sexta-feira, 29 de junho de 2018

Pergunta de Leitora - Vida e Medos




Tenho muito medo de morrer. Tenho pesadelos com isso ou de ficar doente e de sofrer dores horríveis. Aliás, a velhice me assusta diariamente e fico extremamente abalada com esse fato. E ter dores então? Como posso me livrar de tudo isso? Como ser uma pessoa que sofre menos na vida?


            O seu sofrimento é psicológico. Ele tem mais a ver com suas criações e fantasias do que com a realidade. Por que alguém teria medo da morte? As pessoas falam da morte como se ela se tratasse do fracasso da vida. Mas a morte é parte da vida. É um fato e uma verdade muito simples e não há como negar isso até porque negar a morte é negar a vida. O seu medo não é da morte que é um processo natural, mas tem medo das suas fantasias em relação a morte.
            A velhice lhe causa preocupações? Já percebeu que quem mais se preocupa com a velhice são aqueles que não são velhos? Os velhos estão vivendo como podem, se virando e não pensam na velhice em si. É você quem pensa nela e faz dela algo muito assustador. Envelhecer também é parte da vida.
            A dor física também pertence à nossa realidade. Se agora você está sem dor aproveite, curta a vida assim, mas se estiver com dor é necessário buscar tratamento adequado. É a única coisa que podemos fazer a esse respeito e nada mais. É impossível conceber uma existência sem que haja dor uma hora ou outra.     
            De nada adianta ficar filosofando sobre morte, dores e envelhecimento. São fatos incontroláveis. Talvez o que te assusta é tudo aquilo que você não controla. A vida não pode ser controlada. Ela foi feita para ser vivida, experimentada. Tentar controlar a vida e/ou assegurar uma existência muito perfeita é uma perda de tempo pois foge da realidade. Quem sabe procurar ajuda profissional não possa te ajudar a pensar sobre as suas verdadeiras questões e não as questões da vida que apenas podemos aceitar? Ao temer a vida e se preocupar excessivamente sobre ela é uma maneira de não vive-la. 

segunda-feira, 25 de junho de 2018

A Vida e os Riscos




            Muitas pessoas indagam a razão dos esportes radicais ou situações que ofereçam algum tipo de risco ser tão atraentes. Até mesmo atividades de entretenimento como uma montanha russa geram doses de medo bem como de prazer. Há até empresas de RH, nos grandes centros urbanos, especializadas em levar seus funcionários a viver aventuras na natureza ou em coloca-los em situações que atingem picos de tensão. E quando todas essas pessoas depois voltam dessas situações limites contam grandes histórias, com o espírito renovado e algumas até cheias de coragem, sonhando com a próxima aventura. Por que será que esse prazer ocorre?
            Na nossa vida diária nos apegamos a ideia de que estamos sempre muito seguros e que temos controle sobre tudo ou quase tudo. Apesar de isso ser uma bela falsidade imaginamos que somos muito poderosos e nos afastamos da natureza recorrendo cada vez mais aos aplicativos, televisão, surfar na internet e por aí vai. É que no mundo das redes sociais temos muito poder e controle. Nos sentimos meio divinos. Afinal muitos dos nossos desejos estão a apenas a um clique de distância. Como não nos acharmos no Olimpo? Só que isso tem um efeito colateral que é fazer com que muitos se sintam amortecidos, meio afastados da vida e da própria humanidade.
            Já quando nos deparamos com a natureza o modo como vemos a vida muda completamente de perspectiva. A natureza é perigosa, oferece riscos reais e nos obriga a descer do Olimpo quase divino para a condição humana. Vivenciar situações de riscos é justamente se dar conta de nossa humanidade e mortalidade. É ter a consciência que temos muito pouco controle sobre a vida e isso nos ensina a aproveitar mais o que temos no tempo presente. Quando vivemos a nossa condição real de vulnerabilidade e impotência frente a várias adversidades passamos a dar valor a pequenas coisas que são importantíssimas na vida.
            Quando um grupo de pessoas são levados ao extremo num acampamento sem muito conforto e é exigido trabalho duro e muita cooperação elas voltam renovadas.  Ora, foi justamente se deparar com a falta de confortos e com a necessidade de se trabalhar de maneira diferente da que estão acostumadas que fizeram com que dessem um alto valor as coisas e confortos do dia a dia que nem prestavam atenção. Puderam mudar a perspectiva com que viam e se relacionavam com a vida diária. Isso faz com que permanecemos mais no tempo presente do aqui e agora e saboreamos o que temos no momento.
            Ao correr riscos nossa visão pode se transformar e trazer um gosto novo. Nos sentimos mais vivos e sedentos pela vida. Pena que muita gente não expande esse sentimento que vivem por algum tempo para mudar de fato como vivem a vida. Deixam que isso vá se apagando e retornam para a mesma visão de mundo anterior que só leva aos mesmos caminhos e experiências. Ficam tão acostumadas com a morte interna que se esquecem como viver de verdade. O que viveram vira apenas uma memória, quase um sonho e não mais uma realidade.

sexta-feira, 22 de junho de 2018

Pergunta de Leitor - De Diferentes Planetas




Não entendo as mulheres. Trabalho em uma grande empresa em que há muitas mulheres trabalhando. É claro que a paquera rola solta. Uma mulher casada quis sair comigo e deixou isso bem claro. Mas eu conheço o marido dela e para dizer a verdade eu nem queria sair com ela. Recusei as tentativas dela e ela ficou brava. Depois de um tempo fiquei sabendo que na empresa rola um boato de que eu sou gay e foi essa mulher que começou a dizer tais coisas. Só porque eu não quis sair com ela. Depois os homens fazem qualquer sacanagem com as mulheres e são chamados de brutos. Isso é decepcionante.

            Pois é, os dois sexos se machucam muito e com isso perpetuam um contínuo desencontro entre homens e mulheres. Os estereótipos de como cada gênero deve se comportar é prejudicial para a formação de relações verdadeiras e sinceras. Não é a toa que homens e mulheres, ás vezes, se sentem pertencer a planetas diferentes.
            Exigir que homem que é homem não nega fogo é uma violência. Quem disse que violência só havia contra as mulheres? As mulheres podem ser muito cruéis com os homens e também praticarem violência. É o machismo às avessas.
            Quando um homem não pode negar fogo ele na verdade não é livre porque se sente na obrigação de transar, mesmo que assim não deseje. Para o sexo precisa existir liberdade. Essa mulher não sabe disso e não aceita a recusa do outro e por isso que te ofendeu. Ela só reconhece o próprio desejo e nada mais.
            No machismo tradicional o homem submete as mulheres ao seu bel prazer, não as reconhece como pessoas, mas as tornam objetos. Isso tudo é uma grande violência. No entanto, as mulheres também podem se portar assim com os homens e quando estes não respondem como o esperado colocam em cheque a orientação sexual desse homem como forma de ofensa. Uma verdadeira revolução sexual ainda precisa acontecer para trazer mais compreensão e entendimento entre os sexos. Hoje ainda impera os estereótipos de ambos os lados.

segunda-feira, 18 de junho de 2018

Saco Sem Fundo




            A voracidade gera um estado de mente muito empobrecedor, bem como coloca quem o vive num beco sem saída. A voracidade leva à ganância e ao sentimento de que precisamos estar satisfeitos a todo momento e  a toda hora, sem espaço algum para frustração. A ambição desmedida mobiliza o sujeito a sempre ter mais e mais, sem que o que tenha seja usufruído devidamente. O indivíduo voraz quer sempre mais e não só no que se relaciona aos bens materiais, mas sempre exige mais e cruelmente do amor dos outros e de si mesmo ficando impossibilitado de aproveitar o que tem agora para viver. Quem funciona através da voracidade sempre estará insatisfeito por mais que tenha.
            É o que popularmente chamamos de saco sem fundo porque nunca enche, nunca chega a um estado de satisfação onde o que foi conquistado possa ser aproveitado prazerosamente. Pessoas vorazes desconhecem a dimensão do prazer, porém reconhecem e se lamentam sempre da insatisfação que vivem. A voracidade alimenta a inveja, o ciúme, o ódio ao mundo e à realidade. Está sempre de olho naquilo que não tem ou não é e pouco caso faz daquilo que tem e é.
            O estado de voracidade causa muito desentendimentos entre as pessoas, seja nos seus relacionamentos, nos seus trabalhos ou com a sociedade. A vida fica impossível. Quanto mais voraz é alguém, por mais posses até que tenha, mais pobre é essa pessoa e mais insatisfeita fica. A história budista a seguir é de grande valia para pensarmos sobre isso.
            Um rico mercador, que tinha uma bela família e amigos, estava de viagem até chegar a um lugar deserto onde encontrou uma caverna para passar a noite e descansar para seguir adiante no dia seguinte. Ao olhar mais detalhadamente a caverna encontrou sete grandes jarros fechados. Sua curiosidade o impeliu a abrir o primeiro jarro que continha muitas moedas de ouro, mas tinha também um bilhete que dizia que todos os jarros estavam cheios de tesouros e que ele poderia ser dono deles todos, mas que ao se apossar deles ele deveria saber que tinham também uma maldição. O mercador considerou, mas sua ganância o fez com que quisesse, mais do que tudo na vida, possuir toda aquela riqueza e decidiu levar todos os jarros consigo. Chegando em casa ele resolveu contar suas moedas de ouro e para sua surpresa percebeu que o sétimo jarro estava cheio só até metade. Ficou bravo e chegou à conclusão que deveria comprar mais ouro para deixar todos os vasos cheios por igual. Foi acumulando cada vez mais moedas para preencher esse jarro, mas por mais ouro que pusesse o jarro nunca ficava cheio, mas sempre pela metade. E assim ele gastou toda a vida enchendo o sétimo vaso que nunca enchia ao invés de aproveitar a riqueza que tinha.

sexta-feira, 15 de junho de 2018

Pergunta de Leitora - Carta na Manga




Sou uma nutricionista recém-formada. Amo muito a minha profissão, mas tem um problema. Ultimamente engordei muito devido a uma grande decepção amorosa e venho lutando com a balança, mas não está fácil. Emagrecer está muito difícil e tenho medo de que as pessoas que atendo não me vejam como uma boa profissional. Tenho receio de que me achem uma impostora, afinal quem vai querer se tratar com uma nutricionista que está acima do peso? Eu pensaria que uma profissional assim seria uma porcaria. E meu processo de emagrecimento leva tempo e o que posso fazer então? Não posso deixar de trabalhar até ficar magra como quero e aí sim volto a trabalhar. O que faço?


            Hoje você sofre porque está presa a um ideal de nutricionista. Para você uma profissional deve possuir determinado padrão e quem não se encaixa nesse padrão só pode ser uma impostora, alguém que não serve para nada. O problema de se prender a um ideal é que este é sempre desumano e nada favorável ao nosso desenvolvimento.
            Antes de pensar na nutricionista é necessário pensar na pessoa. O fato de você ter estudado nutrição não te absolve de vivenciar dificuldades para lidar com o próprio peso. Mesmo com o diploma você continua sendo uma pessoa como qualquer outra. Entender isso é importante para que você possa abrir mão do ideal que te prejudica.
            Quando você acredita que os pacientes não vão confiar na sua capacidade devido a estar acima do peso você projeta neles o seu próprio preconceito. Eles pararam de te procurar? Deixaram de contar com você? Se livrar dos seus julgamentos é fundamental para que você possa separar sua capacidade profissional do valor que você se dá. E quem disse que as pessoas esperam por uma nutricionista perfeita (coisa que não existe)?
            E o mais importante de tudo é que você encara o que te acontece com ódio e autodepreciação e não percebe que se bem utilizado pode te ajudar muito. Você sofrer com a balança pode te humanizar e te transformar numa profissional melhor, com um olhar mais generoso com as dificuldades dos seus pacientes. Saberá por experiência própria como brigar com o peso e com a alimentação é custoso e oferecerá a quem te procura uma visão muito mais empática. Você tem essa carta na manga, mas depende de você como vai utilizá-la.

segunda-feira, 11 de junho de 2018

Felicidade não pode ser Possuída




             Uma das coisas que as pessoas mais querem na vida é felicidade. Em qualquer povo, de qualquer classe social e cultura todos querem ser felizes. Ninguém se exclui quando o tema é felicidade. Mas apesar da felicidade ser extremamente desejada ela á ainda muito mal entendida e isso leva a terríveis equívocos. Não entender a felicidade faz com que a procuremos de maneira errada e distorcida trazendo cada vez mais infelicidade.
            Estamos todos desesperados pela felicidade e saímos correndo a esmo para encontra-la e fazer dela um objeto que possamos possuir. O maior erro é encarar a felicidade como um objeto, como algo que possa ser possuído. Uma mercadoria quando está em falta leva seus consumidores ao desespero causando tumultos, desentendimentos e até violência. Tivemos recentemente aqui no Brasil falta de combustíveis devido a greve dos caminhoneiros o que fez com que muita gente perdesse o bom senso e agisse com agressividade, ganância e intolerância. Encarar a felicidade como mercadoria só levará a enganos infelizes.
            Empresas e anunciantes inescrupulosos sabem muito bem o poder de se transformar a felicidade em mercadoria. Assim seus produtos e anúncios estão sempre voltados para a ideia de que se alguém tiver tal e qual mercadoria ou fizer uso de tal e quais produtos serão muito felizes, estarão sendo vencedores. Todos querem ser vencedores. O vencedor, acredita-se, é aquele que vence a dor. Mas qual dor? A dor de ser humano e ter que lidar com os sofrimentos que todos temos que passar uma hora ou outra na vida. Achamos que se tivermos a tal da felicidade não teremos mais essa dor. Contudo, quanto mais compramos e possuímos mais a dor fica nítida e nos lembrando que felicidade não é mercadoria.
            Não só mercadorias e produtos são confundidos com felicidade, porém conceitos também. Muitas pessoas usam ideologia política como forma de prometer uma felicidade sem fim. Assim um determinado político e líder é eleito como um messias que levará todos junto mais a nação à um mítico jardim do Éden. Não é isso que vem acontecendo ultimamente? Alguns líderes são considerados mitos e tratados como deuses na Terra. Estou falando de todos os partidos e ideologias e não só de um.
            A religião também é usada com esse fim de prometer felicidade integral. “Seja desse credo” e aí todos os problemas acabarão e nada de ruim irá acontecer. Deus é frequentemente vendido como pílula da felicidade levando muitas pessoas a se enganar. Remédios psiquiátricos também são encarados como solução para aqueles que estão infelizes. Quando mal utilizados só levam à mais desespero e infelicidade.
            Enquanto a felicidade for procurada fora, no externo, através de um conceito, ideologia, crença ou produto será impossível ser feliz. Ela só pode se dar internamente. Ela só pode ser desenvolvida e não adquirida. Se não entendermos isso continuaremos procurando por enganos e jamais abriremos espaço para sermos verdadeiramente felizes. Felicidade se trata de estado de mente e não de um objeto.

sexta-feira, 8 de junho de 2018

Pergunta de Leitor - Alma Insatisfeita




Tenho 32 anos e sou casado há onze com uma mulher, que foi a única que até agora me relacionei. Antes disso só me relacionava com mulheres mas sem sexo envolvido, transava com garotos mas nunca pude estabelecer uma relação estável com outro homem por não acreditar no futuro de uma relação homossexual. Agora tem um homem que me ama e eu o amo. Ele quer que eu largue o meu casamento e assuma a relação. Gostaria mas não posso. Estou confuso, pois amo minha filha que é um encanto e não consigo abandonar minha ideia de casamento perfeito, mas também não posso abandonar o homem que amo. O que me consola é o sexo fácil com homens em qualquer banheiro público. O que faço, o que me aconselha?

            Você se percebe atraído por outros homens. O prazer está ligado a uma orientação homossexual. E também são os homens que te fazem suspirar e sonhar com o amor e não uma mulher. A sua preferência é claramente por homens e agora, talvez, por um homem em particular.
            Fazer sexo em banheiros públicos parece ser mais como um tipo de consolação que você encontra. No casamento falta-lhe algo. Assumir uma relação homossexual lhe parece impossível, então sobra o prazer fugaz e rápido das relações escondidas e sem compromisso. Assim um certo “alívio” biológico é satisfeito, mas a alma continua insatisfeita.
            Casos como o seu há inúmeros mundo afora. Isso ocorre porque há uma idealização do casamento heterossexual e da família. Você funciona procurando na normatização uma vida plena e que te satisfaça. Mas não funciona assim. Em alguma uniões isso é resolvido através dos/as amantes que permitem os casamentos existir. Amantes só existem porque casamento e desejo sexual nem sempre estão em harmonia. Agora, isso já não lhe é mais possível pois o homem que ama não aceita mais ser amante.
            Hoje, seja qual for a decisão, tanto permanecer no casamento quanto assumir uma relação homossexual vai te fazer infeliz porque haverá perdas e rupturas que não se sente capaz de enfrentar. Não sei o que te aconselhar até porque conselhos de nada servem. Não acredito em conselhos. O que acredito é na possibilidade de pensar na situação em que você se meteu para descobrir o que realmente você pode viver. Para isso é necessário uma análise para que, ao compreender a sua história você saiba quem você é, o que quer e o que pode.

segunda-feira, 4 de junho de 2018

O Perigo dentro de Nós




            Com a paralisação dos caminhoneiros que se deu recentemente a ração para alimentar frangos e porcos nos criadouros ficaram suspensas e se observou que os animais, após poucos dias sem alimento, estavam praticando canibalismo. Segundo os especialistas é um comportamento natural quando os animais se veem sem nutrientes e confinados em espaços pequenos. Também vimos cenas de violência entre pessoas. Não se chegou ao canibalismo, mas mostra o quanto a violência é algo inerente aos animais dos quais somos parte.
            Pessoas furando filas, abusando de preços, espalhando boatos catastróficos, roubando combustível, etc. puderam ser vistos ao longo da paralisação. Todavia, mesmo sem paralisações a gente vê esses comportamentos e outros até piores acontecendo por aí. Somos muito mais bestiais do que gostaríamos de admitir e a organização da sociedade está sempre correndo  riscos de desmoronar para abrir espaço para a besta em cada um de nós.
            No clássico texto de Freud Mal Estar na Civilização escrito na véspera da queda de bolsa de Nova York em 1929 fala-se o quão tênue é a linha que separa o indivíduo da barbárie. Para funcionar uma sociedade minimamente organizada se necessita lidar com impulsos muito fortes como a agressividade. Não se pode forçar o outro ao sexo, à morte, roubar porque tudo isso seria a lei do mais forte que propaga cada vez mais violência. Faz-se necessário reprimir alguns instintos para um grupo organizado existir. Porém a vontade de fazer tudo o que se quer, na hora que se quer está latente em nós e pode irromper à superfície facilmente.
            O que nos impede de cair na barbárie é a mente. Quando se há uma mente desenvolvida podemos lidar com nossos impulsos de maneira mais eficiente e pensar sobre nossas ações. Com a existência de uma mente não ficamos tão vulneráveis e submetidos aos impulsos de forma a atuá-los. Reagir aos impulsos é fácil e rápido. Não dá trabalho. Por outro lado responder aos impulsos requer uma mente pois demanda entrar em contato com os instintos mais primitivos e pensar sobre eles e não simplesmente agir.
            Nos momentos de crise a gente vê nitidamente as pessoas agindo sem mente. Contudo quero chamar atenção para os momentos onde não há uma crise tão clara e mesmo assim a gente vê pessoas agindo sem a menor existência de mente: Grupos pedindo a volta da ditadura militar, grupos elegendo outros grupos como inimigos a ser destruídos, pessoas roubando, mentindo, manipulando dentro dos governos, das empresas, nas ruas e até nas famílias. Estamos nos canibalizando.
            Não se trata apenas da falta de políticos honestos, de polícia eficiente, de sistema jurídico justo. É falta de mente. Muito a gente valoriza externamente como status, fortuna, títulos acadêmicos, mas pouco se valoriza de crescimento emocional. Este não promove curtidas nas redes sociais nem gera selfies. O único modo de se lidar com essa vida sendo humano é construindo uma mente. Ela é o nosso melhor e único recurso para lidar com as dores e adversidades que encontramos. Não é uma política, nem religião e nem uma teoria que vai nos dar uma mente. Ela não é dada, mas só pode ser desenvolvida por cada um. É um trabalho pessoal e intransferível. O que pode nos dar uma mente é a consciência de saber que somos responsáveis pelas nossas vidas e pelo o que construímos. Não somos apenas vítimas de tudo o que acontece, mas também criadores. Muito das nossas misérias nós criamos por falta de mente.

sexta-feira, 1 de junho de 2018

Pergunta de Leitora - Felicidade não se ganha




Hoje tenho 50 anos e estou casada há 30. Não gosto mais do meu marido. Ele sempre me traiu, me humilhou e me fez passar ridículo em vários momentos. Sempre fiz tudo por ele e ele nada por mim. Só no começo do casamento foi diferente. Casei amando e acredito que ele também me amou um dia. Hoje mal nos suportamos e nos aborrecemos imensamente. Já pedi a separação mas ele diz que não é viável financeiramente. Já deixei mais do que claro que não o amo e ele agora, por estar aposentado, fica mais tempo em casa precisando de mim. Não quero ficar com ele por perto. Tenho nojo dele. Os homens devem entender que muitas mulheres precisam viver. Sei até de mulheres que se mataram por não aguentarem seus maridos. E meu marido me prende, não me permite ser feliz. Eu o odeio e digo isso a ele todos os dias e já velha nunca trabalhei, ele não queria que eu trabalhasse fora, e nada sei fazer para me sustentar. O que faço?

            Era uma vez um casal jovem que se encantou, namoraram e decidiram casar. No começo foi mil maravilhas. Ele saía para trabalhar e ganhar o pão do dia a dia. Ela ficava em casa para cuidar do lar. Foi um bom arranjo, aparentemente. Afinal, assim ele sabia que sua mulher estava “segura” dentro de casa e não saracoteando por aí e tendo ideias e ela se sentiu protegida em fica no lar doce lar e até pensou que foi uma prova de amor ele sustentar toda a casa.
            Contudo, os contos de fada têm finais diferentes na vida real. Ele foi se sentindo cada vez mais poderoso e com direitos de fazer o que bem quisesse. Como não? Era o provedor inconteste! Ela ficava com medo de questionar, brigar e se mostrar indignada, pois era dependente. E se ele a abandonasse? Um começou a magoar e encher o outro de ressentimentos.
            Agora, ele aposentado volta para casa e ela exerce a sua vingança tão esperada. Ela o xinga, o humilha, para que ele sinta o que ela já sentiu. Ele já velho não pode mais tantas estripulias como antes e talvez até dependa dela agora. Ela, ao perceber isso, cobra os juros e correção monetária do que foi roubada. É um enredo em que ninguém ganha, ninguém sai feliz e nada de bom poderá advir.
            Obviamente você tem direito à felicidade e não precisa viver com esse homem e os arranjos financeiros podem ser feitos mesmo que acreditem que não. Mas ser feliz não é uma coisa que ganhamos dos outros, mas é algo que precisamos conquistar, diariamente. Quem quer ser feliz tem que ir em busca da sua felicidade. Ninguém que fica parado vai encontrar nada de bom. E para caminhar precisa abrir mão do ódio da sua história para reescrevê-la de maneira mais favorável. Vai precisar abrir mão do prazer da vingança. Ninguém te impede de ser feliz a não ser você mesma.