sexta-feira, 29 de maio de 2020

Análise de filme - O Poço (2019)


     O filme O Poço (Netflix, 2019) tem várias possibilidades de interpretações. Pode ser religiosa, onde ressalta sobre os sete pecados capitais, pode ser sociológica onde se fala das relações sociais; pode ser filosófica onde fala do caráter humano e seus conceitos. Não tem só uma interpretação válida. 
     Basicamente, o filme conta sobre uma prisão organizada verticalmente onde, todos os dias, desce uma plataforma cheia de alimentos cuidadosamente preparados. Quem está nos andares de cima recebe primeiro essa plataforma e pode se alimentar como quiser e na quantidade que desejar. A plataforma vai descendo e conforme vai alcançando os andares inferiores não sobra comida para os prisioneiros. 
     A cada mês troca-se os prisioneiros de andar. Então quem estava acima pode ir parar num andar inferior e vice-versa. Aqueles que passam fome chegam às raias da barbaridade como canibalismo e violência, enquanto aqueles que ficam nos andares de cima mostram desprezo e arrogância para com aqueles que vão se alimentar embaixo.
     O que me chama mais atenção é que é um filme cru, ou seja, a princípio ele desperta emoções muito fortes de nojo. Assisti-lo apenas vendo o que o filme mostra, sem pensar sobre ele, vai resultar numa reação de nojo e ficar com todas as cenas na cabeça por muito tempo trazendo incômodo e angústia. Esse filme, tal qual a comida, precisa ser digerido. Ele não é para ser entendido literalmente, como se estivesse contando os fatos em si, mas para ser entendido simbolicamente. Daí a necessidade de uma mente para pensar sobre o filme. Quanto mais profunda for a mente de uma pessoa mais ela conseguirá acessar as camadas do filme. 
     Para mim o filme fala do crescimento. A gente sair da dimensão da prisão do prazer sensorial. As pessoas, ao longo do filme, se guiavam apenas pelo prazer. Queriam se satisfazer a todo custo mesmo que isso não fosse inteligente e fosse até destrutivo. Quem vive assim fica sem escutar qualquer coisa na vida e sem pensar. Vive-se como se não houvesse amanhã.
     Algumas pessoas, um pouco mais evoluídas, tentam convencer os outros a fazer diferente, mas sempre vai ser inútil, sempre ineficaz, porque se a outra pessoa está presa no prazer, sem condições de larga-lo, não vai escutar e se recusará a entender e principalmente a mudar. 
     Outros enlouquecem praticando toda uma série de violências até o ponto que alguns chegam de comer os outros. Outros tentam escapar, mas tomam a direção errada. Querem escapar para as camadas superficiais, o que só leva a erros, porque quando alguém quer realmente escapar de um modo de vida precisa ir para dentro e não para fora. O filme não é para ser entendido literalmente, mas simbolicamente. Ali, os andares são a representação da mente e não uma prisão concreta. 
     A gente só alimenta as camadas superficiais de nossas mentes, prazer, status, dinheiro, sexo, comparação com os outros... uma pessoa assim não cresce e parece que todos querem isso, querem subir nas camadas superiores, ficar em cima, ficar no topo, naquilo que o mundo considera o sucesso. Tudo isso leva a muitos equívocos, como valorizar coisas erradas e achar que tem que subir a qualquer custo, com toda a violência possível.
     Todos querem subir, mas ninguém quer descer às profundezas de sua própria mente para se libertar desse tipo de vida. A menina do filme não existe realmente, mas é uma metáfora para nossa inocência, para aquilo que temos de melhor. Ela é o nosso pudim (que surge no filme como algo especial)... precisamos defender o pudim, aquilo que há de mais puro e íntegro dentro de nós, de tudo aquilo que pode devora-lo.. Só quando o personagem principal defendeu o pudim, quando ele deu o melhor para dentro de si mesmo, para sua pureza, ele se salvou. Pôde sair, pôde se libertar. Parou de procurar ser algo e passou a ser ele mesmo. 
     Alguns entendem que o homem morreu no final, eu entendo que ele realmente nasceu, se tornou um verdadeiro ser humano. Ele foi para dentro de si, enfrentou o medo de se conhecer cada vez mais fundo e passou a levar alimento para suas camadas inferiores, ao invés de ficar apenas alimentando as camadas superficiais. Isso é crescer, é mudar de verdade.
     Eu entendo esse filme como algo de crescimento.. precisamos alimentar mais nosso interior, nossas camadas mais fundas... se preservando, tomando cuidado para sermos nós mesmos e não enlouquecer.... Bem similar com os tempos de pandemia que estamos vivendo.

segunda-feira, 25 de maio de 2020

Então, vá lavar suas tigelas!

     Em certa ocasião, um aprendiz perguntou ao seu mestre: “Mestre, por favor, o que é o despertar?” O mestre respondeu “ Você já terminou de comer?” “Sim, já terminei.” “Então, vá lavar as suas tigelas!”. Ser uma pessoa “desperta”, consciente, desenvolvida, é poder responder com coerência ao momento presente. Nada mais do que isso. Parece simples, mas como já dizia a estilista francesa Coco Chanel “Nada dá mais trabalho que o simples.” Pois é, as coisas mais simples de serem alcançadas, geralmente, dão mais trabalho e exigem muito mais.
     Há pessoas que imaginam que alguém mais desenvolvido, mais desperto, será uma pessoa absorta em pensamentos grandiosos, que estará sempre filosofando e se ocupando de grandes questões metafisicas. Ocorre que quem se ocupa disso tudo não está tão desperto assim. São pessoas que se “perdem” em vãs filosofias e não dão conta do "aqui e agora". A vida não é nem ontem nem amanhã, mas é aqui e agora, e ela nos dá de tudo: de questões de vida e morte a até lavar uma simples tigela.
      Vi, uma vez, uma entrevista com um velho para quem foi perguntado como ele vivia tão bem a vida. Ele respondeu que quando dormia, ele dormia; quando comia, ele comia; quando lia, ele lia. Veja que simplicidade de resposta e o quão difícil alcançar esse estado porque a gente, geralmente, faz certas atividades pensando em mil e uma outras coisas. Não ficamos presentes e, por isso mesmo, não vivemos no aqui e agora.
     Quem não vive no presente, na verdade, não vive, mas sonha que vive. Talvez fosse melhor dizer que alucina do que vive. O que mais há no mundo são pessoas que alucinam que estão vivendo. Elas estão trabalhando, mas pensando no que vão fazer depois do trabalho; depois do trabalho elas estão imaginando o que vão fazer no final de semana. No fim de semana elas vão fantasiar sobre o que vão fazer no resto da semana, e por aí vai. Não tem fim. E o tempo presente vai passando, muitas vezes, despercebido. 
     Não é à toa que muitas pessoas dizem: “Como o tempo passa rápido, nem percebi que já passou tanto tempo assim.” Ou “Como meus filhos cresceram rápido. Nem pude aproveitar direito a infância deles.” O que aconteceu é que o presente não foi vivido como poderia e quando se olha para trás se vê, então, o que passou e foi perdido.
     Quando uma pessoa vive através de suas alucinações ela está num estado em que não está nem dormindo nem acordada. Está numa terra de ninguém, perdida, sem eira nem beira. Uma pessoa desperta, pelo contrário, saberá onde está e o que precisa ser feito. Entenderá quais são as reais necessidades de sua vida que precisam ser atendidas e não perderá tempo com pensamentos vazios. 
     No momento que entendemos isso não perdemos mais tempo. Porque compreender isso nos faz dar valor para o tempo presente, para o que temos e podemos viver no aqui e agora. Enquanto estamos fazendo algo não há nada mais importante que aquilo. Depois, quando esse algo terminar, outra coisa será mais importante e, assim, podemos despertar minuto a minuto.

segunda-feira, 18 de maio de 2020

Gladiadores da era digital


       Continuam com força total nas redes sociais as brigas políticas. Trocam-se mensagens ofensivas das mais variadas formas e usa-se a pandemia da Covid-19 para apoiar ou condenar a visão de um grande número de políticos e governantes. Obviamente, com toda a consequência da pandemia em nossas vidas, tanto físicas quanto financeiras, as decisões políticas nos afetam e nos interessam. Devemos mesmo exercer nosso papel de cidadãos que participam e fiscalizam os ditames dos governos, porém, o que vejo acontecer é de outra ordem e não uma verdadeira discussão política. A gente ainda não sabe discutir política, mas sabe se envolver, apaixonadamente, em trocas de ofensas. 
Quando alguém elege seu político como detentor da verdade suprema e irretocável, fica muito fácil considerar que quem não comunga da mesma cartilha seja tratado como um pária que precisa ser anulado. As questões não ficam na dimensão da política e da racionalidade, mas tomam outro rumo. Elas se tornam pessoais e emocionais. Quando alguém fala diferente é tratado como ofensa que necessita de um ato de vingança. Daí ocorrerem tantos desaforos trocados nas redes sociais.
Não só com a política, mas com a religião também acontece isso. Quando alguém troca ofensas com outros por questões de política, religião, esportes, na verdade está usando esses assuntos para projetar suas ansiedades que não estão sendo elaboradas internamente. Vamos falar a verdade? A política é motivo para brigas? A religião é razão para tantos xingamentos? O esporte é motivo para tantos confrontos? A resposta é um redondo NÃO.
Tudo isso não justifica as brigas e ofensas que vemos sobrando por aí porque, na verdade, tanta violência está em outro lugar, está dentro de cada um de nós. As pessoas não sabem como lidar com seus medos e angústias e procuram, desesperadamente, certezas que viriam para aliviar as inseguranças e, por isso mesmo, elegem governantes, religiões, times esportivos ou qualquer outra coisa como algo que dê alguma certeza para suas vidas. O outro (político, religião, time) fica como um objeto mágico e é defendido com unhas e dentes. Qualquer ameaça sentida a esse objeto hiper valorizado é imediatamente atacada. As trocas de ofensas que vemos nas redes sociais vêm disso. Ninguém está falando do assunto que parece estar em pauta, mas está falando que não suporta inseguranças e que atacará quem tira as suas ilusões. Essas brigas estão numa dimensão do desespero e não da razão. 
Para poder haver uma discussão de fato sobre alguma coisa é necessário deixar de lado as paixões e a busca por certezas. É necessário que haja capacidade de discernimento. Quem não for capaz de discriminar entre o próprio desejo e a realidade fica cego e surdo e sem a menor condição de agir com coerência. 
      Quando assisto às lutas dos gladiadores das redes sociais me lembro dos gladiadores da Antiga Roma. Naquele tempo os gladiadores se envolviam em lutas mortais porque suas vidas dependiam daquilo. Era matar ou ser morto, não havia outra alternativa. Só que agora essas pessoas que transformam a internet num Coliseu moderno acham que estão lutando por suas vidas e certezas da mesma forma, mas estão apenas mostrando o quanto estão equivocadas e - por que não dizer - enlouquecidas.

segunda-feira, 11 de maio de 2020

Para beijar as estrelas


       A árvore, em variadas mitologias ao redor do mundo, tem um significado muito especial. Ela representa, de forma geral, o crescimento espiritual do ser humano que parte da terra, desenvolve o tronco e explode numa copa cheia de vida à procura de luz. Diferentes povos antigos relacionavam a imagem da árvore com o homem implicando na tarefa deste de se desenvolver e tornar-se iluminado.
    O pintor holandês Van Gogh frequentemente pintava árvores enormes, que ultrapassavam as estrelas, causando uma ruptura com a pintura clássica que cobrava que as árvores deviam ficar num plano abaixo dos astros para se obter uma proporção harmônica segundo os ditames artísticos da época. Uma vez, um comerciante de arte indignado com o excêntrico pintor holandês, perguntou-lhe, com raiva e exasperação, por que ele quebrava o padrão clássico. Van Gogh respondeu: “As árvores são os anseios da Terra de transcender as estrelas. Eu pinto os anseios e não as árvores. Na verdade, não importa se elas alcançam as estrelas ou não.  O importante é o desejo de fazê-lo.” Muito perspicaz e sensível para alguém considerado louco.
        Aqui está minha logomarca, que tanto desejei e que foi desenhada por um primo artista, Augusto Sampaio, que me conhece desde criança. Através do que falei que queria, ele criou uma árvore que vai agora ser uma marca pessoal para acompanhar meus textos e pensamentos publicados em diferentes mídias. Pedi raízes fortes e profundas, um tronco que lembrasse o ser humano e uma copa abundante e vibrante. Junto a todos os significados que a árvore possui já acima descritos, acrescento os meus próprios pensamentos que escrevo a seguir.
       Tal como acontece num processo analítico para uma pessoa realmente se desenvolver ela precisa se voltar para si própria, para o seu interior. Deve lançar profundas raízes em seu mundo interno, sempre escuro e desconhecido. Nunca sabemos o que vamos encontrar dentro de nós nem as adversidades que teremos que enfrentar. É algo que dá medo e traz inúmeras inseguranças. Muitos são os que evitam lançar-se nas profundezas de si próprios e ficam com suas “raízes” numa dimensão superficial, nunca indo fundo. Triste, porque então nunca irão ter copas exuberantes.
      Há pessoas que quando olham uma linda e farta copa de uma árvore muitas vezes desconhecem que por debaixo da terra, invisível aos nossos olhos tem toda uma estrutura que sustenta e nutre a mesma copa. As raízes não são tão belas quanto as copas, mas sem elas não existiriam copas. Quando vemos uma pessoa desenvolvida e bem estruturada, geralmente não vemos o quanto ele precisou trabalhar internamente, o quanto teve que pagar o preço por crescer, o quanto teve que superar medos e incertezas para buscar dentro de si algo que permitisse e favorecesse o crescimento lá fora, externamente.
       Desejamos beijar as estrelas, mas só podemos realizar isso se tivermos um pé, bem fincado, em nós mesmos, na nossa realidade/mente. Aí sim, criamos condições de subir e tornar-se o que realmente podemos ser. Se vamos alcançar as estrelas? Não importa, como já disse um dos maiores artistas do mundo, o que importa é a gente buscar realizar os nossos anseios.

sexta-feira, 8 de maio de 2020

Pergunta de leitora - Esta luta não é sua


Estou passando por uma situação difícil que envolve duas pessoas muito amadas: minha mãe e meu filho. Ele está numa idade que só quer brincar, três anos. E ele só gosta de quem brinca com ele. Minha mãe é doida por ele, se derrete, mas não brinca. Ela não sabe. Eu mesma não tenho nenhuma memória dela brincando comigo. Não é o perfil. Para ajudar, minha sogra parece um moleque de tanto que brinca e ele, claro, prefere a outra avó. Só que ele falta de educação com ela, não quer nem que ela o leve no banheiro. Isso antes da quarentena. Agora que a gente só se vê por internet, ele não quer conversar com ela, não responde. Eu fico triste e às vezes o obrigo a conversar e mandar mensagem. Mas como obrigar a criança a amar alguém? Ele tem que ser educado, mas parece, também, que nessa idade ainda não entende que responder, falar oi, tchau, é sinônimo de educação. Enfim, não sei como agir.

            São vários pontos a se pensar nessa sua situação. Primeiro, por que você parte do pressuposto que seu filho não ama sua mãe? Parece-me mais que isso é algo que você definiu. Você espera que seu filho funcione como você quer e não como ele quer e pode. Não há encontro entre a espontaneidade de seu filho e o que você acredita que deva ser um comportamento “educado” e esperado. Daí a dificuldade da situação que você se encontra.

            Segundo, qual o problema de ele “se dar melhor” com a outra avó? Quem disse que o relacionamento do neto com todos os avós devem ser iguais? Será que isso não é se pautar por moralismos? Acabamos exigindo das crianças que elas se portem de determinada maneira e corremos risco de podar a espontaneidade e a possibilidade de expressão delas. Ouso dizer que é você que está querendo que ele goste da sua mãe de uma maneira que é baseado no seu desejo. Se for esse o caso a questão não é mais sobre ele e ela, mas sobre você.

            Quando digo que é sobre você me refiro ao fato que parece que você quer resolver alguma coisa. Talvez sua mãe fique triste ou chateada e você ao ver que seu filho se comporta de uma forma que não a agrada quer intervir e solucionar. Esse neto e essa avó ainda não se “encontraram” e isso pode levar tempo. Eles precisam vir a se conhecer, mas se há fortes desejos que esse relacionamento seja assim ou assado pode estragar tudo, pois cria expectativas do que tem que ser e não do que se pode ser.

            É muita pressa definir se seu filho gosta ou não de sua mãe, ele está apenas iniciando a vida. Sua mãe, por outro lado, pode ter paciência e esperar que o relacionamento dos dois vingue. Já você, não precisa se sentir nem má mãe nem má filha. A sua função não é nem agradar sua mãe nem controlar seu filho. Claro, não permita que nem ele nem ela sejam desrespeitosos um com o outro, mas deixe que os dois aprendam a se entender.

segunda-feira, 4 de maio de 2020

Verdadeiramente oferecer a outra face


Conta-se que um guerreiro muito belicoso foi até um grande mestre reconhecido por sua sabedoria e fez de tudo para tirá-lo do sério, jogando nele vários insultos e impropérios. Porém, nada tirava o mestre de sua serenidade. Toda essa provocação durou horas e horas, até que o guerreiro (provocador) cansou-se e foi embora. Os discípulos em volta do mestre foram ter com ele e disseram. “Como aturou tantas ofensas daquele animal? Por que não reagiu? Por que não respondeu à altura?” O mestre, calmamente, explicou que quando alguém oferece um presente, mas você não o aceita, o presente retorna para aquele que ofereceu.

          Esta parábola oriental tão conhecida me faz lembrar da passagem bíblica em que Jesus diz que diante de uma agressão devemos oferecer a outra face. Em nenhum momento precisamos entender essa passagem como um convite à passividade ou até ao masoquismo. Quem entende por aí, na verdade, não entendeu nada. Oferecer a outra face não se trata de virar a cara para apanhar do outro lado, mas implica em algo muito diferente.
          Geralmente, diante de uma agressão que sofremos, ainda mais se for injustamente, ficamos machucados e furiosos. Queremos ir à desforra, nos vingar. Todavia, essa atitude de vingança nada mais é que responder da mesma forma: agressão com agressão. Nada muda, pelo contrário, fica-se na mesma. Violência respondida com violência é oferecer a “mesma face”, é ficar no igual, sem transformação alguma. Infelizmente, o que mais ocorre é isso. Retornamos a mesma face que nos foi oferecida.
         Já dizia Gandhi: Essa história de olho por olho deixará todo mundo cego. Na parábola oriental acima o mestre, muito sábio, não devolveu a mesma face. O provocador, cheio de ira dentro de si, queria jogar para dentro do mestre todo o ódio que sentia e com o qual ele não sabia como lidar de maneira eficiente. Queria se livrar de todo o veneno interno que carregava. A sua provocação era uma forma, estúpida, de projetar no outro o que ele não era capaz de tolerar. Ele era primitivo e nem contava com uma mente para elaborar o que era dele próprio.
          Já o mestre, por sua vez, contava com uma mente desenvolvida e era capaz de compreender que não precisava aceitar o convite que o provocador lhe fazia. Ele se manteve separado do guerreiro e de seus conteúdos mentais. E ao não pegar para si o que pertencia a outro, deu uma bela lição, tanto para o provocador quanto para seus discípulos. Ele mostrou o que era, verdadeiramente, dar a outra face.
          Será que oferecemos a outra face em nossas vidas? Ou será que oferecemos a mesma face? Ficamos presos num mecanismo ação-reação ou podemos ser humanos para pensar e escolher como vamos responder? O guerreiro da parábola podia saber a arte da luta, mas o mestre sabia a arte de pensar com a própria cabeça.