segunda-feira, 28 de dezembro de 2020

Planos para o ano novo



     Mais uma vez o ano chega ao fim. Essa passagem acaba sempre carregando um simbolismo muito grande. Entre o fim do ano que termina e o começo do que se inicia fazemos um balanço do que passou e dos planos a serem realizados. Contudo, neste balanço é muito frequente as pessoas ficarem infelizes. É bem comum elas olharem para o que perderam ou deixaram de ganhar e para os desejos frustrados. Miram também planos para o futuro com expectativas que muitas vezes não são realistas. O resultado disso é a infelicidade.
Muitos filósofos acreditam que um dos propósitos da vida é ser feliz, é buscar a felicidade. Para alguém ser feliz não precisa viver uma vida mágica e perfeita onde não haja eventos tristes, dolorosos e até injustos. A vida também tem coisas ruins. Quem disse que a vida precisa dar só alegrias? Quem disse que a vida é um mar de rosas? Pelo contrário, há muitas coisas feias na vida, mas ser feliz requer lidar com tudo o que surge da melhor maneira possível, sem se ressentir e sem ficar amargo.
         No início do ano é grande o número de pessoas que faz as resoluções para o ano novo. Essas resoluções têm como objetivo conquistar algo que acreditam que trará felicidade. Algumas pessoas até conseguem o que se propuseram a conquistar, mas mesmo assim, não ficam felizes. As que não conseguiram conquistar seus planos ficam também infelizes e atribuem isso ao que chamam de fracasso.
Todavia, as pessoas pouco entendem sobre felicidade e não percebem que uma das mais importantes condições para se ser feliz é não permitir que as coisas que não temos, que não deveríamos ter ou nem podemos ter nos tirem a possibilidade de bem usufruir do que temos e podemos ter. Dizendo de outra forma, ser feliz implica em valorizar e degustar o que temos e somos e não ficarmos nos lamentando sobre tudo aquilo que está fora do nosso alcance. 
Isso funciona tanto para os bens materiais (que são, muitas vezes, as únicas coisas valorizadas entre as pessoas) quanto para os valores emocionais, como o amor, por exemplo. O realmente fundamental na vida é não desperdiçar tempo imaginando que aquilo que não se tem ou não se é criaria felicidade enquanto tudo aquilo que se tem e se é acaba passando batido, sem nem olharmos de uma forma mais proveitosa. Só pode ser feliz quem sabe aproveitar bem o que se tem e se é, que tira proveito disso tudo e vai, cada vez mais, crescendo e se expandindo. Há tanta gente com tanta coisa boa mas incapaz de aproveitar um décimo de tudo o que é e tem. Isso é infelicidade.
      Talvez a melhor resolução que alguém possa fazer no ano novo seja estabelecer uma relação de felicidade para consigo mesmo e para com a vida. Uma relação em que, ao invés de só querer obter algo, possa também aproveitar o que já está presente. É assim que alcançamos a felicidade. Ela depende muito mais de nós mesmos e do que fazemos com a vida do que dos acontecimentos externos, que nos são incontroláveis.
Feliz Ano Novo!

segunda-feira, 21 de dezembro de 2020

Festa das luzes

Árvore suspensa no Lago Igapó, em Londrina.
Foto: Vivian Honorato

      O Natal chegou. Uma celebração que tem por tradição juntar as famílias e rever parentes que ao longo do ano não se encontraram. Porém, este Natal traz inúmeras dúvidas devido à covid-19. Como proteger aqueles que têm mais idade? Como juntar pessoas vindo de lugares diferentes de maneira que possa haver algum cuidado? Não há respostas fáceis a essas indagações e sobra muita ansiedade e preocupação. Foi um ano atípico em decorrência dos cuidados que tivemos que ter em relação à pandemia, e este problema continua a assombrar as festas de fim de ano. Esse Natal e as consequências dele dependerão muito da consciência das pessoas, de como elas se cuidam e de como cuidam dos outros.
      Para termos um mínimo de consciência é preciso se permitir ver o que realmente importa e saber lidar com as coisas de maneira realista. Em outras palavras, é preciso ter contato com a própria mente para podermos ser responsáveis conosco e com os demais. Quem consegue se ver verdadeiramente, acaba cuidando de si e por conseguinte expande também esse cuidado para os outros. A questão é: será que nos vemos de fato?
    Para ver é preciso luz e o Natal é justamente a festa das luzes. Antes mesmo desta celebração ser cristã já havia, antigamente, entre os pagãos, uma celebração parecida nessa data. Na Europa é época do inverno, onde a maior parte das vegetações hiberna, onde a comida ficava escassa, onde a vida ficava muito difícil. Estamos falando de um tempo onde as coisas não eram fáceis mesmo e no inverno, eram piores ainda. Havia fome e medo, sem contar que as noites eram mais longas que os dias, o que trazia pouca luz. Parecia que tudo ia de mal a pior.
     Os pinheiros são árvores resistentes, não perdiam as folhas no inverno e nem um pouco do verde que tinham. As pessoas, independentemente dos deuses que acreditavam ou não, reuniam-se ao redor dos pinheiros e faziam fogueiras. Assim, esquentavam e criavam um pouco de luz. Daí a origem das árvores de natal modernas, hoje tão brilhantes e iluminadas. Naquele tempo elas serviam para dar esperanças num momento difícil. Os medos, as preocupações, podiam ser tolerados com a criação da luz e do calor, mas não só da luz e do calor externos, mas também internos. Olhar a vida com esperança é fundamental para vivermos com saúde mental. Esperança é luz e calor.
     Que neste Natal possamos acender as luzes dentro de nós. Que possamos ver tudo aquilo que realmente nos importa, que nos expande, que nos faz sermos melhores. Quando olhamos para o nosso interior temos mais chances de desenvolver a possibilidade de viver melhor. Quem se vê, pode se conhecer e quem se conhece pode se cuidar. Quem se cuida é como alguém que acende uma fogueira numa noite escura e fria. Cabe a cada um, neste Natal, tomar decisões importantes de como vive, de como quer viver, de como se cuida, e de como quer e pode cuidar dos outros. 
    Que possamos criar “luzes” internas que iluminem os caminhos que pegamos. Que a festa das luzes não seja apenas um evento cheio de luz lá fora, nas árvores ou nos enfeites coloridos, mas que seja, antes de tudo, uma possiblidade de levar luz e calor para dentro de nós mesmos. Um feliz Natal!

segunda-feira, 14 de dezembro de 2020

A escolha é sua

     

     Diz uma antiga parábola que um grande empresário sempre desejou conhecer algum mestre que lhe ajudasse a transformar a vida para melhor. Só que, por ser um grande empresário, estava constantemente ocupado e não sentia que podia se dar ao luxo de parar por um tempo e ir em busca de um mestre. Para compensar isso, contratava e se rodeava de grandes filósofos e eruditos, mas por mais que conversassem ele ainda sentia que faltava algo. Então, quando fez 75 anos e se aposentou decidiu ir em busca de um mestre. De acordo com suas pesquisas decidiu-se por alguém renomado, que vivia num lugar bem simples e afastado. Ao chegar lá se deparou com o velho mestre, sentado calmamente na frente de sua casa. O ex-empresário, tomado por muita emoção, disse que queria perguntar algo ao mestre e este, sorrindo, lhe disse que perguntasse o que quisesse. O homem então pergunta “O que é a vida?” O mestre sorri diante de tal pergunta e responde “A vida é um aroma de jasmim na brisa da primavera”. Não contente com a resposta, o homem disse que não concordava e citou um dos maiores filósofos com quem havia conversado que afirmava que a vida era um espinho, algo por demais doloroso e que todos precisavam saber disso. O mestre então replicou “O seu filósofo pode viver a vida como quiser”.
      Esta parábola mostra o quanto escolhemos como queremos viver a vida. Na verdade, estamos criando nossos sofrimentos e estresses com muito mais frequência do que queremos admitir. Acreditamos, erroneamente, que todo sofrimento vem de fora, nos é imposto e que somos vítimas de tudo o que nos ocorre, mas isso está bem longe da verdade. Acreditar nisso, que o sofrimento nos é determinado, nos deixa numa posição de sujeito passivo, e mais, ficamos impotentes e ressentidos com a vida.
       Obviamente, há situações que a vida nos traz que são duras e causas de inúmeras dores e sofrimento, como a morte de alguém amado, acidentes, doenças, etc. Porém, se formos analisar bem as coisas com que mais sofremos e reclamamos no nosso dia a dia poderemos perceber que são causadas por nós mesmos, que elas poderiam ser evitadas ou pelo menos diminuídas. Há gente que a toda hora "arruma sarna para se coçar", como diz o ditado, e se sente vítima do mundo e de todos.
        Há relacionamentos doentios que causam estragos e adoecimentos em muitas pessoas, mas na maior parte das vezes essas pessoas “escolheram” esse relacionamento, ou seja, elas são coautoras da própria dor que vivem. Existem muitas pessoas que fazem más escolhas, que levam a consequências muito difíceis, mas se recusam a perceber que as coisas não aconteceram à toa, mas foram frutos de toda uma preferência de como viviam. Claro que essas escolhas foram, na maioria das vezes, inconscientes, mas mesmo assim foram escolhas, foram resultados do modo de funcionamento que uma pessoa adota na própria vida.
     Podemos viver o aroma de jasmim numa brisa de primavera ou podemos viver um espinho. A escolha é de cada um. Quem aprende a se conhecer e a travar um contato melhor e mais digno consigo mesmo, termina, geralmente, escolhendo melhor e com mais sabedoria. Quem desconhece a si mesmo e o que faz consigo geralmente acaba escolhendo mal e se sentindo a pior das criaturas do mundo. Quem você quer ser?

segunda-feira, 7 de dezembro de 2020

Evolução


    A evolução natural das espécies possibilitou o surgimento de inúmeras criaturas com habilidades cada vez mais “especializadas”. De criaturas cegas, por exemplo, passou a haver seres que eram capazes de enxergar e com isso ter informações importantes sobre o meio ambiente, melhorando sua sobrevivência. Os olhos, desenvolvidos em cada criatura, tem suas particularidades e permitem a cada ser ver o mundo de maneira diferente e que atenda às suas necessidades. A estrutura de um olho é algo complexo e extremamente prático para a vida.
   Tem também a questão da temperatura interna. A maioria dos animais que existe são pecilotérmicos, ou seja, não tem uma temperatura estável própria, mas depende da temperatura do meio ambiente. Já as aves e os mamíferos (somos mamíferos) são homeotérmicos, sendo então capazes de manter uma temperatura que não se modifica tanto com o ambiente externo. Essa característica da evolução permitiu que as aves e mamíferos pudessem se espalhar por todo o globo terrestre ficando mais “protegidos” do clima do ambiente.
    Estou falando tudo isso para dizer que a evolução deu habilidades que nos permitem viver melhor, com mais eficiência. Porém, esses traços se dão acima de tudo na biologia, no organismo. São atributos do nosso funcionamento biológico. Observando isso podemos aprender coisas importantes que podemos levar para entender como nossa mente funciona e, com isso, melhorar muito nossa qualidade de vida.
   Podemos também “evoluir” em nossas mentes. Para isso temos que prestar atenção em como a usamos. Como “olhamos” as coisas? Com que olhos enxergamos o mundo? É muito comum utilizarmos “olhos” que não permitem ver realmente as coisas que importam ou ver a realidade. Quando não “vemos” as coisas fica muito mais fácil nos enganarmos. Nos atrapalhamos e perdemos muitas coisas boas. A biologia, através da evolução, nos deu uma visão para usar, mas precisamos desenvolver também uma “visão interna”, que permita vivermos melhor. Não é mais biologia, mas mente, dimensão subjetiva, que precisamos fazer evoluir.
   Assim como manter a temperatura corporal constante nos permite ser mais independente do clima externo, podemos também manter dentro de nosso psiquismo uma “temperatura” agradável. Se encontramos o fervor do ódio lá fora, precisamos controlar nossa temperatura interna subjetiva para não fervermos junto e cairmos até na violência. Se o ambiente for gélido, de poucos afetos, devemos manter um calor interno que não nos deixe congelar por dentro e esquecer da nossa humanidade.
   Está na hora de ajudarmos a evolução usando esse corpo cheio de complexos sistemas que nos foi dado para crescermos e ampliarmos a humanidade. Ser humano implica usar tanto os órgãos biológicos quanto os órgãos simbólicos, que precisamos ir desenvolvendo ao longo da vida, dentro de nossa mente. Sem essa evolução psíquica ficamos muito aquém do que podemos. A vida em si sempre nos traz limitações, mas é triste quando as limitações são produzidas por nós mesmos, nos impedindo de evoluir melhor.