sexta-feira, 26 de julho de 2019

Pergunta de Leitora - O sonho e o desejo




Gostaria muito que você olhasse essa mensagem! Eu tive um sonho e sempre quis saber o que significa, se é só paranoia minha. Eu estava em uma floresta e nela tinha uma casa em cima de uma pequena serra, uma casinha simples e eu dançava com um rapaz. Nós dois dançávamos como se estivéssemos em um baile. Estava vestida com uma blusa branca, jaqueta vermelha de couro, mini saia jeans e um meião preto com uma bota marron e ele usava uma roupa preta, camisa social e calça jeans e nós dois estávamos muito felizes e apaixonados nesse sonho. Desde então eu me apaixonei por esse homem que não sei quem é! Detalhe: a floresta tinha uma mistura de um lugar brasileiro com uma mistura americana. Vou te dizer como era o rapaz. Tinha olhos azuis, alto, branco e cabelos pretos, era um pouquinho comprido. Eu sempre dizia aos meus amigos que eu me casaria com um americano de olhos azuis e loiro, mas depois que sonhei com esse homem de cabelos pretos me apaixonei e agora meu coração bate forte quando penso nele e fico imaginando nós dois. Isso é normal ???


            Você teve um sonho que mexeu bastante e te inspirou. Freud, criador da psicanálise, sempre se interessou pelos sonhos e escreveu seu famoso livro A Interpretação dos Sonhos, onde decorre sobre a natureza do material onírico (sonho) explicando vários elementos que antes eram tidos como sem importância e significado pela ciência. Os sonhos, nas palavras de Freud, são a via régia para o inconsciente, ou seja, são como uma estrada pavimentada que nos leva para o nosso mundo mental.
            Uma das, entre tantas,  funções dos sonhos é a realização de desejos. Em crianças, fica-se bastante perceptível esse processo quando os pequenos sonham que estão brincando, ganhando presentes ou comendo comidas gostosas. Aquilo que é um desejo, torna-se através do sonhar, algo que dá a sensação de realidade. Alguns estudiosos da neurologia até mesmo afirmam que gatos e cachorros, por exemplo, sonham que estão se fartando com alimentos.
            Para uma interpretação mais acurada só mesmo se você se colocar em análise e nela, junto ao seu analista, empreenderem um processo de associações que levem ao sentido mais verdadeiro do sonho. Interpretar um sonho não é consultar um almanaque e forçar sentidos, mas é um trabalho que requer que você vá trazendo para os elementos do sonho as suas ideias e crenças, para que o material seja então “compreendido” de uma maneira que traga um sentido. É trabalho artesanal e demanda um processo analítico.
           Quanto a seu sonho, não há como dizer com detalhes o que significa, porque como dito acima requer todo um processo. Porém, ousaria dizer que você realiza um desejo nele que é se apaixonar. Talvez interesse menos o rapaz do sonho e mais o fato de que você se encanta ao se perceber apaixonada. Possamos, talvez, dizer que você está apaixonada pela paixão. Realiza através do sonho uma paixão arrebatadora que faz o coração bater forte até mesmo quando já acordada. Apesar do sonho trazer a sensação da realização de um desejo, a verdadeira realização só acontece no mundo real. O sonho você já tem. Quem sabe, então, não venha a aprender a “dançar” no mundo externo e a viver o que puder ser vivido?

segunda-feira, 22 de julho de 2019

A diferença entre sonhar e se iludir




            Ele era um jovem que morava no interior. Por ser filho de um domador de cavalos, tinha uma vida quase nômade e muito simples. Mas ele sonhava com uma vida diferente. Dormia nas cocheiras, trabalhava duro e, nos intervalos, à noite, ele procurava uma escola ou professores para iluminar a sua inteligência.
            Em uma dessas escolas, certa vez, o professor pediu a cada aluno que escrevesse o seu sonho, o que desejavam para vida.
            O jovem, tomado por um entusiasmo, escreveu sete páginas. Desejava, no futuro, possuir uma fazenda e morar numa enorme casa. Desejava ter uma boa vida e ajudar outros a estudar.
            Tão entusiasmado estava que não somente descreveu, mas detalhou com pormenores a casa que sonhava morar, as cocheiras, os currais, o pomar de sua fazenda. Tudo com grandes detalhes. Quando entregou o seu trabalho, ficou esperando, ansioso, pelas palavras do professor.
            Após três dias, o trabalho foi devolvido com uma nota baixa. O professor lhe disse que o seu sonho era absurdo. Imagine só, o filho de um simples trabalhador iletrado. O professor disse que ele precisava entregar outra redação, desta vez mais realista e coerente com ele.
            O jovem, voltou para sua casa, muito triste e contou ao pai sobre o ocorrido. Depois de ouvi-lo o pai lhe disse que o sonho era dele e que cabia a ele persistir no sonho ou troca-lo por outro.
            Pensando nisso o jovem, no dia seguinte, retornou a escola e voltou a entregar a mesma redação dizendo que preferia ficar com uma nota baixa do que abrir mão do que sonhara.
            Essa história foi contada para várias pessoas pelo dono de uma fazenda que mora numa belíssima casa e é apoiador de um famoso colégio que ajuda muitos jovens. Um dia, o antigo professor se apresentou, por ter identificado no proprietário da fazenda o antigo aluno e confessou: “Fico feliz que tenha escapado da minha inveja. Naquela época eu era um atormentado. Tinha inveja de quem sonhava. Destruí vidas com meu rancor. Roubei o sonho de muitos. Ainda bem que não consegui destruir o seu sonho, que faz bem a tantos. Sonhar, na verdade, é belo. Tudo o que existe no mundo, um dia foi sonhado por alguém. Antes de algo virar alguma coisa primeiro precisou habitar os sonhos.” (Autor desconhecido)

            A habilidade de sonhar é vital em nossas vidas. Quem não sonha não é capaz de realizar nada. Claro que não basta apenas sonhar senão o sonho passa a ser mera ilusão, mas o sonho precisa ser realizado. Realizar requer todo um processo que demanda tempo, paciência, dedicação, persistência e tolerância às frustrações. Realizar os sonhos não se trata de mágica, mas de muita inteligência para ir fazendo o sonho passar pelos testes de realidade.
            Sonho e ilusão não são a mesma coisa. Ilusão não tem como existir, é apenas um produto mental. Sonhar, entretanto, é o que nos motiva a concretizar algo, a criar algo. Primeiro sonhamos para depois ir atrás. O sonho é só o ponto de partida. Já a ilusão é só ficar preso no terreno das ideias sem jamais experimentá-las. Saber discriminar entre esses dois é fundamental para viver ou fingir que se vive.

segunda-feira, 15 de julho de 2019

A semente de um novo olhar




            Há uma frase do escritor Oscar Wilde muito interessante para pensarmos como as transformações nos fazem ser pessoas diferentes ao longo da vida. A frase diz: Desculpe, mas não reconheci você, eu mudei muito!  Geralmente, quando não reconhecemos alguém se pensa que a outra pessoa mudou e por estar diferente fica irreconhecível. Porém, essa frase espirituosa nos mostra que, ás vezes, nós mudamos e aquilo tudo que antes era tão reconhecido já não o é mais.
            Coisas que antes pareciam nos divertir tanto e fazer tanto sentido no passado uma hora não faz mais sentido algum. Desejos que antigamente pareciam ser tão importantes podem evaporar e dar espaço para outros. Estamos sempre em mutação e isso é bom porque somente o que está vivo pode mudar e evoluir. O que está morto não muda nunca.
            Assim como interesses e desejos mudam no decorrer da vida os relacionamentos também mudarão. Casamento e algumas amizades também sofrerão transformações. Muitas uniões terminam porque um ou os dois mudaram a tal ponto que aquela união não traz mais sentido. Sim, isso acontece. Nem todas as separações são ruins. Pode ser que as transformações levaram um a não mais reconhecer o outro.
            Mudanças de carreira também são possíveis. Há gente que sempre se dedicou e investiu numa dada carreira, até sendo bem sucedidos, mas chegou um momento que as transformações internas os fizeram tomar outro rumo surpreendendo eles mesmos ou as pessoas próximas. Enquanto estamos vivos e nos envolvendo com a vida nós aprendemos e são justamente essas aprendizagens que nos transformam. Quanto mais vivemos mais iremos nos transformar, mais iremos evoluir.
            O contrário, ou seja, não se permitir aprender com as experiências de vida nos deixa estancados, sem nunca se transformar e por isso presos às mesmas coisas. São pessoas que estão sempre a reclamar da vida e que possuem uma visão extremamente negativa sobre tudo e todos. Creem já saber tudo e tornam-se arrogantes e chatos. Em outras palavras, são pessoas que não mudam e se mudam é tão pouco que é imperceptível. Estão biologicamente vivos porque andam, comem e funcionam, mas não vivem verdadeiramente. Daqui alguns anos se você os encontra eles estarão na mesma, com as mesmas ideias e pensamentos, sem nenhuma mudança. Sempre serão reconhecidas.
            Essas pessoas que não mudam desperdiçam a própria vida. Ficarão sempre presas a tudo aquilo que é conhecido. Suas dores serão sempre as mesmas. Seus sofrimentos se repetirão sem fim. Suas queixas e reclamações serão sempre os mesmos pontos. Triste, mas há muitas pessoas nessa posição. Carregando sempre os mesmos desejos, nunca crescem. Não são sujeitos da própria vida, mas ficam submetidos ao conhecido.
            Uma criança, quando tudo vai relativamente bem em seu desenvolvimento, vai se transformando a olhos vistos. Tudo nela muda. Fica diferente aos olhos dos demais, mas acima de tudo, o mundo fica totalmente diferente aos olhos dela. O bebê que vira a criança, que vira o adolescente, que vira o jovem, que se transforma no adulto, que chega a meia idade,  etc.  estarão tão mudados que em cada nova etapa de sua vida terão um mundo novo para conhecer. Cada novo olhar traz a semente de um mundo completamente novo e mudado.

sexta-feira, 12 de julho de 2019

Pergunta de Leitora - O que vai ser do meu filho?




Estou preocupada com meu filho de 5 anos. Ele adora  contos de fadas, brincadeiras de meninas, e o que se refere a princesas, adora as bonecas da irmã. Brinca com brinquedos de menino, mas prefere os de menina. Semana passada ele me falou que colocou o "pipiu" de um amiguinho na boca. Expliquei que não pode, porque ele é pequeno ainda, e só pode fazer essas coisas quando crescer, e que só menina pode fazer isso. E o fato se repetiu,  novamente falei com ele, sem brigar, sem gritar, sem deixar ele com vergonha.  Ele me disse que não vai fazer novamente. Fico com medo de que ele seja homossexual. Não por mim, mas pelo preconceito que ele vai sofrer. Lógico que eu quero que meu filho seja homem, mas se ele optar por outra coisa eu não vou deixar de amá-lo por isso, então o que fazer?  Como agir??  Isso é normal??

            Você quer que seu filho seja homem, mas se ele “optar por outra coisa” vai amá-lo, mas não acha que será homem. O homossexual, na sua ideia, vai certamente sofrer e com certeza só brinca com brinquedos que são relacionados às meninas. Há muita coisa nisso tudo que você está falando que mostra o quanto está equivocada em muitos pontos. Talvez seja bom esclarecer.
            Primeiro: um homem homossexual não é menos homem. Ser homem nada tem a ver com a heterossexualidade apesar de muita gente achar que sim. Hombridade está ligada ao caráter e valores e não com a orientação sexual. Um homem homossexual é um homem como qualquer outro, nem melhor nem pior. Segundo: um homossexual sofre, mas os heterossexuais também. Sim, é claro que há certos preconceitos para com os homossexuais que um heterossexual está livre, mas ser heterossexual não é garantia de uma vida melhor e mais tranquila. É um equívoco você já pré-determinar que ele vai sofrer caso seja homossexual.
            Terceiro: homossexualidade não se trata de opção. Ninguém opta a própria sexualidade, mas se trata de orientação, de como o individuo vai se constituindo e se estruturando. É algo muito complexo e que ultrapassa o mero ato de optar. Quarto ponto: só por que um menino se interessa pelos brinquedos de meninas e por atividades consideradas femininas é homossexual? Pode até ser que ele venha a ser, mas isso não é definido pelos brinquedos e brincadeiras. Há muitos meninos que apenas gostam daquilo que é considerado como sendo de menina e é só isso e nada mais. Há muito preconceito em acreditar que existe o jeito certo e errado de ser menino ou menina.
            Todos esses enganos impedem você de viver mais tranquilamente. Se ele colocou o pênis do colega na boca pode ser somente uma brincadeira infantil de descoberta do corpo. Não há necessidade de transformar algo que pode ser tão natural em uma grande tormenta. No final você pergunta se é normal, referindo-se às atitudes de seu filho. No fundo há, sem maldade e talvez sem você perceber, preconceito para com a homossexualidade, como se ela não fosse normal. Você está muito confusa com essa história toda, mas percebo um grande amor e preocupação com seu filho. Que tal procurar alguém quem você possa compartilhar as suas ansiedades para que elas sejam pensadas de uma maneira eficiente, sem precisar imaginar uma tragédia? Seu filho tem muito a viver e aprender ainda. Você não precisa decidir como a vida dele vai ser.

segunda-feira, 8 de julho de 2019

Estamos todos nós passando




            Um dia andando pelo calçadão no centro de Londrina havia um grupo de religiosos gritando a plenos pulmões “Arrependei-vos, pois o Reino de Deus está próximo e o dia do Juízo está chegando e Jesus virá para julgar todos os pecados”. Muitos dentre eles estavam fora de si e entregues a um frenesi que não era preciso ser profissional algum para entender que se tratava de loucura. A loucura pode se vestir de várias maneiras e uma delas é de religioso ortodoxo que não entende o que fala e interpreta tudo da maneira que lhe convém.
            A frase que repetiam de forma tresloucada, no entanto, até que é interessante, mas apenas se pudermos interpretar e não toma-la literalmente. Não sou teólogo, sou só um psicoterapeuta curioso que gosta de pensar sobre o que vê e experimenta. Penso que “O reino de deus está próximo” é algo verdadeiro, pois cada vez mais nos encaminhamos para a morte, essa desconhecida geradora de tantas angústias. Chamamos a morte, o que não conhecemos, de Reino de Deus, afinal ninguém voltou de lá para nos contar e ela está cada dia mais próximo em nossas vidas. Nesse sentido o reino de deus está realmente chegando.
            O arrependimento deve ser compreendido não como algo moral, para nos trazer peso e sentimento de culpa, mas como um lembrete de que estamos passando rápido por essa vida e que devemos vivê-la bem. Perdemos frequentemente muito tempo com coisas que não nos acrescentam nada e deixamos com isso de viver de maneira mais verdadeira. Devemos nos arrepender do quanto de vida que já desperdiçamos para tirar vantagem do tempo que ainda nos resta viver para fazer um bom proveito. Nesse caso a exortação para o arrependimento serve para nos alertar que não temos a vida inteira e que nosso tempo é contado.
            Sobre os pecados podemos pensar no termo original da palavra que em latim significa errar o alvo. Assim os pecados são todas as nossas ações e maneira de ser que na verdade não nos possibilitam acertar nosso alvo que é viver bem. Qual o melhor objetivo nessa vida que não viver bem? Quando nossas atitudes nos aprisionam erramos feio o alvo e não atingimos nossas potencialidades. Devemos sempre avaliar os nossos “pecados” para não desperdiçarmos energias valiosas com coisas que não nos ajuda a desenvolver. Nesse caso avaliar os pecados é apenas uma questão de ajuste de mira e correção de rota.    
            Vendo por essa perspectiva essa frase pode ser levada conosco para criar sabedoria e não perdermos tempo. Na verdade, estamos passando por esta vida e não somos donos dela. Nosso tempo é limitado e devemos começar, o quanto antes, a aprender como viver cada vez melhor e com mais dignidade. Quanto aos religiosos do calçadão fico com a impressão de que ao invés de seguirem o que pregam estão fazendo justamente o oposto: perdendo tempo e não aprendendo a viver a vida que têm.

sexta-feira, 5 de julho de 2019

Pergunta de Leitor - Morrendo aos poucos




Sou gay, mas não sou assumido. Sempre fui criado para pensar que gays são pessoas pervertidas e doentes. Algo quase como uma sem vergonhice. Pelo menos meus pais sempre pensaram assim. Meu pai sempre tirou sarro de gays e dizia que preferia um filho morto a um filho gay. Por fora concordava com ele, porque não sabia como argumentar com ele, mas por dentro eu morria. Minha mãe tirava sarro, veladamente, de quem era homossexual. Com toda essa criação sempre fiquei com medo de me assumir. Resultado: saio com homens às escondidas. Nunca assumi um relacionamento e perdi um cara que eu amava porque nunca me deixei me aproximar dele. Só vi que o amava quando o perdi. Eu fui cruel com ele. Eu desmerecia o carinho que ele tinha por mim, o cuidado dele e eu saía com outros. Quando ele me pôs na parede para saber o que eu queria eu desdenhei e disse que ele era gay e que eu não, que eu só estava me divertindo e que eu não queria ficar com ele porque eu não era boiola. Ele chorou e foi embora. Depois disso me senti mal, saí com dezenas de outros, mas ninguém como ele. Agora estou péssimo.


            Com certeza está péssimo, mas não apenas pelo fim do que vocês dois viviam, mas com o que você está fazendo consigo próprio. E isso já é uma história de anos. Você está vivendo pessimamente toda a sua vida sexual e afetiva. Arrisco até dizer que é como se você estivesse se “matando” e com isso obedecendo ao discurso dos seus pais. Afinal, segundo seu pai, é melhor filho morto do que filho homossexual, não é verdade?
            O que necessita é aprender a se separar dos seus pais. Quando digo se separar me refiro a se afastar da ignorância deles. A ignorância é sempre cruel e violenta e hoje você é cruel e violento consigo mesmo porque quer agradar os seus pais e não descobrir sobre quem você é. Obviamente você concordava com as palavras do seu pai, mas não era por falta de argumentos, mas por temer não ser amado por ele. Só que com isso você teve que se desmerecer.
            Quando digo se separar quero dizer então dessa ignorância. Não sei se isso levará a um distanciamento concreto com seus pais. Se eles forem capaz de amar, não. Quem ama consegue abrir mão de ideias ignorantes para priorizar o amor. Agora, se seus pais não conseguirem te aceitar é porque eles se colocam indisponíveis para o amor. Aí eles priorizam mais a imagem de um filho do que um filho real. É um risco que você corre de descobrir que seus pais podem estar mais ligados à imagem.
            Contudo, seus pais até podem não te aceitar, mas você não. Caso insista em ser ignorante consigo perderá muitas coisas boas e importantes na vida. Em outras palavras, perderá você mesmo. Quando você desmereceu o seu companheiro e o humilhou, na verdade fez isso com você também porque destruiu algo bom e que lhe era importante. Está assustado com seu poder de destruição sobre aquilo que lhe é caro e que se continuar assim vai estar mesmo “morrendo” apesar de estar vivo.

segunda-feira, 1 de julho de 2019

Quebrando o círculo




            Um diretor de empresa poderoso gritou com seu gerente, porque estava com muito ódio naquele momento. O gerente, chegando em casa, gritou com sua esposa, acusando-a de gastar demais, com o almoço. A esposa, nervosa, gritou com a empregada, que havia quebrado um prato. A empregada chutou o cachorro no qual tropeçara. O cachorro saiu correndo e mordeu uma senhora que trombou com ele. A senhora foi à farmácia fazer um curativo e gritou com o farmacêutico porque estava doendo. O farmacêutico foi a sua sessão de análise e gritou com o analista porque estava frustrado. E o analista disse: “Estou vendo o quanto você está frustrado, cansado, cheio de raiva. Dá para notar o quanto está intolerável o que está sentindo. É quase como se você quisesse derramar para fora o que sente.” Ao escutar isso o sujeito se sentiu compreendido e pôde se acalmar. Percebeu também que não estava bravo com o analista como havia pensado inicialmente.
            Neste instante, quando a sessão de análise aconteceu, o círculo de ódio foi quebrado. Vamos ao longo do dia, dos meses e dos anos acumulando raiva e ressentimentos que sem nos darmos conta acabamos pegando como nossos. Nos apropriamos daquilo que não nos pertence e vamos mantendo essa repetição de jogar a batata quente para quem estiver mais perto. Geralmente é assim que as pessoas vivem e agem.
            Obviamente, é uma maneira muito empobrecedora. Queremos nos livrar do que sentimos como se isso fosse possível. Não é. Já que não nos livramos daquilo que nos é despertado através das emoções, só podemos mesmo aprender a lidar com elas. Romper os círculos de ódio que existem por aí só se torna viável quando aprendemos a lidar com nossos sentimentos e não em querer jogá-los longe rapidamente.
            Numa análise somos convidados a conhecer o que sentimos. Quem se escuta pode decidir de maneira consciente qual medida tomar. Quem pode tolerar os próprios sentimentos cria a condição de escolher o que quer e o que é melhor fazer de fato. Numa análise círculos que há anos se faziam presentes na vida de muitos, podem ser reconhecidos e quebrados. E no lugar desse círculo repetitivo pode surgir uma nova maneira de se relacionar com os outros e com a própria vida.