segunda-feira, 29 de setembro de 2014

A Morte e a Mudança de Pensamento


            A morte é comumente entendida como algo negativo. O fim da vida como nós a conhecemos é fonte de inúmeras angústias e há pessoas que não a encaram bem, preferindo negar a sua existência. No entanto, tomar conhecimento da própria mortalidade é algo que permite dar maior valor a vida. A vida tem data de validade, ou seja, um dia se acaba e de nada adianta negar esse fato. Brigar com a realidade nunca é um bom negócio. Saber que a vida é finita favorece a compreensão que o tempo que temos é contado e com esse conhecimento podemos tomar uma decisão importante. A decisão de viver bem.
            O livro A morte de Ivan Iltichi, considerado obra prima da literatura Russa, de Tostói, conta a estória de Ivan que leva uma vida empobrecida por ser tão amesquinhado na forma que vive. Todas as suas atitudes estão  voltadas para a condição de seu status e para a manutenção de uma vida falsa. Porém, quando ele se descobre adoecido e que irá morrer logo começa a pensar sobre a vida e o sentido que deu a ela. Ao tomar consciência de sua mortalidade passa a encarar a vida com outros olhos. É claro que o tempo perdido por ele jamais poderá ser recuperado, mas é melhor acordar uma hora e saber da importância de sua vida do que ficar alienado para sempre.
            Já a estória de Dickens Um conto de natal relata a vida do sovina Sr. Scrooge que odeia o natal e qualquer festa ou manifestação de alegria. Ele crê que celebrações são maneiras de tirar seu dinheiro duramente conquistado e também acredita que demonstrações afetivas são irrelevantes. Com isso se torna solitário e distante de qualquer relacionamento. Mas durante uma noite tem a visita de três espíritos que mostram o seu passado, o seu presente e o seu futuro e é esse ultimo que causa uma mudança em seu jeito de pensar a vida. O espírito do futuro mostra a sua morte e as pessoas em volta brigando pelos seus bens e ninguém ligando para seu corpo apodrecendo. Quando acorda desse sonho, Scrooge muda completamente passando a dar mais valor a sua vida e aos próximos. Mais uma vez foi a tomada de consciência da morte que o levou a mudar de perspectiva.
            Essas duas estórias têm como ponto central que ao enxergar a própria mortalidade os personagens passaram por uma modificação para melhor. Olharam para as suas vidas de forma mais grata e amorosa. Deixaram de lado um comportamento de ódio à vida e passaram a valorizá-la. Quem entende que vai morrer poderá entender que precisa viver. Aprenderá a aproveitar o tempo e as oportunidades e jamais deixará de ser grato pela vida que tem emprestada por algum tempo.

quinta-feira, 25 de setembro de 2014

Pergunta de Leitora - Herança Familiar


Estou com uma dúvida há algum tempo e talvez vc possa me esclarecer. Conheço uma pessoa que perdeu a mãe vítima de Alzheimer e o irmão cometeu suicídio. Essa pessoa é psicologicamente instável – critica tudo, se abala muito fácil emocionalmente, chora muito fácil, tem dificuldade em manter uma linha de raciocínio. Gosto muito dessa pessoa, mas usando um termo não correto, digamos, que ela é psicologicamente perturbada. Depois que descobri que a mãe teve Alzheimer e o irmão se suicidou, fiquei pensando se não poderia ser algo genético. Detalhe: o pai, que é de outra nacionalidade, foi prisioneiro durante a segunda guerra. Ela também não deve ter tido uma base familiar das melhores. Enfim, pode ser algo relacionado à genética?

            Querer encontrar na genética as explicações mais variadas para como nossa mente funciona é o sonho de muita gente. Chega a ser o eldorado místico de muitos e famosos cientistas ao redor do globo. Querem achar o gene para a depressão, para a esquizofrenia, para o autismo e para muitas outras coisas que nos acomete. Com essa atitude podemos ver que há uma intensa valorização do orgânico sobre a maneira que nós nos construímos.
            Isso ocorre porque se tudo pudesse ser explicado através da genética então nos sentiríamos redimidos e nem precisaríamos pensar sobre o que fazemos conosco. Ficaríamos, enfim, livres de quaisquer responsabilidades pelas nossas escolhas e trilhas que pegamos. Desejar ardentemente que tudo seja genética, algo orgânico que foge ao controle e que nos define, pode nos colocar no papel de vítima e nos fazer deitar e rolar no masoquismo. Afinal, diriam alguns, o que poderíamos fazer se os genes assim nos definiram?
Acontece que não é tão simples assim e temos para conosco uma responsabilidade muito grande. É claro que a genética existe e tem participação em muitas coisas das nossas vidas. Só que ela não é tudo e principalmente no que concerne ao modo como lidamos com nossas vidas, que está ligado à nossa mente, ela tem pouca relevância. Se nessa família que você cita há tantos desajustes por que pensar que isso se deve aos genes? Se essa sua amiga é, nas suas palavras, perturbada, isso tem mais a ver com a herança mental do que com a herança genética. Com uma mãe destroçada por uma doença incapacitante, um irmão que no desespero, seja lá qual foi,  cometeu o pior auto ataque que poderia e com um pai perseguido pelos fantasmas passados é lógico pensar que a herança de como lidar com a vida e suas frustrações foi a pior e mais pobre possível. Seus modelos de infância foram empobrecidos e muito destrutivos e por isso podemos acreditar que ela não teve no que se agarrar para ser diferente. Mas isso está longe de ser uma questão genética.
Se uma pessoa vive numa família que funciona de maneira muito empobrecida e destrutiva a chance de que essa pessoa vá repetir essas atitudes é alta. Os modelos nos são importantes e uma família com modelos no qual não se conta com uma mente que seja desenvolvida não vai ajudar ninguém a criar uma mente. Quando decidimos que a vida que levamos não nos está mais ajudando e está até mesmo nos prejudicando podemos procurar outros modelos, outras formas de vir a ser, que nos levam a um desenvolvimento. Obviamente que falar é fácil, mas quem vive essa situação sofre muito e muitas vezes por medo de sofrer ainda mais nunca procura ajuda ou nem mesmo toma consciência que está vivendo de uma maneira indigna consigo mesma. É difícil admitirmos que temos uma grande responsabilidade conosco. Seria mais fácil por a culpa toda na genética, mas isso seria desperdiçar nossa mente, que é sempre nosso maior tesouro e a porta de saída para os nossos dilemas. 

segunda-feira, 22 de setembro de 2014

Observação de Grupos - Parte II


            Continuando o texto da segunda passada sobre a ideia do psicanalista Bion sobre grupos há mais dois a serem vistos: o de ataque-fuga e de pareamento. O grupo que funciona no suposto-básico de ataque-fuga ocorre quando os membros do grupo elegem um inimigo externo ou então tornado externo. Esse inimigo pode ser uma pessoa, uma ideia, outro grupo ou organização. O inimigo passa a ser então alvo de ataques ou de fuga por parte dos membros e o pressuposto básico mental que propicia esse tipo de funcionamento é o da paranóia.
            Esse tipo de grupo, o de ataque-fuga, favorece o partidarismo e até mesmo o terrorismo. Um inimigo é eleito e recebe toda a projeção dos temores dos membros do grupo e se torna algo a ser combatido. Não há a menor tolerância para as diferenças e tudo o que ameaça seus ideais é encarado com muito temor e ódio. O nazismo pode ser um exemplo desse tipo de grupo. Os judeus e outros povos personificaram tudo o que temiam e por isso mesmo foram atacados. Como pode se ver, esse tipo de grupo incita a violência e pode ser altamente destrutivo.
            Por fim, o grupo de pareamento funciona através da fragmentação do grupo. Ele é dividido em vários sub-grupos não produtivos e que por isso mesmo não levam a lugar nenhum. Se torna, portanto, um grupo estéril. Cada sub-grupo fica cuidando de seus interesses e nenhum problema que o grupo inteiro precisa enfrentar é de fato trabalhado. O grupo, como um todo, perde a força e seus objetivos de vista. Torna-se um grupo burocrático, dividido em variados setores e cada qual dificultando a vida de seus membros. Uma sociedade assim fica imobilizada e impotente.
            Um grupo só pode funcionar quando deixa-se de lado os funcionamentos dos supostos-básicos e passa-se a operar como grupo de trabalho. Nesse tipo de grupo há a valorização da vida e da mudança desta para melhor. A criatividade se faz presente e é fator principal para a existência de grupos que funcionam de verdade com objetivos definidos e claros. Quando pontos cegos dos membros de um dado grupo podem ser superados há a possibilidade de um funcionamento mais prático e eficiente e com isso chegar a resultados bem mais benéficos.

sexta-feira, 19 de setembro de 2014

Pergunta de Leitor - Abaixo da Superfície


Gosto muito de pensar sobre questões de caráter filosófico. Enfim,
abaixo uma delas que gostaria de compartilhar e pedir a opinião
profissional, porque muitas pessoas pensam  nessa opinião como um
tanto quanto depressiva.
Prefiro acreditar em um fim. Aceito a morte de uma forma natural e até mesmo confortadora. Pois todo o sofrimento, dores, angústias, um dia terão um fim.
Pensar em vida eterna seria angustiante para mim. Não me defino como cético, porque acredito na história de Jesus Cristo, mas ao mesmo tempo não consigo aceitar muitas coisas que a bíblia e a igreja impõe. Isso é um pouco contraditório no meu ponto de vista...e confesso que me atrapalha as vezes.
Ao mesmo tempo, acredito também que a falta de sentido na vida é o que me faz ver sentido nela. Todos os mistérios que a rodeiam são o que a tornam interessante, nem tudo precisa ter resposta. Para mim, aceitar e acreditar em um fim, me faz viver mais plenamente.
Eu sei que essa é uma questão muito profunda, e tentei resumir da melhor maneira possível esse pensamento.

            Por que será que você pediu uma opinião profissional sobre o seu pensamento? Porque provavelmente intui que abaixo da linha da superfície existe muitas outras coisas. Você disse que muitas pessoas acham seu pensamento um tanto quanto depressivo. Não sei dizer se esse é o caso, porém o que mais me chama atenção é que você percebe em si algo que, pelo menos ainda, não consegue saber o que seja, algo que está à procura de um sentido. Hoje, você está procurando um sentido para a sua vida, mas não referente às questões filosóficas da vida, mas às questões da vida interna.
            Nas suas palavras a contradição te atrapalha, mas qual contradição? Acredita em Jesus, mas não consegue aceitar algumas coisas que a bíblia e a igreja colocam. Diz que a falta de sentido é que te faz sentido. Creio que na verdade não seja nem da bíblia, de Jesus, da igreja que você está falando, mas de como sente a sua vida mental. Você está tentando lidar com sua mente procurando algo que venha a trazer sentido nela, porque no momento ela se encontra caótica e te leva a certo grau de sofrimento. Não são dos sofrimentos da vida eterna que você fala, mas dessa vida quando se tenta pensar sobre ela.
            Você sabe que essa questão é muito profunda, como você mesmo disse, porque de alguma maneira já notou que se trata daquilo que você sente e de como vive a sua vida mental. Parece que há tantos pensamentos aí dentro de você, à espera de serem vividos, parece que há toda uma vida para ser experimentada. Não é a toa que você encara a morte até mesmo como confortadora, pois não é da morte em si que se refere, mas do fim de tantos pensamentos que se encontram aí internamente e que vêm causando desconforto. São muitos pensamentos para pouca digestão.
            Essas questões não serão resolvidas através da filosofia e nem de criar um pensamento que você possa aceitar aplicar, mas à medida que puder viver a própria experiência emocional, à medida que você puder ir abandonando as teorias e se colocar disponível para viver as experiências de vida. Quando puder aceitar que a vida interna que possui precisa ser vivenciada para produzir conhecimentos e aceitar que ela trará, quer queira ou não, dores e sofrimentos, poderá enfim entender melhor que está procurando por realizar a sua própria verdade. Em outras palavras, estará procurando você mesmo e não um pensamento.

segunda-feira, 15 de setembro de 2014

Observação de Grupos - Parte I


            Um dia desses fui à uma reunião de condomínio e foi uma excelente oportunidade para se observar um grupo funcionando. Numa reunião de condôminos imagina-se que seja um lugar e um momento para se pensar nas questões do edifício, a fim de melhorar suas condições. Porém, a realidade é outra. Nessas reuniões, muitas vezes, está mais em jogo as questões pessoais de cada um do que a objetividade de se pensar sobre o que se precisa.
            É incrível poder observar a dinâmica de um grupo funcionando. Bion, psicanalista inglês, falou da existência de dois tipos de funcionamento da dinâmica grupal: o grupo de trabalho e o de suposto-básico. O primeiro funciona com mais praticidade e objetivo. As pessoas não estão nesse grupo para atuarem, ou seja, agirem de forma irracional, mas com uma idéia bem definida de um trabalho que demanda ser feito. É um grupo que funciona bem e de forma organizada. Atinge seus objetivos e não traz nenhum mal estar. Já os grupos de suposto-básico têm uma dinâmica diferente. Apesar de aparentemente existir um objetivo ele fica perdido pelas questões inconscientes de cada membro do grupo e acabam se voltando mais para a desconstrução do que para a construção de algo bom coletivamente.
            Os grupos de suposto-básico são divididos em três: os de dependência, os de ataque-fuga e os de pareamento. O primeiro, como o próprio nome indica, funciona quando o grupo elege um líder carismático e fica em volta dele dependendo desse líder tal qual crianças. O líder, para esse grupo, ganha aura mágica e encarna poderes especiais projetados pelos membros do grupo e se torna alguém extremamente poderoso e inatacável. O resto dos membros se torna irresponsável por tomar quaisquer decisões e espera sempre pela decisão de seu líder.
            Muitos governos com líderes carismáticos funcionam dessa maneira. Isso é destrutivo pois convida as pessoas a adotarem uma posição infantil de dependência. Ninguém mais decide nada, mas entrega o poder como se não lhe dissesse respeito. O voto, nesse tipo de sociedade, perde completamente o real valor e só serve para dar tintas de uma sociedade democrática. As pessoas não exercem mais sua obrigação de serem ativas e ficam no aguardo de uma figura poderosa que tudo dará e fará por elas. Um grupo com tal funcionamento, seja um governo ou uma simples reunião de condôminos, não enfrenta as questões necessárias que se fazem pertinentes já que abdicaram de pensar verdadeiramente e perde-se facilmente numa alucinação coletiva empobrecedora.

A continuar 

sexta-feira, 12 de setembro de 2014

Pergunta de Leitora - Sempre se aprontar


Me considero uma pessoa experiente. Tenho já quase setenta anos e já passei por muitas coisas nessa vida. Só que não me sinto realizada e pronta na vida. Não sei o que me falta. A impressão é que sei tão mais que os jovens, mas ao mesmo tempo parece que me sinto solitária. A vida já me deu minha cota de experiências e já a sinto sem surpresa nenhuma. Acho que nada nessa vida é hoje capaz de me surpreender. Quando será que estarei com a sensação de estar pronta e plenamente realizada? O que mais me falta acontecer?

            Que triste que é dizer que nada mais nessa vida é capaz de lhe surpreender. Viver como se mais nada pudesse trazer algo novo e inesperado é desalentador. Em outras palavras, parece-me que você fala que a vida não te encanta e que você se sente incapaz de tirar algum proveito dela. Isso é grave e você deveria procurar refletir sobre esse estado de mente.
            Deveria se perguntar por que enxerga a vida com olhos tão desencantados. O que te levou a ocupar essa posição? Você considera conhecer tão mais que os jovens, mas como será que você usa esse conhecimento na sua vida? Provavelmente o usa de forma não eficaz já que o que você já sabe parece que lhe fez perder o gosto pela vida. E por que você acredita em ter que estar pronta? Que significado tem isso para você?
            Enfim, são muitas as perguntas que se faz necessário responder. Ao buscar essas respostas você poderá criar uma nova visão de mundo que lhe seja mais proveitosa e se livrar de um funcionamento que só te deixa na posição de insatisfação. Você acredita numa falsidade que é o estar pronta, ou seja, sem precisar mais nada da vida. Essa é a posição da morte e não de alguém que se encontra vivo. Você se identifica mais com a imobilidade do que com o movimento e com isso perde o gosto que a vida poderia lhe proporcionar. O que importa na vida é estar sempre se aprontando e jamais ficar pronto.
            Ao contrário do que você diz, você não é uma pessoa experiente. Aldous Huxley, escritor inglês, escreveu que “Experiência não é o que nos acontece, mas o que fazemos com o que nos acontece” mostrando que o fato de lhe ter acontecido muitas coisas, em si, nada significa. A experiência é conquistada com muito empenho e força de vontade, é um trabalho, e a ideia da frase de Huxley desmente que ser experiente seja apenas uma questão de idade cronológica. Que tal se transformar realmente em alguém experiente cuidando de si mesma? Abra mão de querer estar pronta e aceite se aprontar; e quem sabe a vida não venha a lhe surpreender?

segunda-feira, 8 de setembro de 2014

Eleição e Identificação


            Todos são portadores de uma mente e é através desta que podemos trazer significados para as experiências de vida e decidir nossos caminhos. A mente é desenvolvida ao longo da vida, nunca vem pronta e nunca fica concluída totalmente. Ela depende, acima de tudo, das nossas vivências e de como elas são digeridas. Podemos entender que a mente é algo de vital importância e que sem ela não haveria a possibilidade de vida. Assim como cada pessoa possui uma mente que lhe dá identidade e fornece recursos para viver, um país é também portador de uma “mente” que lhe dá as características de identidade de um determinado povo. Votar bem é uma maneira de formar bem essa “mente da nação”.
            Quando votamos escolhemos candidatos, ou em tese assim deveria ser, que encarnam aquelas qualidades que desejamos que sejam praticadas coletivamente. Quando votamos em alguém é por que nos identificamos com o que aquele dado candidato representa. Com isso vemos que votar é uma experiência de identificação. Afinal, ninguém vota em algo ou numa proposta pela qual não tenha nenhuma identificação. Agora, com o que nos identificamos? Responder essa pergunta é fundamental.
            Fundamental porque avaliar o que está dentro de nós, o que se passa conosco, ou em outras palavras, como está nossa mente é que permite entender que valores prezamos e que decisões tomamos. A “mente” de um determinado país pode ser entendida como uma média das mentes de seus cidadãos. Olhando as coisas por esse ângulo verificamos que o Brasil que anda com uma “mente” bem aquém da expectativa precisa de uma boa mudança que só poderá acontecer caso os indivíduos comecem a se responsabilizar por suas atitudes e pelas ações que tomam.
            Enquanto os valores apreciados pela grande maioria das pessoas forem o se dar bem, o ser esperto e para tudo dar um jeitinho, o fechar os olhos e ouvidos para a corrupção e descaso com o que é público, o status pelo o que se possui materialmente e o quanto de influência alguém tem, os políticos escolhidos vão ser justamente aqueles que tiverem essas mesmas características. Nossos políticos, de todos os partidos, pintam e bordam porque no fundo somos como eles e os autorizamos a ser assim. Quando não formos mais as coisas poderão de fato mudar.
            A “mente” brasileira está repleta de valores deturpados. A perversão, que é a negação de toda a lei, seja esta do sistema legal ou do respeito ao próximo, impera e toma lugar de outros valores que exigem bem mais trabalho para serem cultivados. Valores como o reconhecimento de que há um próximo, de que este também tem valor e direitos e de que não posso passar por cima de algumas regras porque assim estaria lesando alguém são valores que não nascem conosco, mas que são adquiridos e aprendidos quando praticados. Quem vive os valores e não só apenas discursam sobre eles tem a chance de escolher melhor em quem votar porque vai ter outro tipo de identificação.
            O problema do Brasil e de qualquer outro país não se trata da falta de dinheiro ou de oportunidades no mercado, porém de ignorância no uso dos recursos que já se possui. E aqui não me refiro apenas aos recursos financeiros, mas aos recursos mentais. A “mente” do Brasil é pobre e subdesenvolvida, só que poderia ser bem diferente. O Brasil é como um indivíduo que só sabe reclamar e se lamentar de suas condições. Se vitimiza e se coloca numa posição desvantajosa. Quando essa “mente” se levar a sério e usar e desenvolver recursos mais eficientes, as coisas certamente melhorarão. Porém, isso depende de como vamos votar que depende, por sua vez, de como lidamos com nossas mentes. 

sexta-feira, 5 de setembro de 2014

Pergunta de Leitora - Mundo Virtual


Sou uma mulher inteligente, mas ultimamente noto que algo está muito errado comigo. Tenho 26 anos, terminei minha faculdade e não consegui emprego. Então estou na casa dos meus pais que me sustentam. Acho que comecei a ficar depressiva e comecei a jogar pelo computador. Não parei mais e hoje é a única coisa que eu faço. Jogo de dia, de noite e prefiro jogar a sair. Já não tenho mais amigos e nem perspectiva de vida. Meus pais dizem que não tenho mais jeito. Só quero ficar jogando, mas sei que isso está errado. O que me acontece, meu deus? Não me entendo.

            Você é inteligente, estudou e se formou. No entanto, conseguir um trabalho foi difícil, pois conquistar um espaço no mundo do trabalho é bem mais complexo mesmo e com isso você, provavelmente, se frustrou e recuou. Voltou-se para um estado onde não precisa encarar a vida e a vida que vive é a virtual e não a real.
            Jogar compulsivamente é a única maneira que você, hoje, consegue lidar com a vida e suas frustrações. Afinal, nos jogos você sempre pode ganhar outra vida quando tudo dá errado e não precisa lidar com consequências reais. É muito mais cômodo jogar ao invés de viver, porém é muito mais limitante, já que jogar não lhe traz nenhuma experiência de vida verdadeira. Você mata o tempo jogando, mas se pensarmos que a vida é feita de tempo pode-se perceber que no fim você acaba matando a própria vida.
            Com os jogos você vive uma falsa vida. Transforma tudo aquilo que pode haver de bom e produtivo dentro de você em alucinação. Os jogos te proporcionam um ambiente para alucinar. O problema é que alucinação não enche barriga, ou seja, não nutre a vida. Com isso corre o risco de ficar desnutrida e que nesse caso é ficar desprovida de sentidos e significados.
            O que se faz necessário, então, é que você entenda por que mata o tempo e suas possibilidades em vez de usá-las para o seu crescimento. Quando você escreve que não se entende é bom, porque implica que você percebe em si coisas que vem te assustando e limitando. Consegue ver que algo dentro de você não anda eficiente e que precisa transformar isso para poder viver de fato. Não devemos jamais matar o tempo, mas saber usá-lo sempre para que nos proporcione o que de melhor pode haver na vida.

segunda-feira, 1 de setembro de 2014

Adoção



            Há uma forte crença cultural que diz que os laços sanguíneos são o fator mais importante na formação de uma família. Obviamente essa crença é fruto do preconceito que sempre gera enganos perniciosos. A palavra adoção tem origem no latim e significa escolher e cuidar. A adoção deve ser sempre um processo de escolha, pois somente escolhendo o ato de adotar vai fazer com que a criança se sinta acolhida verdadeiramente
            A filiação pode ser biológica ou afetiva. Muitos acreditam que os filhos devem ser do próprio sangue como se isso fosse garantia ou prova de alguma coisa. Na verdade não é porque o que forma uma família é a qualidade dos relacionamentos entre os seus membros e também o amor vivido. Porém, muitas vezes a criança que é adotada é vista como “diferente”, “um estranho no ninho”; e isso se dá porque há uma tendência em valorizar o filho biológico já que este se trata de alguém com a mesma origem e o que é considerado diferente é, geralmente, visto com algum temor.
            Acredita-se também que uma criança fruto da adoção possa vir dar problemas de variados tipos no futuro. Mais uma vez isso é conseqüência da visão preconceituosa que acredita que alguém de quem não se conhece o sangue possa ter dentro de si complicações. É claro que uma criança adotada pode desenvolver algumas doenças genéticas, por exemplo, mas um filho biológico não dá garantias de que isso não vai acontecer. Quanto ao caráter de uma criança adotada é bom que se saiba que não vem através dos genes, mas sim da qualidade dos relacionamentos que vão ser desenvolvidos.
            Muitos possíveis pais temem adotar porque têm medo de quando a criança ou jovem descobrir sua adoção venham a não mais desejar a companhia deles e que venham a abandoná-los. Esse medo pode ser um verdadeiro entrave na relação entre pais adotivos e filhos adotivos. Há também, os pais aprenderem a superar determinadas frustrações como não poderem gerir um filho. No entanto, quando os pais podem superar todas essas angústias com tranqüilidade e naturalidade o processo de acolher uma criança adotada vem como uma grande oportunidade de crescimento para todas as partes envolvidas. Formar uma família, independente de qual tipo de filiação, deve ser sempre resultado de uma escolha e jamais algo para se preencher a vida.