionamento. Caso ela não fizesse isso estaria desperdiçando tempo e a vida é feita de tempo.
            E que estória é essa de botar uma “futura” esposa e sua mãe na mesma casa? Nunca ouviu o ditado Quem casa quer casa? Seria uma baita confusão caso isso acontecesse, mesmo se sua mãe gostasse de sua mulher. Chega uma hora na vida que é preciso sair de cima do muro e assumir responsabilidades e pagar o preço por elas. O problema é que você nunca pagou preço nenhum e tenta viver evitando pagar. A consequência dessa atitude é não se tornar de fato um homem, mas ficar sempre identificado com a posição infantil. Crescer é difícil, doloroso e assustador, porém é sempre melhor do que ficar estagnado numa posição que não lhe acrescenta nada.

segunda-feira, 12 de junho de 2017

A Grande Lição




            Um famoso mestre foi convidado a proferir uma palestra numa grande universidade sobre como atingir a iluminação. Às 8 horas da manhã, horário marcado, a sala estava repleta de gente para ouvir as sábias palavras do mestre. No entanto ele não veio e em seu lugar apareceu um assistente que disse a todos que o mestre havia acabado de acordar e já estava vindo. Muitos ficaram bravos e foram embora. Depois de umas três horas o assistente veio de novo e disse que o mestre no caminho para universidade viu um lindo parque e parou para admirar a paisagem. Mais pessoas saíram revoltadas. Depois foi hora do almoço e o mestre mandou dizer que precisava comer algo. Cada vez mais a plateia foi esvaziando. Depois do almoço o mestre tirou uma soneca e só lá pelas 4 horas da tarde ele surgiu cambaleando como bêbado. Quando viram isso o pouco de gente que havia se retiraram ultrajados. Restaram apenas 4 pessoas para ouvir o mestre e este parando de cambalear disse: “Para quem quer encontrar a iluminação, que é um longo caminho, é preciso primeiro aprender a lição de superar os desapontamentos que sempre irão surgir.”
            Se entendermos iluminação como desenvolvimento é mesmo um longo caminho. Aliás, uma vida inteira. Desenvolver-se é trabalho diário e contínuo, sem nunca chegar ao fim. Obviamente nesse longo percurso muitas adversidades surgirão trazendo incômodo e aborrecimentos. Infelizmente, no entanto, muita gente espera que tudo seja muito fácil e rápido e desistem muito prontamente por não suportarem as frustrações.
            Essa parábola acima é um modelo para pensarmos como nos relacionamos com aquilo que frustra e que destrói as expectativas. Não é para ser tomada literalmente, afinal uma pessoa não ser pontual é falta de respeito mesmo. Mas como modelo para pensar ela nos mostra que serão muitas as vezes que teremos que suportar as frustrações para conseguir algo. Quem não aprende isso fica sem condições para se desenvolver.
            Somos muito mal acostumados na vida e achamos que as coisas tem que acontecer como queremos somente porque assim desejamos. Portar-se assim é viver de maneira imatura e ineficaz. Será que você se permite tolerar algumas frustrações para seguir adiante? 

sexta-feira, 9 de junho de 2017

Pergunta de Leitora - Resgate de Si Mesma




Não sei o que me acontece, não sei quem sou. Sempre me vejo pior que todas as outras pessoas e isso faz eu ter raiva de  mim mesma. Fico sempre à espera que alguém me elogie, que alguém me note e que alguém me admire, mas isso nunca acontece. Tenho insegurança para tudo, até mesmo para comprar uma roupa. Chego a comprar uma calça jeans, por exemplo, e percebo que assim que comprei quero trocá-la. Muitas atendentes de loja já perderam a paciência comigo. E se eu visto algo e alguém diz que não me ficou bom eu fico destruída e não uso mais. Passo adiante. Pareço calma e tranquila para muitos dos meus conhecidos, mas por dentro sou um vulcão que está sempre em erupção e me queimando por dentro. Por dentro eu me xingo e me viro de ponta cabeça. Não sinto que posso contar com ninguém. Será que a psicanálise me ajudaria, como me ajudaria?

            Hoje você se percebe longe de si mesma, cheia de auto ódio e rejeição. Ninguém consegue viver assim, no máximo se sobrevive e com uma qualidade muito baixa. Você se encontra dependente do seu meio e das pessoas dele, não podendo pensar por si mesma. A auto corrosão é coisa séria e altamente destrutiva. Falta-lhe conhecer alguém muito importante para a sua vida: você mesma!
            É aí que entra a psicanálise. A tarefa de um tratamento psicanalítico é ajudar o analisando a conhecer a si mesmo e construir consigo um relacionamento mais favorável e benéfico. A psicanálise entende que se não tivermos um bom casamento conosco a vida se torna impossível. Dos outros e até mesmo de outros grupos podemos nos separar, mas de nós mesmo isso não tem como ocorrer, portanto a única via possível para o nosso bem estar é aprendermos a contar conosco.
            Quem não conta consigo próprio adoece com muito mais facilidade, pois fica enfraquecida e submetida às opiniões e valores de fora, mesmo que estes não sejam favoráveis e nem criem condições de crescimento. A sua insegurança se dá porque você não pode contar com recursos internos, ficando dependendo das pessoas a sua volta para lhe dizer o que é bom ou não. Recursos psíquicos são desenvolvidos e nunca vêm prontos e eles não vão lhe dizer o que é certo ou errado em termos morais, mas em termos do que lhe sejam favoráveis para o seu desenvolvimento.
            A coisa mais importante ao você entrar em um processo analítico é você ser apresentada a você mesma. Ao “casar” consigo poderá fazer um melhor uso das suas potencialidades e contará mais com sua própria mente. Você poderá ficar mais livre e independente. Ser apresentada à sua própria natureza interna permitirá que você saiba como tirar mais vantagem de si e deixar de lado a necessidade de encontrar afirmação fora e através dos outros. A tarefa de uma psicanálise é ajuda-la a descobrir e a desenvolver os seus próprios recursos, para que assim você possa ser você mesma. Não perca tempo, pois o tempo é uma das poucas coisas na vida que não temos como recuperar. 

segunda-feira, 5 de junho de 2017

Calamidade




            A droga representa um sério problema de saúde pública que não temos como fechar os olhos. Muitas vezes tendemos a achar que as drogas não são tão problemáticas assim, mas quando alguém próximo, amigo ou da família, aparece com problemas em relação às drogas acordamos assustados e impotentes frente a essa questão que vem cada vez mais se ampliando. Ficar dependente das drogas atinge todas as classes sociais e causa um estrago na economia do país, na organização da família e na vida emocional de muitas pessoas. Enfim, temos que abrir os olhos sem demora.
            Muitos repetem como mantra que as drogas destroem lares e famílias, bem como pessoas que antes do envolvimento com as drogas eram sérias. A verdade não é tão simples assim. A droga não transforma ninguém, ela não tem esse poder. Agora, o poder que ela tem e que é devastador é que ela intensifica o que já existe no sujeito. Em outras palavras, se um dado indivíduo tiver conteúdos muito destrutivos dentro de si, ao fazer uso da droga essa destrutividade interna será potencializada e isso, sim, será devastador. No entanto, o que precisamos perguntar é: quem são essas pessoas que ficam dependentes das drogas?
            Não é fácil responder uma pergunta tão abrangente assim por uma razão muito especial, dentre muitas outras. É que o ser humano não pode ser simplificado de maneira leviana, sendo que há inúmeros aspectos em uma vida que não temos como colocar em palavras e descrever. Mas podemos arriscar dizer que as pessoas que acabam nas drogas estão com seu mundo interno todo bagunçado, para não dizer enlouquecido. E aquelas pessoas que pareciam tão sérias antes das drogas? Como caíram nessa? Bem, a resposta pode ser justamente que elas pareciam estar bem organizadas e estruturadas, porém não eram tão estruturadas assim.
            O problema com as drogas não será resolvido apenas com ações policiais e jurídicas. As drogas são um problema que concerne uma educação sentimental. Esta não tem nada a ver com a educação acadêmica e intelectual, mas com a forma com que as pessoas lidam com suas emoções e sentimentos. A educação sentimental tem relação com a maneira que nos organizamos internamente. Podemos mirar no tráfico, nas punições, mas enquanto não houver uma mudança de consciência de todos as drogas sempre continuarão a ser um problema. Claro que é um trabalho que demanda tempo e persistência, mas que devemos começar agora. Deixo a pergunta: será que são as drogas que são destrutivas ou somos nós?

sexta-feira, 2 de junho de 2017

Pergunta de Leitora - Mulher ou Super Heroína?




Não tenho paz na minha vida. Sinto que tenho que dar conta de muitas coisas ao mesmo tempo. No meu trabalho sinto que preciso ser extremamente produtiva. Afinal não quero que ninguém me diga que faço corpo mole. Com meus filhos sinto que preciso ser a mãe perfeita, ver se eles estão bem, se estão arrumados, alimentados, estão em dia com a escola, etc. com meu marido sinto que tenho que ser uma esposa modelo, satisfazê-lo, ser companheira, estar sempre muito bonita. Sou síndica também do meu prédio e isso me deixa com mais tarefas a serem cumpridas de maneira eficiente. Enfim, é muita coisa, mas não sei como diminuir e ser mais tranquila. Quando penso que quero desistir me sinto culpada e volto a ser ao que era antes com mais afinco e isso está ficando insustentável. Se pudesse eu deixaria de dormir para dar contas de tantos afazeres. Por que será que eu não consigo relaxar, queria tanto ser como as outras pessoas comuns.

            Você parece querer ser a mulher maravilha. Sente que tem que ser uma super mãe, uma super trabalhadora, uma super esposa e uma super síndica. Talvez almeje até mesmo ser mais super em outras áreas de sua vida que não tenha mencionado aqui. O problema é que na imaginação a gente pode ser super em tudo, mas com a realidade é outra história. Hoje você precisa aprender a diferenciar sobre o que existe na fantasia e o que pode existir na realidade.
            Quem vive a fantasia com se esta fosse a realidade acaba sofrendo dores e desilusões desnecessárias porque isso faz com que se deseje dar conta de uma vida que não é real. Seu problema está em poder aceitar os limites. Hoje você gostaria de poder quebra-los, mas isso faria de você uma super heroína e não uma mera humana. Quando uma pessoa não aceita os limites da vida é porque tem dentro de si uma criança que nega ser adulta e que se apega a fantasia. Essa criança vai querer ou receber de tudo e ser completamente satisfeita ou vai querer dar de tudo e satisfazer totalmente as expectativas dos outros. Ambos os casos causam muitos problemas.
            No seu caso, que tem mais a ver com o desejar atingir a total satisfação dos outros, faz com que você fique intensamente focada a dar mais do que o necessário. Todas as áreas da sua vida tornam-se um constante e obrigatório se doar além da medida e a um custo muito alto. E se você não faz se sente culpada. Se isso está ocorrendo é porque essa criança que não aprendeu limites está influenciando em demasia o seu lado adulto. Mas a questão que você precisa se fazer é se você aceita ser uma adulta normal e não a super heroína da fantasia.
            A sua última frase do email é bastante interessante para pensarmos o quanto você quer se sentir mais e maior do que uma pessoa pode ser. Você disse “queria tanto ser como as outras pessoas comuns” como se na verdade houvesse uma separação entre você e os outros. No entanto não há. O que há é da dimensão alucinatória da sua fantasia que tenta (e sempre será sem sucesso) separar você do resto da humanidade. Aceitar os limites é saudável e mostra que na vida nem tudo podemos e devemos.