Há
algum tempo empreendi uma caminhada, de vários quilômetros, pelas estradas
rurais de Londrina com um grupo, cujo objetivo era uma reflexão acerca da vida
e dos valores que damos a determinadas coisas. A caminhada, que se fazia
através de estradas de terra e por trilhas no meio da mata, apresentava
variados graus de dificuldades e foi uma boa metáfora para se pensar sobre como
vivemos a vida e o que fazemos dela. Refletir sobre como empreendemos as coisas
é uma das atitudes mais enriquecedoras para a mente (espírito) e permite que se
for observado estarmos num caminho nada favorável, deve-se pegar outro sem
demora.
Para
se empreender uma caminhada dessas é necessário abrir mão do conforto. Afinal,
lama, poeira, sujeira, calor e a falta de banheiros torna tudo bem diferente do
que estamos acostumados no nosso dia a dia. É fato que tendemos a recusar tudo
aquilo que nos causa desprazer e se apegar ao prazer. Freud, em seu texto Sobre os dois princípios do funcionamento
mental, mostra que há o princípio do prazer e o princípio da realidade. O
primeiro é tudo aquilo que nos leva a querer coisas que nos gerem prazer e sem
que nenhuma adversidade se apresente. Já o princípio da realidade aceita que há
dificuldades e que não há como elas deixarem de existir. Elas podem apenas ser
acolhidas e trabalhadas.
A
vida real, tal como uma caminhada, é cheia de adversidades e de nada adianta
maldize-las. A única coisa a ser feita é enfrenta-las. Muitas vezes teremos que simplesmente acolher
que não estamos em um momento confortável em nossas vidas, mas que ao invés de
usar tudo isso para se lamentar é muito mais proveitoso trabalhar com o que se
tem a fim de que esse desconforto possa ser modificado. Quem não caminha na
própria vida fica paralisado e se impede de ir em frente, crescendo e se
desenvolvendo. Exatamente como na caminhada física e concreta não dá para a
gente desistir e querer ficar pelo meio do caminho.
Muitas
vezes durante a caminhada física sentimos que não vai dar mais, que o melhor é
desistir e se lamuriar por ter feito a besteira de se jogar numa empreitada que
pode despertar o sentimento de fracasso, mas isso demonstra o quanto
acreditamos muito pouco em nós mesmos. A verdade é que a gente se surpreende
muito com nossas capacidades quando realmente nos propomos a fazer alguma
coisa. E na vida mental também é assim. O desejo de desistirmos de um sonho, de
um projeto e de uma esperança é sempre forte, porém o que a psicanálise ensina
é que nem todo desejo é bom e ele deve antes ser pensado para que o preço
depois não seja alto demais.
Os
sentimentos que uma caminhada física, cheia de desafios, nos desperta é algo
que podemos e devemos usar para olharmos como estamos vivendo a nossa vida. Com
essa reflexão há a possibilidade de aprendermos a valorizar o que vai nos
fortalecer e melhorar e abandonar aquelas ideias que só nos imobilizam e que
obviamente só tem como resultado nos deixar mais fracos. É difícil num domingo
ter que acordar cedo, enfrentar tantos desconfortos, correndo o risco de se machucar
e levar tempo para terminar e ver o resultado. Mas a vida não é assim também?
Agora, quem ousa percorrer o caminho poderá também dizer das conquistas e dos
prazeres encontrados durante o percurso. O sentimento de superação e realização
só está disponível para aqueles que escolhem viver a caminhada da própria vida.
Não há e nem tem porque fugir da vida, então o jeito é cada um pegar a sua
trouxa e se lançar na estrada da vida acolhendo e trabalhando com tudo o que o
caminho nos dá. Como já disse a psicanalista paulista Betty Milan para se saber do caminho é preciso caminhar.