sexta-feira, 28 de setembro de 2012

Pergunta de Leitor - Sempre podemos mais



Fico revoltado com as injustiças que vejo no Brasil e na minha cidade que é Londrina. È muito descaso do governo com os cidadãos. É só corrupção para tudo que é lado. Eu me sinto impotente em fazer algo para melhorar esse país e penso que não tem jeito mesmo. Nós todos somos vítimas de um sistema que não funciona e é perverso. Não sou político e por isso mesmo não posso fazer nada, mas bem que eu queria fazer algo. O que a psicanálise pode dizer sobre toda essa situação?

“Conta-se que um homem enviado pelo rei chega correndo na presença de um mestre zen que meditava e ordena que o mestre se apresente imediatamente ao palácio para ajudar o rei a resolver alguns problemas. O mestre nem se mexe.
O homem lhe diz: - O senhor tem a obrigação de ajudar o rei e dar a ele toda a sua assistência!
O mestre responde: - Acabando de meditar vou ajudar aquele homem no fim da rua. Assim ajudo o reino. Para salvar o mundo não preciso ser do governo.”

            Com essa simples parábola podemos ver que, na verdade, nunca somos tão impotentes e vítimas quanto imaginamos e se assim somos é porque assim permitimos. Há muitas coisas que você, eu e todos nós podemos fazer para melhorar a situação do país.
            Para começar é preciso saber votar. Conhecer bem seu candidato é vital para se fazer uma eleição justa e digna. E mesmo que o governante não se mostre respeitável precisamos cobrar respeitabilidade. É um trabalho de todos e que se vê na ética do dia a dia. Se somos injustos para com nossos vizinhos como poderemos cobrar por justiça e respeitabilidade? Se você vive bem e dentro dos princípios éticos já está num bom começo para seguir adiante.
            É necessário que você e todos nós descubramos maneiras de melhorar nossas vidas e nunca nos acomodarmos com a injustiça e descaso. É fácil ficar numa posição passiva e de impotência, mas encontrar outra que seja mais ativa exige bem mais trabalho de cada um. É assim que se começa qualquer coisa, mudando nossa própria posição interna. Ao agir sempre para a promoção do bem e da justiça, seja a sua e a do outro, você já estará contribuindo para o bem maior e abandona a posição de vítima e impotente. Sempre podemos mais do que pensamos.

segunda-feira, 24 de setembro de 2012

Sonhos e Psicanálise



            Os sonhos são importantes para a psicanálise. Aliás, com a publicação do livro A Interpretação dos sonhos de Freud é que se tem inicio a história da psicanálise. Freud deu tanta importância para essa obra que até mudou a data da edição. O livro foi lançado em 1899, porém na contracapa ficou a data de 1900, para a psicanálise começar junto com o século novo que se iniciava.
            Até antes de Freud os sonhos tinham duas abordagens para o seu entendimento. Ou eram considerados insignificantes, sem valor e apenas como resíduos inúteis da mente, ou eram tratados como místicos, trazendo mensagens do mundo espiritual ou divinas. Enfim, os sonhos não eram tratados com importância e nem matéria digna de ser investigada.
            Freud foi inovador ao postular uma interpretação diferente dos sonhos, contrariando o que a ciência da sua época afirmava. Passou a ver os sonhos como passiveis de entendimento e não como ininteligíveis ou como carregando significados místicos. Ao atender pacientes, Freud percebeu que muito deles, relatando seus pensamentos, também relatavam seus sonhos e viu que havia aí uma possibilidade de entender melhor a mente e seu funcionamento. Só que os sonhos vêm, na grande maior parte das vezes, confusos e estranhos e era preciso desenvolver uma maneira de interpretá-los. Um sonho não deve ser entendido literalmente, mas sim como uma metáfora, algo que necessita de associações para se chegar ao significado latente.
            Para se chegar ao significado de um sonho é necessária a ativa participação de quem o sonhou. Sem isso é impossível uma interpretação. É que não existe uma coisa tal como um catálogo dos sonhos. Para cada pessoa uma determinada coisa tem sentidos diferentes.  Se uma pessoa sonha com um objeto isso não quer dizer nem que seja bom ou mau, é preciso investigar qual o sentido desse objeto para essa pessoa específica. Falando de forma simples, a interpretação dos sonhos nada mais é do que um trabalho de investigação e que pode revelar muito do inconsciente da pessoa. Freud afirmou que o sonho é a estrada real que conduz ao inconsciente. Após Freud muitos outros psicanalistas e pensadores contribuíram muito para o entendimento dos sonhos, enriquecendo a interpretação dessa manifestação psicológica que tanto encanta e assombra.

sexta-feira, 21 de setembro de 2012

Pergunta de Leitora - Decifrar-se



Eu sonho muito de noite e queria saber mais sobre a interpretação dos sonhos. Sonho frequentemente com um gato preto em cima do meu telhado e que quero pegar esse gato a todo custo. O que será que significa? Segundo algumas pessoas sonhar com gato preto nunca é algo bom. Comprei esses dias um manual dos sonhos e fala que gato preto pode significar coisas ruins. Como se interpreta sonhos corretamente. A psicanálise trabalha com sonhos, não é mesmo?

            A vida onírica, ou seja, os sonhos, têm uma grande importância para a psicanálise. Freud foi o primeiro pensador que tratou os sonhos cientificamente sem ligar para a crença popular de que se tratava de algo místico ou para a crença científica da época que via os sonhos como produtos psíquicos sem sentido algum. Para ele os sonhos são comunicações da mente inconsciente.
            Sobre o que o seu sonho significa não faço idéia, pois a interpretação dos sonhos não se dá magicamente, mas se trata de um trabalho que exige do analista e do paciente. O conteúdo dos sonhos de uma pessoa tem significado único e exclusivo para aquela pessoa, precisando então que você faça suas associações com o sonho que teve. Nessas associações o significado do que o sonho representa para você pode ser captado e entendido. Numa análise o paciente tem participação ativa no processo de interpretação dos sonhos, já que se trata de uma comunicação da mente do próprio paciente.
            Não existe manual dos sonhos. Isso é pura bobagem já que não se trata de colar um significado qualquer a uma imagem, mas de se procurar o significado daquela imagem para aquela pessoa que sonhou. O gato preto do seu sonho não tem um significado em si, porém tem o significado inconsciente que sua mente deu a ele e esse significado não vai ser encontrado num manual, mas através da sua fala, porque só assim o significado pode ser revelado.
            Talvez, ao me escrever esse email, você esteja mostrando interesse em entender mais sobre sua vida psíquica. Caso entre em um processo analítico vai poder contar com a ajuda de um analista para te ajudar a entender sua mente e com isso entender a si mesma. Interesse por seus sonhos, que são seus produtos mentais, você já tem. Quem sabe o que não lhe falte é investigá-los com mais propriedade?

segunda-feira, 17 de setembro de 2012

Medo de Errar



            Um dos maiores medos citados pelas pessoas é o medo de errar. Acham que se errarem, seja qual for o erro, vai ser o fim para elas e nada de bom vai sobrar e que nada poderá ser reparado. Isso pode ser uma fantasia, ou seja, uma ilusão e quando a fantasia se torna mais forte do que a realidade isso pode ser um problema.
            É normal e até esperado que as pessoas errem uma hora ou outra. Isso faz parte do crescimento de qualquer um. Negar isso é negar a condição humana, que se humaniza através dos erros. A gente, quase sempre, só aprende com os erros. Se não errássemos não teríamos o que aprender e por isso mesmo não haveria desenvolvimento.
            No entanto, nas fantasias de muitas pessoas, o erro ganha uma aura terrível. Passa a ser símbolo do fracasso, como se quem tem sucesso jamais tivesse errado. Pelo contrário, aqueles de maior sucesso, certamente, tiveram toda uma variedade de erros dos quais se beneficiaram ao aprender com eles. Só que tendemos a olhar apenas o sucesso dessas pessoas e acreditamos que este veio fácil, sem trabalho e sem nunca ter havido erros.
            É preciso se desfazer da fantasia de que errar é feio e trágico. Quando se erra e se aprende com isso o erro não foi à toa, mas serviu como instrumento de enriquecimento da pessoa. Caso se erre e não se pense nele aí a pessoa está a desperdiçar tempo e oportunidade. Erros fazem parte da vida e muito deles nem são assim tão terríveis como nossa imaginação quer. É preciso ter bom senso e pés na realidade.

sexta-feira, 14 de setembro de 2012

Pergunta de Leitora - Delicadeza Pode Ser Forte



Meu filho tem 9 anos e é um menino encantador. É meu único filho e tenho grande amor por ele. Meu marido e eu estamos brigando muito ultimamente por causa do jeito dele e eu sempre perco porque meu marido é mais forte nos argumentos. Meu marido acha que nosso filho é muito “delicado” e que isso pode trazer problemas para ele no futuro. Ele quer que ele seja mais agressivo e se comporte mais como um menino. Não que ele faça coisas de menina, mas ele comparado com outros meninos de sua idade é bem mais sossegado. Ele não gosta de esportes agressivos e nem é dado a valentão. Meu marido queria que ele fosse assim e fica zangado com ele toda a hora, dizendo para parar de ser maricas. Meu marido também diz que ele é assim, mais “delicado” por que é filho único e eu o mimo demais, mas eu não acho isso. Lógico que eu cuido dele e tenho amor, mas eu não mimo não. Pelo menos é o que eu acho. Meu marido quer colocar ele para fazer alguma luta mas meu filho disse para mim que quer estudar violino. Se meu marido sabe disso aí ele vai ficar muito bravo. Não sei o que faço.

            Por que colocar delicado entre aspas? Não há nada demais na palavra delicado para ser usada desta forma, como se indicasse uma vergonha. Entretanto, creio que você quis se referir a efeminado ao usar a palavra delicado, porém é importante saber que há uma diferença entre ser delicado e ser efeminado.
            Nem todos os meninos são iguais. Cada um tem suas características próprias. Tem-se a idéia equivocada de que os meninos devem ser agressivos e gostar de coisas agressivas, mas isso é puro estereótipo e não ajuda em nada. Um menino não adotar as atitudes mais agressivas presentes em outros meninos é perfeitamente natural, mas isso muitas vezes não é aceito e é visto como se fosse indicativo de que o menino pode se tornar homossexual. Preconceito só gera ignorância e estupidez.
            Provavelmente seu filho tem um lado artístico mais aflorado e se encanta com coisas que seu marido não entende e julga inconveniente. A sensibilidade do seu filho incomoda seu marido que quer que ele seja quem ele não pode ser. Ao insistir que seu filho tenha atitudes que ele não pode ter, seu marido o agride e pode contribuir para uma baixa autoestima no desenvolvimento dele.
            Chama a atenção que você dá ao seu marido uma posição de autoridade. Ele decide o que é aceitável e cabe a todos vocês acatarem. Por que será que precisa ser assim? Por que você não tem uma voz mais ativa em sua casa e nos assuntos da sua família? Talvez por ser delicada demais você se submeta a tudo com muita facilidade. Você confunde delicadeza com fraqueza. Existe uma força na delicadeza que você desconhece e ao descobri-la e fazer uso dela vai poder mostrar ao seu marido que a delicadeza não significa fragilidade. Para ajudar seu filho você precisa primeiro compreender isso.

sexta-feira, 7 de setembro de 2012

Pergunta de Leitora - Indagações



Tenho 26 anos e até hoje tive 04 namorados, mas tem uma coisa que as vezes me incomoda. De forma geral sou muito sensata e equilibrada, mas as vezes acho que devo ser fria demais. Nunca senti aquele frio na barriga ao conhecer alguém, nunca passei o dia todo com uma pessoa na cabeça, nunca agi de forma melosa e apaixonada, aliás, tenho a impressão de que nunca fui emocional assim, enfim nunca senti o tipo de amor tão comum em todos os lugares. Sim, me dou muito bem no meu relacionamento atual e ficaremos noivos,  nos entendemos muito bem em todas as áreas, ele me faz rir, cuida de mim, temos uma química boa e tudo isso é recíproco. Mesmo assim ainda fico em dúvida sobre o assunto, será que eu amo e não percebo? Será que eu criei uma imagem idealista de amor, não percebendo o que sinto por estar preocupada demais em sentir o que aparentemente todos sentem? Ou será que de alguma forma sou muito racional e pouco emotiva? Pra completar isso não gira apenas sobre meu relacionamento, ainda moro com os meus pais e tenho a mesma sensação. Tenho um ótimo relacionamento com minha mãe, mas não consigo sentir a ausência dela como qualquer outra pessoa sentiria, um exemplo disso é que nesse último final de ano ela ficou quase 02 meses fora, e sendo bem honesta não senti saudades, em casa era como se tudo tivesse normal. Lembro que uma vez até desabafei com uma amiga a respeito e acabei chorando, porque realmente me sinto culpada, é como se eu não tivesse sentimentos. Sei que não devo ser tão insensível, então porque será que sou tão diferente das outras pessoas? Será que é egoísmo?

Obs: Não sei se faz diferença ou não, mas passei por um trauma de infância envolvendo meu pai, para ser franca até hoje isso me faz mal, e na verdade nunca contei a ninguém. Mesmo assim levo uma vida normal e me sinto tranquila nos meus relacionamentos.

            As pessoas são diferentes uma das outras. Nem todas reagem e sentem da mesma maneira. Por que será então que você se preocupa em se encaixar num modelo? Será que você procura por segurança ao querer se ver “igual” às outras pessoas? Só podemos ser nós mesmos.
            Não há nada demais em não ser tão emotiva. Não são todos que sentem o frio na barriga que você mencionou e isso não é indicativo de frieza e nem de insensibilidade. Sua mãe ficou fora por dois meses, e daí? Só porque não chorou de saudades significa que a ame menos? Não existe um padrão de como as coisas e sentimentos têm que ser. Cada um tem sua história e suas características.
            No entanto, a questão a ser pensada é que tudo isso parece, que de alguma forma, te incomoda. O fato de não se sentir emotiva não tem problema algum, mas o fato de se incomodar com isso sim. O título do seu email para mim foi: Racional demais? E com esse título você mesma está se colocando em dúvida, está duvidando desse seu jeito. Em outras palavras, você está se perguntando se você é desse jeito ou se está desse jeito.
            Se está desse jeito, racional demais, será que é uma defesa? Será que você se defende de sentir algo? Ao final de seu email você dá a dica que isto pode sim ter alguma relação com esse trauma de infância envolvendo seu pai. Pode descobrir mais sobre isso e com mais certeza caso resolva se debruçar sobre sua história de vida e entender esse trauma que até hoje te faz mal. Tem muito a ganhar com um profissional que te ajude a se escutar e a trazer um significado para as suas indagações, pois senão ficará em suspense e sem se entender. Assim poderá ter a chance de fazer as pazes consigo. Não perca tempo e vá em busca de suas respostas.

segunda-feira, 3 de setembro de 2012

Não um, mas vários caminhos



            A resposta à leitora do dia 24 de agosto despertou vários tipos de reações entre os leitores deste blog. A consulente é casada e possui um amante, vive os dois relacionamentos, um de forma aberta e pública e outro de forma clandestina. Segundo as palavras da própria ela ama os dois e não consegue se ver tendo que fazer uma escolha entre eles, pois a perda de um deles seria para ela dolorido. Quando contou sua historia a consulente deixou claro sua posição e de que não se sente errada. Com base nesse discurso talvez o único caminho para ela fosse mesmo continuar vivendo esses dois relacionamentos, só que sem culpa, já que esta sim estraga a vida. Essa história, que aliás acontece com muitas pessoas, mas que jamais admitiriam, causou muita indignação entre vários leitores que não aceitam essa situação. Segundo a grande maioria ela deveria fazer uma escolha entre um dos dois e não ficar com os dois, ainda mais que um dos relacionamentos é clandestino.
            Acontece que não existe um único caminho possível e certo. Os caminhos são muitos e dependem de tantas variáveis que fica impossível dizer o que é certo ou errado em muitos casos. No filme brasileiro Eu, tu, eles (2000) dirigido por Andrucha Waddington e baseado em fatos reais conta-se a história de uma mulher nordestina que grávida e solteira apaixona-se por um homem e ele por ela. Depois de um tempo ela cai de amores por um segundo e vive os dois relacionamentos e mais depois ainda ela arranja um terceiro homem. O nordeste brasileiro é conhecido por ser uma região onde o machismo é muito presente e ela fica com três “maridos” e não um, subvertendo a lógica onde era o homem que podia ter várias mulheres. Era o caminho possível para ela e para os maridos. Apesar dos maridos estranharem esse tipo de arranjo, acabaram por aceitar, pois era o caminho possível.
            Uma grande diferença entre esta mulher do filme e a consulente é que uma fazia tudo de forma pública e aberta e a consulente de forma secreta e clandestina. Porém, ninguém pode culpá-la por fazer isso secretamente. Sendo a vida dela é ela quem decide a melhor maneira de viver. Apesar de fazer isso secretamente não sei se o marido de fato não sabe. Talvez até saiba, mas prefira fechar os olhos, talvez não saiba e não queira nem saber. Caso saiba e não aceite tem todo o direito de ir embora e não mais olhar na cara dela, mas qualquer que seja o caso depende deles e não do que seria um suposto caminho certo ou errado. Não existe uma cartilha universal do bom comportamento. Insistir nisso é perigoso, pois coloca como única via, as vezes, um caminho que a pessoa não pode trilhar.
            Não é fácil aceitar a diferença, principalmente quando o que é diferente nos parece tão errado. Ficamos chocados e tememos o diferente. O temor desperta facilmente o preconceito que coloca tudo em tom de preto e branco e esquece de outras nuances. O preconceito nega a diferença porque não admite a sua existência, não admite o que lhe é estranho, só que com isso limita a experiência humana. O caminho que serve para um, não necessariamente serve para outros.