sexta-feira, 29 de maio de 2015

Pergunta de Leitora - Preparação


Quando vejo o noticiário fico horrorizada. É tanta coisa ruim acontecendo que não dá nem para falar. Tenho uma filha de 13 anos e fico com muito medo do futuro dela. As meninas hoje em dia começam a vida sexual cada vez mais cedo. Tenho medo disso. Não quero que isso se repita com minha filha e quero proteger ela de qualquer erro que venha a se arrepender. Não deixo ela ver nada que tenha sexo na TV e na internet, pois fico sempre em cima dela. Quero que a sexualidade seja algo normal para ela e não forçado. Minha irmã diz que eu exagero, o que acha? Ando muito preocupada.

            O que mais me chamou atenção em seu email foi a sua frase “não quero que isso se repita com ela”. Repetir significa que isso já aconteceu antes. De quem você está falando? De uma experiência sua ou falou de forma geral? Sua intensa preocupação deixa tudo confuso e sem saber de quem o do que está se referindo e isso, provavelmente, deve confundir a sua filha também.
            Consigo entender a sua preocupação com o futuro de sua filha, mas o que fica difícil compreender é o excesso de preocupação que se transformou em medo e até certeza de que algo muito ruim está por vir. Preocupações permeiam toda mãe, mas essa quase certeza de algo ruim e essa tentativa de controle sobre o que sua filha vai viver parece muito mais coisa da sua fantasia, ou seja, está mais na sua mente do que na realidade.
       Você não vai conseguir proteger sua filha controlando obssessivamente o que ela vê ou deixa de ver. Isso, aliás, pode até piorar a situação, pois é um fato que nos sentimos atraídos por conhecer aquilo que é tão proibido e criticado. Você pode protegê-la até um certo ponto, depois disso se torna impossível, já que o mundo é grande demais e sua filha nem sempre ficará sob o seu controle. A melhor proteção que os pais podem dar aos filhos é a educação, é prepará-los para o mundo que enfrentarão. Dar educação a sua filha e sempre conversar com ela sobre a vida está dentro das suas possibilidades
Não temos meios de controlar como tudo vai ser e aceitar isso pode nos trazer paz. O mundo parece ser assustador demais para você e você está tentando, de todas as maneiras, passar esse medo para a sua filha como se isso fosse preservá-la da vida. Isso é um mau negócio pois apresenta para ela que o melhor recurso para se viver a vida é o medo e não a preparação. Você vai precisar aprender a lidar com suas angústias de forma mais eficiente e confiar que sua filha será esperta o suficiente para enfrentar o que tiver que ser enfrentado. Mais do que isso é prepará-la para o medo e não para a vida.

segunda-feira, 25 de maio de 2015

O Minuto de cada Dia


            Um dia após o atentado às torres gêmeas em 11 de setembro de 2001, o marido de uma das aeromoças que trabalhava em um dos aviões que se chocou nos prédios escreveu uma carta a ela que aqui reproduzo:
            “Se eu soubesse que seria a última vez que veria você sair pela porta, eu teria te chamado de volta, para te abraçar e beijar uma vez mais. Eu teria gastado mais um minuto para dizer: EU TE AMO, em vez de pensar que você já soubesse disso. Eu teria ficado ao seu lado, compartilhando cada minuto em vez de pensar: outras ocasiões virão, então posso deixar passar esse dia, pois sempre haverá um amanhã. O dia de amanhã não está prometido a ninguém e hoje pode ser a sua última oportunidade de abraçar alguém apertado. Por que não fazer agora? Se o amanhã não vier você se arrependerá de não ter tido tempo para mais um abraço, mais um beijo. Fazer isso nunca vai ser perda de tempo.”
            Esse marido apaixonado e entristecido pôde compreender a importância do momento presente. Só podemos viver no tempo presente, só podemos lidar com o aqui e agora. Vivemos, muitas vezes, como se fossemos eternos e como tais que não precisássemos pensar no presente já que teríamos todo o tempo do mundo para fazer o que desejamos. Não é assim.
            Como diz o ditado popular “o amanhã a Deus pertence” e com isso devemos entender que não temos todo o tempo do mundo e que é muito mais proveitoso tirar o melhor proveito que podemos daquilo que temos agora. Nossos relacionamentos, nossos amores devem ser vividos de coração aberto, pois nunca sabemos como será o dia de amanhã. Cultivar nosso tempo presente é o mesmo que se precaver de qualquer arrependimento por não termos aproveitado cada minuto de nossa vida.

sexta-feira, 22 de maio de 2015

Pergunta de Leitor - Repetir o personagem


Me chamam de machista e pode ser que eu seja mesmo. Sou mulherengo e não quero assumir relacionamento algum. Só quero sexo e nada mais. Com algumas fico algumas vezes mas depois quero sempre uma nova conquista, um novo desafio. Muitas mulheres até tentam ter algo sério comigo mas não abro brecha e pulo fora. E a questão que aqui escrevo é por que sou assim? Todos, uma hora ou outra, querem um relacionamento, sossegar, mas eu não. Eu fujo.

            Você foge, você diz, mas talvez esteja também se perguntando se não poderia ser diferente. Está se indagando e se mostrando intrigado com a forma que vive provavelmente porque, hoje, se pergunta o que lhe acontece e porque é assim como é. Em outras palavras, seguir vivendo se repetindo não mais está sendo tão satisfatório assim.
            Quando há fuga é porque primeiro houve o medo que levou à atitude de fugir. Portanto, não é surpreendente pensar que você foge porque teme e possivelmente teme o relacionamento com as mulheres. Elas parecem representar uma ameaça e você resolve esta ameaça apenas ficando, mas sem se envolver. Mostra que trata as mulheres como objeto, como uma maneira de ter controle sobre elas. Assim assegura-se de ter a sensação de que é você que manda e representa uma ameaça para elas. Essa solução, desastrada, foi a que encontrou para lidar com suas angústias.
            Agora, vem percebendo que há algo aí. Algo que ainda não pôde ser devidamente compreendido e menos ainda solucionado. Isso ocorre porque a solução criada era a repetição e ninguém tem como estar bem se repetindo infinitamente. Você age como um personagem que está impedido de abandonar o palco e viver a própria vida de maneira livre. Tem que repetir suas falas e suas atitudes. Está escravo do próprio inconsciente.
            Para por um fim ao impulso que te leva a se repetir precisa encontrar respostas que te levarão a um entendimento do por que tem tanto medo assim da mulher e do envolvimento. Qual o sentido que você deu para tudo isso? O seu inconsciente pede por decifração e por isso não perca tempo. Busque ajuda para aprender a se escutar e a se decifrar para que assim você possa abandonar o personagem que você criou e ser você mesmo.

segunda-feira, 18 de maio de 2015

A tal da meia-idade


            Muito se fala na tal da crise da meia-idade que acomete tanto os homens quanto as mulheres, os deixando meio atordoados e que traz muita desesperança com a vida como se ela tivesse chegado a um ponto final e mais nada interessante pudesse ocorrer. Afinal, essa crise existe? E o que ela é e como se dá?
            Quando uma pessoa atinge a década dos quarenta começa a perceber variadas mudanças em sua vida. A juventude, que propicia um maravilhoso vigor físico e muita ousadia, vai se acabando e nos tornando mais realistas e menos ingênuos. O corpo já não é mais o mesmo e dores e males antes inexistentes aparecem nos avisando que o tempo passa. Essas mudanças, que nos trazem limitações físicas, nos assustam porque jogam em nossas caras que temos prazo de validade e que ao contrário do que acreditávamos quando jovens não temos todo o tempo do mundo e nem tudo podemos.
            Tornar-se consciente dessas mudanças e limitações causa algo em nós. Mexe com o que conhecíamos e impõe que mudemos internamente, ou seja, nos demanda um trabalho interno para construirmos novos valores e formas de vir a ser. Muitas pessoas, tão apegadas ao que foram e com medo do que podem ser, negam as mudanças que se apresentam e tentam viver como antes, como se o tempo não passasse e pudesse ser controlado com atitudes que os levariam à vida anterior. Tentam, forçosamente, parecerem adolescentes através da fala, das atitudes, das vestimentas e da visão de mundo.
            Contudo, ao mesmo tempo que a passagem do tempo nos tira a força física e impõe limites, temos a maravilhosa oportunidade de criarmos uma nova mente, que permita enxergar a vida com novos olhos. Com as experiências de vida podemos perceber que não há só perdas em ganhar idade, mas ganhos que se encontram na dimensão subjetiva. Sair, então, da crise da meia-idade é poder fazer uso dos ganhos internos que a vida nos proporciona e criar uma vida nova, mas agora não mais baseada nos arroubos e ilusões juvenis, mas na sabedoria que o tempo nos presenteia. 

sexta-feira, 15 de maio de 2015

Pergunta de Leitora - Juntos até na dor


Minha mãe está doente e logo vai morrer. Meus filhos pequenos viveram muito com ela e a amam imensamente. Já conversei com eles que a vovó está mal e que logo ela não mais estará conosco. Eles não entendem bem isso, são pequenos, tem 8 e 5 anos. Eles já sentem a falta dela. Não quero que meus filhos fiquem frustrados com a morte dela e fiquem machucados. Alguns dizem que é melhor não deixá-los ir ao velório, mas eles já disseram que querem ir. Minha mãe está na fase terminal de um câncer severo, por isso sei que a morte dela é próxima e certa, mas não sei que fazer em relação aos meus filhos e o velório. Será que é muito ruim eles irem? Meus irmãos são contra, mas quando perguntei para minha mãe, e eu converso até sobre isso com ela, ela me disse para eu seguir o que tenho vontade, mas que ela acredita que não há mal nenhum e só quer o nosso bem. O que fazer? Por favor escolha meu e-mail para responder.

            Que bom que tenha uma mãe sábia que lhe permita espaço para você tomar as suas decisões sem nenhuma imposição. É maravilhoso que você consiga conversar com ela sobre tantos assuntos, até mesmo os mais dolorosos. Nem sempre assuntos que trazem dor são vivenciados, mas são negados como se não falar deles significasse que eles não existissem. A morte é mais uma coisa da vida, inevitável e incontrolável. Fugir de falar sobre ela, quando necessário, não é bom e só torna tudo pior.
            Assim como não devemos evitar o assunto da morte, mesmo daqueles que nos são queridos, as crianças também têm o direito de vivenciar algo tão natural quanto complexo. Velório e falar sobre a morte jamais devem ser impostos às crianças, mas quando elas manifestam interesse e curiosidade elas devem ser acolhidas. Seus filhos viveram com sua mãe, amam-na como você bem o disse, então por que privá-los de viver todo o processo?
            Esconder algo tão importante assim de uma criança que quer saber o que está se passando com quem ama é dificultar o entendimento da vida. Perdas fazem parte da vida de qualquer um, inclusive das crianças e quanto mais a perda puder ser sentida como algo natural à vida, mais compreensão poderá advir. Frustrações são elementos da vida e se nos propusermos a resguardar fortemente as crianças das frustrações inevitáveis estaremos fazendo mal ao seu desenvolvimento.
            Há a idéia de que uma criança não tem como acolher o conceito de morte, mas isso é uma falsidade. Se seus filhos querem viver esse processo de despedida da avó é o direito deles. Você pode acolhê-los nesse momento e estar com eles. A dor é de todos vocês e se vocês puderem se apoiar estarão promovendo o amor e a compreensão. Por que separar quando vocês podem viver algo que certamente é importante e que pertence a vocês? A vida vivida junto, até mesmo nos momentos difíceis, é sempre mais rica.

segunda-feira, 11 de maio de 2015

Preciosidade


            Quando se pensa no que é perder a vida vem à cabeça a questão da morte, mas não é bem assim. O problema é que a morte é sempre fonte de muito temor e as pessoas, de forma geral, não lidam bem com ela, como se morrer fosse algo não natural e cheio de tragédia. A natureza nos ensina que a morte é um fato e de que tudo que vive passará por ela. Existe, entretanto, algo que realmente traz perda para a vida e essa perda sim é lamentável e triste. Perda de tempo.
            Perde-se muito tempo com coisas sem importância. Há pessoas que dão tanto valor às coisas insignificantes e que no fundo não têm nenhuma serventia e com esse ato perdem um tempo precioso. As questões que mais desperdiçam a vida das pessoas são pequenas e ligadas ao narcisismo. Há demasiada preocupação com o poder e com a própria auto-importância que são muitos que se esquecem de viver realmente.
            A grande verdade é que o tempo de vida é curto, o que torna vital aproveitar esse tempo da melhor maneira possível e deixar de lado insignificâncias. É bastante frequente desejarmos errado, ou seja, desejamos coisas que na realidade não precisamos e com isso abrimos mão de desejar aquilo que pode nos trazer algo e enriquecer o sentido da vida. Valorizamos uma vida aparente de sucesso e nos esquecemos de construir um caráter e um mundo melhor para os outros e para nós mesmos. O egoísmo impede uma melhor apreciação da vida.
            A morte não devia nos assustar já que é parte do mundo natural e é o destino de todos nós, queiramos ou não. O que devia, sim, nos assustar é a perda de vida que muitas vezes empreendemos. Passar pela jornada que é a vida sem procurar por sentidos e significados é desperdiçar uma viagem e uma oportunidade. Não é o aparente sucesso que deixa alguém bem, mas é conseguir definir sobre o que realmente prezamos e também cultivar nossos valores. O filósofo Epicuro (300 a.C.) dizia: Quem diz que ainda não está na hora de se dedicar à vida, ou que esta já passou, está afirmando que não chegou ou já passou a hora de ser feliz. Realmente, a pior perda que pode existir é a perda de tempo em se viver a vida.

sexta-feira, 8 de maio de 2015

Pergunta de Leitora - Mudanças e Inseguranças


Algo muito triste me aconteceu. Tenho 26 anos e terminei a faculdade há dois anos. Tinha uma amiga que era super próxima de mim e eu dela e com o fim da faculdade prometemos sempre manter contato e a amizade. Moramos quase 700 km de distância uma da outra e fica difícil manter contato frequente. Só que eu percebi que ela está mudada. Quando nos encontramos pela ultima vez há duas semanas parece que eu não a reconheci. Parecia ser uma estranha para mim e até mesmo a conversa que entre nós fluía naturalmente ficou meio que travada. As idéias dela também me ficaram estranhas. Será que isso é natural, esse distanciamento? Fico assustada com essas mudanças e não sei mais quem ela é. Me sinto perdida e sem chão. Parece bobo fazer uma tempestade num copo d’água, mas ela era um ponto de referencia para mim e agora ela se tornou uma estranha.


            As pessoas estão em constante processo de mudança, ninguém fica igual. Mudanças não são necessariamente ruins, mas o que acontece é que mudar traz incertezas, pois o desconhecido sempre causa insegurança. Há uma tendência em nós para ignorar as mudanças como forma de se resguardar do sentimento de insegurança e de uma nova adaptação. Mudança exige adaptação, ou seja, trabalho mental.
            O que te assustou e te deixou sem chão não foi a sua amiga em si, mas o sentimento de insegurança que foi despertado em você. Provavelmente quando você foi encontrá-la você tinha criado toda uma expectativa desse encontro, expectativas baseadas naquilo que você já conhecia e sabia dela. Entretanto, quando se deparou com a realidade de que o tempo passa e as mudanças ocorrem suas expectativas foram frustradas e te deixaram insegura, pois o conhecido não existia mais e exigia uma nova adaptação.
            Porém, podemos pensar que não tenha sido só sua amiga que mudou. Você também deve ter mudado, mas não percebeu.  Ao fim de uma faculdade e ao começo de uma vida nova muitas coisas mudam mesmo e é irreal pensar que nada mudará. A questão, então, passa a ser você aprender a aceitar as mudanças, tanto as suas quanto as dos outros. Quando acolher a ideia de que mudar pode ser natural não ficará tão insegura perante o desconhecido.
            Conforme o tempo passa e as mudanças ocorrem muitas amizades que antes tinham todo um significado vão se apagando, outras se tornam ainda mais fortes. Isso acontece e se trata de um processo natural que está além do nosso controle. Alguns relacionamentos são para sempre, outros têm significado apenas no passado. Não sei o que acontecerá com vocês duas, mas seja o que for viva de coração aberto e acolha as experiências de vida para aprender e crescer. Desejar que tudo seja imutável só traz infelicidade porque não está na dimensão do possível e só podemos estar felizes quando lidamos com o possível.

segunda-feira, 4 de maio de 2015

Aplicativos para Viver


            Que a tecnologia veio para ficar e facilitar nossa vida é algo bastante favorável. Muitas coisas boas a tecnologia trouxe deixando-nos mais confortáveis e nos poupando tempo para que melhor aproveitássemos nosso dia. É impensável um mundo sem tecnologia e sem todo o progresso na melhora da qualidade de vida que temos hoje comparada com o passado. O desenvolvimento da tecnologia demonstra um lado humano construtivo e promissor. Entretanto, evidencia também o quanto nos falta uma maior capacidade de interiorização e nos percebermos.
            Essa falta de contato conosco mesmo e com nossas reais necessidades pode ser vista no alto número de aplicativos para baixarmos que nos ensinam, ou ao menos tem a pretensão de nos ensinar, como devemos viver. Há aplicativos que nos lembram de beber água, como se não tivéssemos um controle orgânico interno para isso. Outros nos mostram o que devemos e quando devemos comer, como se dentro de nós não pudéssemos mais confiar na fome que sentimos. Há aplicativos que dizem quando devemos dormir e acordar para se ter um bom sono e há até aplicativos que nos lembram quando devemos namorar com nossos pares e quanto tempo devemos gastar nisso!
            Fica bastante evidente que não temos muito contato conosco. Não confiamos em nós para saber do que realmente precisamos e quando precisamos. Isso nos mostra que há que se desenvolver uma relação mais produtiva com nossas mentes e corpos. Em outras palavras, necessitamos conhecer melhor a nós mesmos. Para o ser humano sempre faltou progredir nessa “tecnologia interna” de auto percepção.
            Temos enormes dificuldades em estabelecer um processo de interiorização já que este implica num trabalho que é pensar sobre si mesmo. Os aplicativos mencionados acima fazem sucesso justamente porque nos evitam o trabalho de ter que pensar e desenvolver recursos internos que nos possibilitem como aproveitar a vida de maneira eficiente. Apesar disso continuamos insatisfeitos porque não são aplicativos externos que realmente nos faltam, mas recursos internos frutos de um crescimento. E ninguém, nem mesmo a tecnologia, pode substituir esse trabalho individual que é criar a si próprio.