sexta-feira, 29 de junho de 2012

Pergunta de Leitor - Compreender



Estou casado há 8 anos e amo muito minha mulher. No entanto estou vivendo um inferno e não sei mais o que fazer. Há algum tempo eu vinha alimentando a fantasia de ver minha mulher com outro homem. No começo ela nem conseguia ouvir isso e ficava brava. Mas de tanto que eu insisti e pedi pra ela me fazer feliz que depois de algum tempo ela acabou aceitando. Arranjei um cara e fomos para a cama. Na minha fantasia isso seria o máximo, mas eu não me senti bem. Me senti excluído ao ver minha mulher com outro homem, queria morrer. Só não parei na hora porque eu havia insistido tanto com ela e não queria mostrar que tava odiando aquilo tudo. Depois disso minha mulher quer repetir a experiência e acha que eu to feliz com isso. Acho que agora tenho que repetir para satisfazê-la. Me senti e me sinto um lixo, acho que minha mulher está agora interessada em outros além de mim. Sou um verdadeiro idiota, me sinto um banana. Se minha mãe soubesse disso, deus me livre, ela me xingaria muito e me faria sentir pior. Acho que me estrepei e não sei como consertar a burrada que fiz, quero me enfiar debaixo da terra. Como conserto isso?

            Primeiro sua esposa não queria um terceiro no relacionamento de vocês, mas você insiste, diz até que sua felicidade está em jogo, leva a sua esposa acreditar que isso lhe é importante, consegue convencê-la e arruma um outro homem. A fantasia se realiza e você se sente a pior das criaturas e fica por baixo. A pergunta que você precisa responder é por que se colocou nessa situação?
            Você criou toda essa situação e diz que foi para realizar uma fantasia. Não há nenhum problema em realizar uma fantasia, mas parece que você arriscou demais e sente que agora perdeu sua mulher. Aliás, a sua mulher foi usada e você nem ligou para os sentimentos inicias dela, tudo o que lhe importava era satisfazer a sua fantasia. Por que será que essa fantasia te atraía tanto? Penso que na verdade essa fantasia está a serviço de um gozo masoquista.
            Digo isso porque você não conseguiu até agora dizer para sua mulher que não gostou da experiência, nem na hora que aconteceu e nem depois. Parece até que curte o sofrimento que sentiu e sente, como se não pudesse se afastar dele. Será que há um prazer inconsciente em se sentir excluído e se ver como banana? Você mencionou que se sua mãe soubesse ela iria te xingar. Por que disse isso? Sua mãe costuma te xingar? Você sente que ela te excluía?
            Ao realizar sua fantasia você se sente mal e se culpa, mas ao mesmo tempo vive um prazer secreto tanto que aceita repetir a experiência. Sente vergonha e quer se enfiar debaixo da terra. Pode encontrar o porque disso ao analisar a sua história de vida e dar um sentido a sua fantasia, bem como entender qual a posição que você se coloca. Melhor do que consertar é se compreender.

segunda-feira, 25 de junho de 2012

A Força do Inconsciente



            Recentemente circulou na internet e nos jornais uma notícia de um padre irlandês que numa conversa com pais de alunos de um colégio católico ao fazer uma apresentação de slides trocou a pen drive e em vez de surgir no retroprojetor a apresentação esperada, apareceu fotos pornográficas homossexuais. O padre, envergonhado, abandonou a audiência sem dizer nada e é claro que causou uma comoção geral, sendo esse assunto levado até ao Vaticano. Pensando nessa notícia acho que podemos refletir sobre o inconsciente e sua influência nos atos das pessoas.
            Uma das grandes descobertas de Freud ao formular a psicanálise foi criar o conceito de inconsciente. Podemos entender a mente, de forma grosseira, como tendo um consciente, que é tudo aquilo que é de fácil acesso e conseguimos saber que pensamos e é tudo aquilo que acreditamos que somos, e tendo um inconsciente, que é cheio de conteúdos emotivos e geralmente reprimidos, esquecidos e desconhecidos. É que muitas vezes não gostamos de nos dar conta que sentimos determinadas coisas que julgamos erradas e feias ou que ás vezes não sabemos como lidar e que traz muita angústia e com isso a “colocamos” no inconsciente para que lá fique esquecida, mas fica apenas esquecida porém esses conteúdos não são “jogados fora” para sempre. Ao estudar as patologias da mente Freud percebeu que os sintomas, que são sempre desagradáveis, tinham como origem a emoção que havia sido reprimida no inconsciente. Até mesmo nos chamados atos falhos, que é quando trocamos nomes e fazemos coisas opostas do que conscientemente queríamos fazer, têm origem nos conteúdos provenientes do inconsciente, ou seja, o inconsciente até pode ser desconhecido, mas é bastante ativo nas nossas atitudes.
            Sabendo disso podemos entender que muitos dos nossos atos e falas vêm dessa parte de nossa mente que tentamos trancar. No entanto, em algum momento aquilo que foi reprimido pode retornar, em alguns casos sem querer, à nossa mente e revelar algo. Esses momentos são reveladores bem como embaraçosos, principalmente quando mostra algo de nossa identidade que desejaríamos que jamais fosse conhecido, tanto por nós mesmos quanto pelos outros.
            Podemos levantar uma hipótese de que nessa historia do padre irlandês o que o fez trocar a pen drive tenha sido um ato falho. Lógico que não é possível afirmar com certeza de que tenha sido isso, pois para tanto seria preciso analisar a historia dele com ele próprio, mas mesmo assim dá para se pensar que dentro de si ele estava vivendo um conflito. Obviamente ele tinha aquelas fotos pornográficas e as via, mas também devia sentir muita culpa por fazer isso. De alguma maneira, em seu engano, ele pôde se punir por seu desejo inconfessável e também revelar esse mesmo desejo. Pois é, o inconsciente é todo paradoxo e não segue uma lógica racional. No seu ato falho, podemos pensar que o padre alcançou tanto a punição como revelação por sentir algo que deseja e detesta ao mesmo tempo. Fatos como esse mostram a força do inconsciente e de que ele é algo, em nossa vida mental, que é inegável e formador de quem realmente somos. Entender o inconsciente é colocar mais uma peça no quebra-cabeça humano.

sexta-feira, 22 de junho de 2012

Pergunta de Leitora - Um Novo Recomeço



Gostei muito de uma pergunta que você respondeu para uma mulher que havia ficado viúva e gostava de aproveitar a vida. Eu também sou viúva, fiquei casada por 30 anos. Hoje tenho 63 anos e estou viúva há 4 anos. Ao contrário da mulher que vc respondeu a pergunta e que disse que amava o marido eu nunca amei meu falecido marido. Sempre foi um casamento ruim e nunca tivemos momentos bons. Fui forçada a casar com ele porque meu pai descobriu que eu tinha perdido a virgindade com ele e foi ele quem contou isso para meu pai. Descobri que nunca pude confiar nele e só me sentia presa. Hoje vivo com a aposentadoria que ele deixou e aproveito como nunca. Voltei a aprender a tocar harpa que meu marido odiava e achava besteira. Só não tenho namorado. Acho que aí pra mim é demais. Mas digo que ser viúva não é fim da vida, mas uma oportunidade para viver mais.

            Antigamente uma mulher só era livre de fato quando ficava viúva. Se não, ela tinha que responder sempre ao marido. Como se ela não tivesse uma identidade própria e precisasse do aval do esposo para ser alguém. Em muito romances da literatura clássica a mulher casada e que tivesse recursos materiais até almejava ser viúva para assim se encontrar livre.
            É que à mulher foi dado um papel de não desejar. Ela, para se encontrar no papel esperado, tinha que abdicar dos desejos próprios e fazer os desejos de sua família a única coisa que valesse a pena lutar. Estar nessa posição é ficar presa e um convite para se afundar em ressentimento.
            Hoje você reconhece que se ressente do seu marido que era alguém em que não podia confiar. Ele não te tratou com respeito quando contou para seu pai algo que pertencia apenas à vida íntima de vocês dois. Ele simplesmente passou por cima de seus sentimentos e demonstrou com essa atitude que o amor não os ligava de fato, mas sim o controle. Como seria possível amar alguém assim? Impossível!
            Agora o mais importante é que o ressentimento por tantos anos de prisão não comprometeu você viver sua vida. Talvez você já tenha ficado muito tempo nessa prisão e já tenha pagado muito caro por ela. Faz bem em aproveitar o que a viuvez lhe traz e conhecer seus desejos e se desenvolver. É um recomeço para sonhar novamente. Quem sabe quais novidades a vida lhe reserva? A liberdade lhe acena várias possibilidades e é preciso vê-las e agarrar aquelas que te trazem realizações.

segunda-feira, 18 de junho de 2012

Psicopata



            Muitas pessoas vêm perguntando se a mulher que matou o marido em São Paulo e depois o esquartejou é uma psicopata. Há a alegação de que poderia se tratar de legítima defesa, afinal existe relatos de que eles brigavam muito e ele já havia batido nela. A legítima defesa, como o próprio nome diz, é legitimo e ninguém é um psicopata só porque se defende. Preservar-se é um direito de todos. Agora fazer um diagnóstico é algo complexo demais e não deve ser levado levianamente. Porque, ás vezes, diagnosticar é o mesmo que rotular e isso é sempre um mau negócio.
            Porém, podemos pensar em alguns pontos sobre esse caso. Um psicopata, falando grosseiramente e de forma geral, é uma pessoa que não tem a capacidade de ver o outro como pessoa. Os psicopatas não têm a empatia, que é se colocar no lugar do outro e por isso mesmo eles conseguem matar ou destratar o outro com facilidade. Há vários tipos e graus de psicopatia, nem todos são iguais. Há aqueles que são assassinos, estupradores e serial killers, mas há também outros que não cometem nada que aparentemente seja tão grave, mas que não deixam de ser perniciosos como os corruptos, ladrões e os sádicos. Sim, um corrupto pode ser considerado um exemplo de psicopata, já que rouba o que é o dos outros ou da nação e traz muito prejuízo tanto financeiro como prejuízo moral que é até mais grave.
            Então podemos entender que uma personalidade psicopática é alguém altamente egoísta e que só se importa consigo próprio e jamais consegue ter uma mente emocional mais desenvolvida que permita enxergar o outro. Tem uma mente emocional bem primitiva e pessoas assim são bastante impulsivas e quando se sentem em desvantagem não hesitam em atacar da forma que for. Por sua primitividade não toleram o menor aborrecimento e passam por cima dos outros sem a menor consideração. São frios, pois negam os sentimentos já que os considera sinal de fraqueza. Eles negam o lado humano neles próprios e nos outros.
            Voltando ao caso da mulher que matou o marido podemos levantar a hipótese de que sim, ela se trate de uma psicopata. Arrisco essa hipótese, mas não arrisco um diagnóstico já que para isso é necessário muito mais informações e tempo. Aliás, eu não confio em diagnósticos de forma geral, acho que eles mais atrapalham do que ajudam, no entanto sei que há momentos em que eles são úteis e necessários. Levanto a hipótese que ela possa ser uma psicopata baseado em dois fatos principais. O primeiro é que ela não apenas matou o marido, mas também o esquartejou e isso é um sinal muito revelador. O assassinato por legítima defesa até tem explicação e entendimento, mas o esquartejamento não. Se trata de uma ação perversa e calculista, encontrada em uma psicopata. O segundo é que para ela conseguir realizar o esquartejamento ela precisou de quatro horas, segunda as informações da imprensa. Quatro horas realizando algo que faria a grande maior parte das pessoas tremerem de medo e nojo. É preciso muita frieza para isso. Alguns podem dizer que ela tinha formação em enfermagem e por isso teve ousadia para tanto, mas nenhuma enfermeira é treinada para matar alguém e depois esquartejar. Por essas duas características é que formulo a hipótese de que ela é sim uma psicopata.

sexta-feira, 15 de junho de 2012

Pergunta de leitor - Ciúmes Enlouquecedor



Tenho ciúmes patológico da minha mulher. Muitas vezes saio do meu trabalho para segui-la. Sempre acho que ela está me traindo, consigo visualizar as cenas até. É algo que me deixa louco e faz eu perder muitos negócios. Ganho menos dinheiro nesses últimos anos por perder tempo em ficar seguindo minha mulher. Estamos casados há 4 anos e ele é mais jovem e linda e sei que outros caras mexem com ela. Até agora não vi nada que a condenasse, mas sei que ela pode ter um amante. Sinto que ela tem um amante. Cheiro as roupas dele para saber se transou com outro. Procuro por sêmen e por cheiros de outros homens. Só que isso tá acontecendo todos os dias e me faz ver cenas da minha mulher transando com outro. Não sei mais o que fazer para parar com isso. O que me diz?

            Possivelmente você não percebeu, mas cometeu dois atos falhos ao escrever seu email. O primeiro foi quando falou ele é mais jovem  ao invés de dizer ela é mais jovem. O segundo foi ter escrito cheiro as roupas dele, mais uma vez trocou ela por ele.  Os atos falhos não acontecem à toa. Eles têm uma origem no inconsciente e são bastante reveladores. Freud, criador da psicanálise, fez várias referências aos atos falhos em seus textos, mostrando a sua importância para a compreensão do inconsciente. 
Os ciúmes usam um mecanismo chamado projeção que é atribuir ao mundo e pessoas externas coisas internas, ou seja, a pessoa vê fora algo que acontece dentro dela mesma. Ao atribuir fora de si seus sentimentos a pessoa se sente segura e preserva a sua autoimagem. É uma forma de defesa psíquica.      
Ao ter tanta certeza da traição da sua mulher apesar de não possuir nenhuma evidência que te mostre isso você está falando das suas fantasias. Ao atribuir com tanta veemência a existência da traição dela você se protege das suas fantasias de traição. Você consegue até imaginar as cenas todos os dias, não consegue se livrar dessas cenas, mas isso faz pensar que o desejo pela infidelidade seja seu, só que ao jogar na sua mulher você também tenta transferir essa responsabilidade para ela.
Voltando ao seus atos falhos de ter trocado o pronome feminino pelo masculino levanto a hipótese de que se trata de um desejo homossexual reprimido. Não digo com isso que você seja homossexual, mas parece haver um desejo que pede por entendimento. Entendimento esse que pode ser conquistado através da análise. Ao se colocar em análise você pode ter a chance de examinar com atenção quais são essas fantasias que permeiam sua mente e com isso se entender melhor e não mais se enlouquecer.

segunda-feira, 11 de junho de 2012

Pessoas Zumbis



            Ultimamente há muitos filmes e seriados sobre zumbis. Zumbis são mortos-vivos que não têm nenhum sentimento que possamos chamar de humano e só querem saber de se alimentar do que for que estiver vivo na sua frente. O lado humano fica totalmente ausente e viram monstros que aterrorizam aqueles que ainda se encontram vivos. Essa estória de zumbi está fazendo muito sucesso porque é uma alegoria do que realmente acontece conosco.
            É claro que não há zumbis verdadeiros, pelo menos não daqueles que vemos em filmes, mas que há pessoas que se comportam como zumbis isso certamente há. Pessoas que deixam de lado sua humanidade e passam a agir de forma meio desconexa. Evitam sentir, se distanciam da empatia e acreditam que assim estão se protegendo. Grande engano. Agir assim só faz com que sentimentos nobres tais com compaixão, reparação, gratidão fiquem de fora contribuindo para piorar a qualidade das relações. Menos qualidade nos relacionamentos, mais zumbis são produzidos.
            Viver é sentir, se encantar e se emocionar. Quem tenta se afastar disso tudo morre, apesar de estar vivo, até porque a vida não é apenas se locomover e ficar andando de um lado para o outro, mas vida é acima de tudo se fazer humano, ou seja, sentir as coisas e lidar com as emoções. Aqueles que procuram matar seus sentimentos querem morrer.
            Nos filmes o enredo é sempre o mesmo: zumbis destruindo tudo o que vêem pela frente. E isso acontece também com aquelas pessoas que se comportam como zumbis. Elas destroem tudo e todos com sua falta de empatia. Passam a ser seres monstruosos que nada lembram o humano. Tornar-se um morto-vivo nunca é um bom negócio. É apenas uma fuga de quem se sente incapaz de viver como ser humano. O antídoto é nascer de fato para a vida.

sexta-feira, 8 de junho de 2012

Pergunta de Leitora - O namorado e o cachorro



Tenho 24 anos e namoro há dois. Meu namorado tem um ciúmes doentio do meu cachorro. É que eu amo muito meu cachorro e dou muita atenção para ele. Meu cachorro é tudo de bom. É bonito, me entende, me faz companhia e me respeita em todos os sentidos. Já com meu namorado é tudo bem mais difícil. Ele sai com amigos, temos brigas e muitas vezes nunca me entende como meu cachorro. Quando falo essas coisas pra ele ele fica possesso, como se tivesse um demônio dentro dele. Mas ele tem que ser realista e perceber que o cachorro é bem melhor que ele. Acho que se ele pudesse ele mataria o cachorro. Ele deveria aprender com o Thor, nome do meu cachorro, como se comportar como um verdadeiro homem e ficar só comigo. O Thor é bem mais cavalheiro. É infantil da parte dele ter tanto ciúmes assim, mas ele nunca quer ouvir a verdade. É tão mais fácil ficar com meu cachorro do que com meu namorado. Como faço para ensinar meu namorado ser melhor?

            Seu namorado, provavelmente, só aceita a posição em que se encontra porque tem um lado masoquista bem pronunciado. Se assim não fosse vocês já não estariam mais juntos. Afinal, quem quer se tratado e ensinado como um cachorro?
            Os cães podem ser excelentes companhias porque dão amor incondicional. Não há a menor dúvida de que há cães maravilhosos e sensíveis e que estão sempre atentos aos seus donos. Aceitam ordens com facilidade e estão sempre num estado de felicidade. Realmente os cachorros são criaturas fáceis de se conviver.
            Porém, há uma diferença entre se relacionar com seu cachorro e com seu namorado. Você espera que seu namorado seja como seu cachorro, que a vida dele gire ao seu redor e que ele esqueça que tem vida própria. Você espera isso dele porque tem mais segurança no amor que recebe do seu cachorro do que do amor do namorado. Seu namorado não precisa ser seu cachorro e agir tal como ele para você se sentir amada.
            Namorados têm conflitos e ele tem a vida dele independente de você. Não dá para esperar que ele se comporte como se só existisse você. Ter um cão é bem mais fácil do que ter um namorado. Você já tem um cachorro e precisa se perguntar se quer um namorado. Você já sabe se relacionar com um cachorro, agora falta aprender a se relacionar com o namorado.

segunda-feira, 4 de junho de 2012

Mágoa



            A mágoa é um sentimento que envenena a alma. A própria palavra vem do latim e quer dizer mancha e machucado. Esse sentimento tem como origem uma situação de ódio que não pôde ser bem resolvida e que continua a existir no presente como uma mancha que persiste em não sair e leva a lembrar daquele evento que tanto marcou.
            O ódio é uma emoção intensa e acontece quando ocorre algo que nos desagrada. Só que ninguém gosta de admitir que está com ódio e que, vez ou outra, fica vulnerável a ele, o que acaba por transformar o ódio em algo que deve ser evitado de ser admitido a todo custo. No entanto, não é possível brigar contra a natureza das nossas emoções e tentar isso pode trazer conseqüências amargas.
            É claro também que não é necessário a pessoa se entregar ao ódio sem nenhuma restrição. Isso só levaria à violência e é característico de pessoas que não têm desenvolvidas uma mente que possa conter as emoções. Para se lidar com o ódio é necessário um trabalho mental que em psicanálise se chama de elaboração. É um processo tal qual ocorre na digestão. No processo digestivo algo que foi engolido passa por várias etapas e em cada uma delas é separado aquilo que serve como nutrição e aquilo que é considerado lixo para ser excretado. Ao lidar com o ódio, na elaboração psíquica, tem-se a chance de usar dessa experiência que causou o ódio para se aprender algo e se tornar mais sábio. É um fato de que na vida podemos aprender muito com as experiências negativas. Se esse trabalho de elaboração for bem sucedido a pessoa pode se desapegar desse sentimento de ódio, pode se desfazer dele, afinal ela o digeriu. Quando esse processo não ocorre pode se formar uma mágoa.
            A mágoa é então o resultado de se ter passado por um intenso processo de ódio e raiva e não ter sido possível a elaboração desse evento. Porém, aquilo que não é elaborado continua existindo, só que de uma forma crua e que traz sofrimentos. Quem se encontra magoado, ou seja, machucado e manchado não consegue se esquecer do evento primário que originou a raiva e fica preso a essa situação sem conseguir se libertar. Com o tempo essa mágoa pode aumentar e passa a dominar toda a mente tornando a vida insuportável. Para resolver isso se faz necessário um trabalho de elaboração, no qual o ódio poderá ser digerido e transformado em algo que seja muito mais benéfico para vida.

sexta-feira, 1 de junho de 2012

Pergunta de Leitora - Aprender a escolher



Estou casada já faz quase 35 anos. Sempre fui uma esposa fiel e cumpridora de todas as tarefas do lar e nunca pedi ou exigi nada do meu marido. Casei porque acreditava que toda mulher que decide não ser freira acaba fazendo, nunca estive realmente apaixonada por meu marido. Depois de apenas 3 anos de casada descobri que meu marido me traía. Saía com outras mulheres e se divertia. Até hoje isso continua. Foram várias as vezes que já encontrei nota de motel nos bolsos das calças dele. Nunca falei nada, nunca reclamei, nunca me zanguei. Sei que ele as vezes fala que tem que viajar a trabalho, mas sai mesmo é para passear com as mulheres com quem ele sai. Já foi até para o nordeste levando mulheres e nunca me levou para lugar nenhum. Eu penso em vingança. Sei que ele é cardíaco e que um dia vai ter um piripaque. Quando esse dia acontecer vou gastar todo o dinheiro dele e caso ele fique entravado numa cama eu vou judiar bastante dele. Eu sei que isso parece mesquinho mas não consigo evitar ter esse pensamento. Só que eu sinto que tudo isso me faz mal. Queria saber relevar tudo isso, mas eu sempre me afundo nesses pensamentos. A questão é: se tudo isso pode mesmo me fazer mal?

            Você mesma já sabe a resposta à sua pergunta quando afirmou que sente que toda essa sua atitude te faz se sentir mal. O que será que você espera ao me fazer essa pergunta? Que eu legitime seu sentimento de vingança ou que te convença a relevar tudo? Seria muito mais produtivo não ficar presa nem em uma ou outra dessas alternativas, mas pensar sobre o que te acontece.
            Seu casamento não foi motivado por amor, por uma vontade de ficar junto, mas porque você acreditava que era o que se esperava de uma mulher. Apesar de que há 35 anos o tempo era outro, assim mesmo havia outras opções além do casamento e da vida religiosa. Porém, você optou pela passividade, em não se responsabilizar pela sua vida e escolhas. Talvez você fosse jovem demais e não tivesse ninguém para te ajudar a pensar diferente, mas a questão é que o tempo foi passando e você nunca procurou mudar de posição.
            Aliás, chamou bastante atenção que você tenha usado a palavra nunca várias vezes. Você nunca viveu, nunca aproveitou nada e sente um ódio imenso ao ver isso. Em vez de usar o ódio para te motivar a sair dessa situação e ir em busca de outra que lhe fosse mais favorável, você se calou e se resignou e o ódio se tornou mágoa. Mágoa nada mais é do que ódio cristalizado e só serve para envenenar a alma. Está envenenada porque desperdiça seu tempo fantasiando vingança ao invés de fantasiar a vida que poderia ter.
            Você já perdeu muito tempo da sua vida: 35 anos! É preciso agora que você se desapegue da paixão da vingança e use o ódio que sente para transformar sua situação. Para isso vai ser preciso aprender a fazer escolhas que lhe sejam boas e não te leve ao ódio e ressentimento. Agora é hora de você aprender a fazer a escolha certa.