Uma antiga historieta medieval pode nos ajudar a
compreender melhor nossa relação com nosso mundo interno, psíquico. “Um servo que um dia estava na feira olhando vários
produtos dispostos se deparou com a morte que olhou para ele de uma maneira
estranha. O servo ficou com muito medo e saiu correndo até a casa de seu
senhor. Lá ele suplicou que havia sido sempre um bom servo e pediu um cavalo
para fugir para Salamanca já que a morte o havia olhado. O senhor, que gostava
muito do servo, concordou em dar o cavalo e deixou o servo fugir para a cidade
de Salamanca, mas intrigado com a situação foi a feira e ao ver a morte a
indagou porque ela tinha assustado seu servo tão querido. A morte então lhe
respondeu que não o tinha assustado, mas que tinha ficado surpresa ao
encontra-lo ali quando nessa mesma tarde ela tinha um encontro marcado com ele
na cidade de Salamanca”.
Nunca conseguimos nos livrar dos nossos problemas
psíquicos. Muita gente imagina que basta não pensar, tentar evitar ou postergar
o mundo emocional que ele desaparecerá magicamente. Ledo engano! Isso nunca
acontece e o que se passa é que quando mais evitamos aquilo que é nosso, do
nosso mundo interno mental mais vamos pagar caro para viver. Quando fingimos
que não precisamos nos responsabilizar pelo nosso mundo interno mais esse mesmo
mundo psíquico nos cobra demasiado.
Há pessoas que tendem a encarar o mundo interno como se
fosse algo secundário. Quando alguém sofre de alguma doença orgânica, por
exemplo, busca tratamento, remédios e dependendo do caso até cirurgia. Porém,
quando muitas pessoas padecem de depressão, angústia extrema, medos irracionais
desproporcionais, repetições de situações que causam sofrimento, etc. muitos
acham que não se trata de algo sério e por isso mesmo não buscam tratamento
adequado.
Aquilo que pertence ao nosso mundo interno não tem como
ser evitado. Está ali e por mais que corramos de um lado para o outro sempre
nos acompanhará, sempre nos encontrará. Já ouvi um sem número de pessoas que
queriam resolver suas angústias apenas mudando de emprego, de cidade, de
parceiro amoroso, de casa e por aí vai. Na grande maior parte das vezes queriam
fugir do que sentiam como se isso fosse dar certo. Queriam uma mudança externa
e esperavam que esta levasse à uma mudança interna. Se não encaramos esse
estranho mundo interno nosso não adianta para aonde quer que vamos porque esse
mundo interno, com todos os seus conteúdos, estará sempre nos encontrando.
Tal como o servo da historieta medieval não temos como
fugir de algo que já tem um encontro marcado. Nosso mundo interno sempre tem um
encontro marcado com nossa vida e se pudermos nos deparar com ele poderemos
viver com mais qualidade e não desperdiçar energia em fugas ineficazes.