segunda-feira, 30 de junho de 2014

Caminhada


            Há algum tempo empreendi uma caminhada, de vários quilômetros, pelas estradas rurais de Londrina com um grupo, cujo objetivo era uma reflexão acerca da vida e dos valores que damos a determinadas coisas. A caminhada, que se fazia através de estradas de terra e por trilhas no meio da mata, apresentava variados graus de dificuldades e foi uma boa metáfora para se pensar sobre como vivemos a vida e o que fazemos dela. Refletir sobre como empreendemos as coisas é uma das atitudes mais enriquecedoras para a mente (espírito) e permite que se for observado estarmos num caminho nada favorável, deve-se pegar outro sem demora.
            Para se empreender uma caminhada dessas é necessário abrir mão do conforto. Afinal, lama, poeira, sujeira, calor e a falta de banheiros torna tudo bem diferente do que estamos acostumados no nosso dia a dia. É fato que tendemos a recusar tudo aquilo que nos causa desprazer e se apegar ao prazer. Freud, em seu texto Sobre os dois princípios do funcionamento mental, mostra que há o princípio do prazer e o princípio da realidade. O primeiro é tudo aquilo que nos leva a querer coisas que nos gerem prazer e sem que nenhuma adversidade se apresente. Já o princípio da realidade aceita que há dificuldades e que não há como elas deixarem de existir. Elas podem apenas ser acolhidas e trabalhadas.
            A vida real, tal como uma caminhada, é cheia de adversidades e de nada adianta maldize-las. A única coisa a ser feita é enfrenta-las.  Muitas vezes teremos que simplesmente acolher que não estamos em um momento confortável em nossas vidas, mas que ao invés de usar tudo isso para se lamentar é muito mais proveitoso trabalhar com o que se tem a fim de que esse desconforto possa ser modificado. Quem não caminha na própria vida fica paralisado e se impede de ir em frente, crescendo e se desenvolvendo. Exatamente como na caminhada física e concreta não dá para a gente desistir e querer ficar pelo meio do caminho.
            Muitas vezes durante a caminhada física sentimos que não vai dar mais, que o melhor é desistir e se lamuriar por ter feito a besteira de se jogar numa empreitada que pode despertar o sentimento de fracasso, mas isso demonstra o quanto acreditamos muito pouco em nós mesmos. A verdade é que a gente se surpreende muito com nossas capacidades quando realmente nos propomos a fazer alguma coisa. E na vida mental também é assim. O desejo de desistirmos de um sonho, de um projeto e de uma esperança é sempre forte, porém o que a psicanálise ensina é que nem todo desejo é bom e ele deve antes ser pensado para que o preço depois não seja alto demais.
            Os sentimentos que uma caminhada física, cheia de desafios, nos desperta é algo que podemos e devemos usar para olharmos como estamos vivendo a nossa vida. Com essa reflexão há a possibilidade de aprendermos a valorizar o que vai nos fortalecer e melhorar e abandonar aquelas ideias que só nos imobilizam e que obviamente só tem como resultado nos deixar mais fracos. É difícil num domingo ter que acordar cedo, enfrentar tantos desconfortos, correndo o risco de se machucar e levar tempo para terminar e ver o resultado. Mas a vida não é assim também? Agora, quem ousa percorrer o caminho poderá também dizer das conquistas e dos prazeres encontrados durante o percurso. O sentimento de superação e realização só está disponível para aqueles que escolhem viver a caminhada da própria vida. Não há e nem tem porque fugir da vida, então o jeito é cada um pegar a sua trouxa e se lançar na estrada da vida acolhendo e trabalhando com tudo o que o caminho nos dá. Como já disse a psicanalista paulista Betty Milan para se saber do caminho é preciso caminhar.

sexta-feira, 27 de junho de 2014

Pergunta de Leitora - Comprometer-se com a Vida


Há quatro anos meu filho morreu num acidente de carro. Ele tinha apenas 19 anos e era o centro da minha vida. Desde que ele era bem pequeno eu já estava separada e eu só tinha a ele. Agora não sei mais o que fazer da minha vida. Tenho 49 anos, mas sinto como se fosse bem mais velha. Sofro de síndrome do pânico e faço uso de remédios psiquiátricos. Me mudei para uma chácara afastada de todos e lá passo meu tempo lendo livros de auto-ajuda. Mas nada faz passar ou diminui a minha dor. Mesmo tendo um bom lugar para viver, tendo condições boas de vida nada me faz me sentir viva. Não sei mais o que fazer.

            A perda de um filho é algo terrível para a vida de uma mãe. E infelizmente é uma dor que sempre permanecerá, sendo que é praticamente impossível esquecer um fato tão trágico e doloroso. Mesmo assim, a sua vida continua e é preciso vivê-la o melhor que você puder. Dessa dor da perda você não se livrará, mas poderá se livrar desse estado em que se encontra.
            É um pouco duro o que vou lhe falar, mas a sua vida não deve girar apenas ao redor da memória do seu filho. Provavelmente você vivia muito através do seu filho. Até mesmo nas suas palavras ele era o centro da sua vida e depois de uma separação tão brusca e triste você sente que parte da sua personalidade foi perdida. O luto, nesse caso, é duplamente devastador, pois foi perdido o seu filho e grande parte da sua identidade.
            Você elegeu seu filho numa posição de suma importância na sua vida. Já era separada e sente que “só tinha a ele” na sua vida. Eventualmente, seu filho iria se separar de você para constituir a própria família ou simplesmente viver a própria vida. Lógico que essa seria uma separação mais aceitável e branda, mas perdas, por mais dolorosas que sejam, fazem parte da vida. Hoje você se encontra num estado interno lastimável, pois parece-lhe que nada de bom sobrou; e faz necessário juntar as partes despedaçadas para se integrar como uma pessoa inteira.
            Os livros de auto-ajuda não te ajudaram a se reconstruir ou se ajudaram foi muito pouco. Você se isola, talvez na esperança de que o tempo venha a curar sozinho o seu sofrimento. Entretanto, é melhor não deixar a sua cura apenas nas mãos do tempo e do acaso. Ao psiquiatra você já vai e segue o tratamento, mas porque não aliar ao tratamento medicamentoso o tratamento da psicoterapia? Ao poder falar sobre o seu sofrimento poderá se reestruturar de uma maneira que lhe integre e não te deixe tão fragmentada. Para a dor da perda não há remédio, mas para a dor de inviabilizar a própria vida há e se encontra a medida que você se decide a se ajudar. É preciso que você aprenda a se comprometer com sua vida e não só com sua dor.

segunda-feira, 23 de junho de 2014

Doença


            O que é doença? Segundo os dicionários é o estado de se encontrar em desequilíbrio, de não se ter saúde e estar incapacitado de viver adequadamente. Na origem da palavra, do latim dolere, significa sofrimento. Doença então pode ser entendido como algo que nos faz sofrer e que tira muito da nossa capacidade de viver bem. No entanto, damos muita importância às doenças de ordem orgânicas e pouquíssima importância àquelas de ordem psicológicas. Qualquer que seja o tipo de doença sempre pagamos um preço alto demais.
            Quando o mal é orgânico ele é sentido no corpo e causa uma dor física. Esse tipo de mal é bem aceito. Agora quando o sofrimento tem origem na vida mental ele é não é bem visto e em muitos casos é até considerado “frescura” de quem o padece. Porém, a doença psicológica é tão traiçoeira e destrutiva quanto qualquer mal orgânico, pois ela mina o prazer pela vida.
            A doença de ordem mental é silenciosa. Vai se instalando aos poucos e nunca aparece de supetão, salvo em alguns casos, mas de forma geral surge vagarosamente e vai se apoderando da vida e a deixando embotada. Quando não vista e investigada pode tornar a vida intolerável. É um fato que quando estamos desequilibrados não aproveitamos mesmo a nossa potencialidade, daí não podermos viver bem. 
           Há remédios para muitos dos padecimentos de ordem psicológicas só que o melhor remédio ainda continua sendo a investigação do que significa determinado padecimento. Ao investigar a própria mente é possível dar um sentido ao mal de que se sofre e entender o por quê ele existe e cobra um preço alto. Falar pode ser um santo remédio. Ao falar trazemos o mal para fora onde possa ser mais bem pensado e onde ganha sentido novo que leva a uma compreensão. Encontrar sentido na própria vida é tarefa de cada um e da qual é impossível escapar. Quem tenta escapar de seu sentido adoece, se desequilibra e cai em infelicidade. Só nos resta aceitar nossa condição de sermos seres a procura de sentido e usarmos nossa mente para a nossa saúde. 

sexta-feira, 20 de junho de 2014

Pergunta de Leitor - Sair do Impasse


Estou casado há três anos e quero ter um filho, mas minha mulher não quer. Nunca havíamos conversado se iríamos ter um filho ou não, mas acho que já está na hora. Agora de tanto brigar ela não mais quer ter relações sexuais comigo. Ela diz que não quer um filho porque está indo bem no trabalho e não quer abandonar a carreira e que ela não se sente como mãe. Mas toda mulher tem instinto materno e ela apenas não está enxergando isso. Tenho certeza de que se ela engravidasse a opinião dela iria mudar, mas como engravidar se ela recusa o sexo? Ela está sendo egoísta comigo, porque não sou um mau marido e nem seria um mau pai. Só quero ter uma família.

            Afirmar que toda mulher tem um instinto materno e que quer ser mãe é um terrível engano. É uma visão limitada e limitadora da feminilidade. Há mulheres que querem ser mães, sonham com isso, porém há outras que não desejam isso e isto não as torna menos mulheres. A visão que você possui de sua esposa é errada e fonte de muitos enganos.
            Ela tem todo o direito de se recusar ser mãe se ela assim não deseja. Nenhuma mulher pode ser obrigada a ser mãe. A maternidade deve ser, acima de tudo, um desejo e não uma obrigação. Caso contrário quem paga o preço é o filho com a própria infelicidade por não ter sido desejado. Ao recusar a gravidez ela não está sendo egoísta, mas honesta consigo mesma.
            A questão é que você parece se sentir rejeitado com a rejeição dela por um filho. Será que você se sente rejeitado por ela não querer um filho com você? Será que é disso o que você está realmente reclamando? Pode ser que quando ela manifesta um desejo que seja o oposto do seu você se ressente e vê isso como egoísmo. Acontece que vocês dois não estão em concordância e talvez seja uma oportunidade para repensar esse relacionamento.
            Quando há discordância entre um casal e isso passa a ser origem de brigas o melhor a fazer é pensar o que está realmente ocorrendo no relacionamento. O problema pode estar além da questão do filho e ser encontrada na maneira como vocês vivem e o que esperam do relacionamento. Você tem todo o direito de ter um filho e constituir sua família. Isso não lhe pode ser negado. Entretanto, ela tem todo o direito de não querer ser mãe. Para resolver esse impasse é necessário saber o que realmente acontece com vocês e daí avaliarem o que precisa ser feito para que todos fiquem em paz.

segunda-feira, 16 de junho de 2014

O amor cuida, não aprisiona


            Assisti, num desses programas que mostram pessoas com seus bichos de estimação, algo curioso e que também ocorre entre pessoas e que é extremamente prejudicial. Nesse programa uma mulher, dona de um papagaio, o enchia de comidas engordativas e que nem era parte de sua dieta natural. Fazia isso porque, segundo ela, lhe tinha grande amor e não conseguia privá-lo das gostosuras. O resultado foi que o papagaio ficou doente e estava quase para morrer quando o veterinário alertou que se ela continuasse dando o que não podia iria certamente mata-lo. A mulher alegou que fazia o que fazia porque tinha para com o papagaio excesso de amor.
            A verdade não é bem assim. Não existe isso de excesso de amor. Até como diz o ditado: de boas intenções o inferno está cheio, o excesso de amor é bem isso. Algo, que em princípio parece bom, mas que na verdade é mau. A característica principal do amor é o cuidado do objeto amado. Entretanto, quando essa mulher enchia seu bichinho de guloseimas ela não estava de fato cuidando dele, porém o colocando em grave risco. Fazia mais mal do que bem. Como poderia então ser amor se amor não faz mal?
            O problema é que muita gente não entende o que seja amor. Acreditam que entendem, mas confundem amor com o sentimento de posse, por exemplo. Nestes casos o objeto de amor, seja pessoa ou animal, ganha outra importância que provavelmente tem mais a ver com o narcisismo do que com amor. O papagaio não era amado pela mulher, que por isso mesmo não pôde cuidar dele, mas era usado por ela como alguma outra representação. O animal era para servir às suas carências, medos e angústias. Quando usamos algo ou alguém nesse sentido a consequência é desastrosa.
            Excesso de amor é na verdade paixão e esta pode ser manifestação patológica. Enquanto o amor cria condições favoráveis e saudáveis para o outro, a paixão aprisiona. A paixão torna as pessoas ignorantes e incapazes de pensar, já o amor torna-as mais sábias porque faz compreender que nem tudo se pode e que limites se fazem importantes. A paixão, por sua vez, desconhece limites e quando determinados limites são negados o resultado é sempre correr perigos desnecessários. O amor sabe dizer não, pois “o não” pode também estar a serviço da vida. A paixão só conhece o sim sem limites e com isso cria as condições perfeitas para os excessos. A vida só pode existir no equilíbrio e nunca nos excessos.

sexta-feira, 13 de junho de 2014

Pergunta de Leitora - Auto-Aceitação


Tenho uma amiga que me deixa muito mal. Explico. Ela sempre consegue dar conta de tudo, do trabalho da casa, dos filhos e jamais parece ficar cansada. Acho que fico com inveja, pois tenho que me esforçar muito e fico bem cansada quando tenho tanto afazeres. Já para ela tudo parece ser fácil. Quando fiquei doente e perguntei para ela quando havia sido a ultima vez que tinha ficado doente ela me respondeu que não tinha tempo para ficar doente. Quando pergunto se ela fica triste ou para baixo algumas vezes ela me responde que não tem tempo para ficar mal. como ela consegue? Por que eu não consigo ser desse jeito? Queria tanto ser mais forte assim como ela. Me sinto fraca, pois eu me entristeço as vezes e também fico doente as vezes. Como desenvolver a mente para ser forte?

            É comum alguém se comparar a uma outra pessoa, apesar de isso nunca ser um bom negócio, já que cada um tem a sua história de vida, que é única, e as suas particularidades. Somos como somos e não podemos ser como o outro é. Ao invés de nos aborrecermos por não sermos de um determinado jeito temos muito mais a ganhar se aprendermos a aceitar nossa natureza e desenvolver o que há de bom.
            Quando você se compara com sua amiga você acaba se colocando em desvantagem porque ela pode lidar com as coisas de um jeito, aparentemente, melhor. Queria ser como ela quando só pode ser você mesma. Você dá valor à sua amiga e à maneira dela de viver e pouco considera a sua maneira de ser. Falta-lhe desenvolver mais amor por você mesma e também um olhar mais crítico e realista das coisas.
            Com um olhar mais crítico e realista poderia ver que nem tudo que reluz é ouro. Talvez essa sua amiga não seja tão forte assim como você imagina e crê. Pode ser que ela seja uma pessoa cheia de defesas. Ao usar intensamente certas defesas psíquicas ela tem menos contato com suas próprias fragilidades. Há pessoas que precisam viver sob defesas muito fortes senão desmoronariam frente às próprias dores. Não posso afirmar, contudo, que esse seja o caso dela, mas me parece que sim, pois segundo suas palavras ela nega com muita ênfase a possibilidade de adoecer e se entristecer, como se tivesse muito medo disso tudo e precisasse deixar isso tudo bem longe dela.
            Porém, seja ela uma pessoa com muitas defesas ou forte você só pode ser você mesma. A pergunta que você deve se fazer e buscar responder é por que não consegue ser mais gentil consigo própria. Pode buscar mudar a visão que tem de você mesma para uma melhor e mais favorável ao seu desenvolvimento. Você quer ser forte, mas a força só pode ser encontrada quando passamos ser nós mesmos, com nossos defeitos e com o desenvolvimento das nossas qualidades. Auto-aceitação é fundamental para se viver bem.

segunda-feira, 9 de junho de 2014

Um dia dos namorados diferente


            Se você procura um namorado ou uma namorada para te fazer feliz está no caminho errado. Um parceiro ou parceira podem complementar a felicidade, é claro, mas não deve ser a única condição para se estar bem. É importante que se saiba que a única pessoa que pode realmente nos fazer felizes somos nós mesmos!
            É claro que viver acompanhado é bem melhor, afinal ninguém é uma ilha e podemos nos enriquecer e aprender muito num relacionamento. O problema aparece quando se acredita que para ser feliz é preciso ter um namorado ou namorada. Mais importante do que ter alguém em um relacionamento é cada um gostar de si próprio e se fazer feliz. A felicidade só pode partir internamente e se trata de um trabalho interno e individual.
            Vejo e ouço muitas pessoas dizendo que só poderão ser felizes caso tenham alguém em suas vidas. Como se enganam! Se enganam porque colocam a própria felicidade no mundo externo, nas mãos de outro e se esquecem de olhar para dentro de si próprias. A felicidade deve existir hoje e agora, na sua atual situação. É claro que há situações mais complicadas e que trazem muitas angústias, mas há uma diferença entre felicidade e alegria. Poder distinguir entre as duas é extremamente produtivo para se ter uma perspectiva mais realista da vida.
            A alegria se trata de um momento e a felicidade de um estado. Podemos em um determinado momento, dependendo da situação, estar ou não alegres, mas a felicidade não se trata apenas de um momento passageiro, porém de um estado que perdura e que permite existir a esperança. Com o estado da felicidade acreditamos mais em nós e na nossa capacidade de mudar o que for preciso. Confiamos que podemos dar conta de nossa vida e que enfrentaremos os problemas, que são inevitáveis, de forma madura e harmônica e que não ficaremos presos e identificados com um momento que certamente vai passar.
            Se felicidade se trata de um estado então podemos ver a importância que há em criarmos esse estado interno. E nessa criação a nossa responsabilidade para conosco se faz primordial e é a condição para se estar feliz. Não é um outro externo que nos traz felicidade, mas é nós mesmo quando a construímos. Não dá mais para adiar a felicidade achando que somente quando uma suposta condição ocorrer poderemos ser felizes. Se faz necessário que cada um se empenhe na sua vida para criar sua própria felicidade. Para ser feliz deveria bastar a gente olhar para um espelho e gostar do que vê.

sexta-feira, 6 de junho de 2014

Pergunta de Leitor - Atrás das Grades


Só escrevo porque estou anônimo. Sou casado há 4 anos, gosto da minha mulher e ela parece gostar de mim. A questão é que mesmo gostando dela eu não sei se a amo. Me pego varias vezes por dia me imaginando solteiro e sem ela. Já imaginei até que ela morria e eu ficava livre, que Deus me perdoe. Não sei o que sinto na verdade. Tem outros momentos que eu gosto da companhia dela e de estar casado, mas estou meio que assustado com isso de imaginá-la morta. Não tenho ninguém na minha vida, nenhuma outra mulher. Só queria ficar só, a vida seria bem mais fácil e eu poderia fazer as coisas todas do meu jeito. Será que eu tenho problemas psicológicos?

            A freqüência com que você a imagina morta te assusta e te leva a pensar que pode ter algum problema psicológico. O que, talvez, lhe assuste seja se dar conta de um desejo pela morte de sua esposa como a sua salvação. O que origina e alimenta essas imaginações é esse desejo, mas não se preocupe, isso não faz de você um criminoso.
            No entanto, ao se deparar com tal desejo você precisa se perguntar sobre o que está se passando. Lendo seu email fica a impressão de que você fica preso à sua mulher e a vê como um carrasco que te sentencia a uma existência na qual você não tem liberdade alguma. O que você precisa analisar é se realmente é assim, ou seja, se ela tolhe a sua liberdade ou se é simplesmente como você se sente nesse relacionamento.
            Qualquer que seja a resposta para essa indagação vai ser preciso adotar uma posição diferente da que você apresenta agora. No momento você fica identificado com a posição da vítima impotente, que nada pode fazer a não ser esperar por uma solução externa à você e que te livre dos seus suplícios. Ao ficar imaginando a morte dela você não cuida de você e fica envolvido mais com produtos mentais estéreis (essas imaginações) do que em enfrentar a realidade.
            Outra questão que também seria bom procurar responder é se você sabe viver em um relacionamento. Você escreveu que estando só, as coisas seriam mais fáceis. Com certeza é assim. É muito mais fácil e até mais cômodo ficar só do que se encontrar em um relacionamento, já que se relacionar implica em muitas adaptações, ceder em vários pontos e aprender o que é um vir a se relacionar. Será que você entende isso? Enfim, há muitas questões que precisam de reflexões e que é melhor gastar tempo com elas do que se entregar passivamente a imaginações que não irão resolver nada.

segunda-feira, 2 de junho de 2014

Amar é...


            É impossível fazer alguém nos amar e nem mesmo podemos nos obrigar a amar alguém, já que o amor não tem como nascer da obrigação e do controle. O amor implica em consideração, carinho, desejar o bem, querer estar junto e todas essas coisas não têm como ser controladas. O amor consiste, acima de tudo, de delicadeza. Sem esta o amor não tem como sobreviver e morreria sufocado. Portanto não há receita certa para o amor, apenas podemos compreender que ao ser delicado a possibilidade de atrairmos o amor é maior.
            Amar é uma das coisas mais importantes da vida e que dão a ela um sentido. Entretanto, o amor não vem de graça, mas depende de uma série de atitudes que temos para conosco e para com a vida. Exatamente por isso o amor é tão delicado e precioso. Para começar amar está ligado à autoestima. Só quando uma pessoa se gosta e se respeita é que cria condições para o desenvolvimento do amor. Quem espera primeiro ser amado para depois se sentir com autoestima obriga o amor a dar o que não foi conseguido por si próprio. Ou seja, é um engano.
            Mostrar um interesse amoroso a uma determinada pessoa é um processo que requer respeito ao outro. Assim o outro terá tempo e espaço para digerir o que está acontecendo e também para quem mostra o sentimento ir levando em consideração se é isso mesmo que quer. Muitas vezes achamos que tal ou qual pessoa é nosso príncipe ou princesa encantados, mas nos iludimos e nos apaixonamos pelo que imaginamos e não pelo que de fato existe. Nada pior do que viver iludido e investir tanto em algo que não tem consistência.
           Amar também não implica insistir com alguém que não mostra o menor interesse por nós. Aliás, a insistência é uma rudeza e pode fazer com que surja um sentimento de desagrado e repulsa. Devemos encarar e aceitar a realidade de que se alguém não se sente atraído por nós o melhor a fazer é abandonar a ideia para que nos preservemos. Talvez não seja mesmo aquela pessoa, mas ao mantermos nossa autoestima salva nos colocamos disponíveis para que algo verdadeiro possa nascer e se desenvolver. O amor, além da delicadeza, também requer tempo e paciência.