segunda-feira, 27 de abril de 2020

Encontro marcado


     Uma antiga historieta medieval pode nos ajudar a compreender melhor nossa relação com nosso mundo interno, psíquico. “Um servo, que um dia estava na feira olhando vários produtos dispostos, se deparou com a morte, que olhou para ele de uma maneira estranha. O servo ficou com muito medo e saiu correndo até a casa de seu senhor. Lá ele suplicou que havia sido sempre um bom servo e pediu um cavalo para fugir para Salamanca, já que a morte o havia olhado. O senhor, que gostava muito do servo, concordou em dar o cavalo e o deixou fugir para a cidade de Salamanca, mas intrigado com a situação foi à feira e, ao ver a morte, a indagou porque ela tinha assustado seu servo tão querido. A morte então lhe respondeu que não o tinha assustado, mas que tinha ficado surpresa a encontra-lo ali quando nessa mesma tarde ela tinha um encontro marcado com ele na cidade de Salamanca”.
     Nunca conseguimos nos livrar dos nossos problemas psíquicos. Muita gente imagina que basta não pensar, tentar evitar ou postergar o mundo emocional que ele desaparecerá magicamente. Ledo engano! Isso nunca acontece e o que se passa é que quanto mais evitamos aquilo que é nosso, do nosso mundo interno, mental, mais vamos pagar caro para viver. Quando fingimos que não precisamos nos responsabilizar pelo nosso mundo interno mais esse mesmo mundo psíquico nos cobra demasiado.
     Há pessoas que tendem a encarar o mundo interno como se fosse algo secundário. Quando alguém sofre de alguma doença orgânica, por exemplo, busca tratamento, remédios e, dependendo do caso, até cirurgia. Porém, quando muitas pessoas padecem de depressão, angústia extrema, medos irracionais desproporcionais, repetições de situações que causam sofrimento, etc. muitos acham que não se trata de algo sério e, por isso mesmo, não buscam tratamento adequado.
     Aquilo que pertence ao nosso mundo interno não tem como ser evitado. Está ali e por mais que corramos de um lado para o outro sempre nos acompanhará, sempre nos encontrará. Já ouvi um sem número de pessoas que queriam resolver suas angústias apenas mudando de emprego, de cidade, de parceiro amoroso, de casa e por aí vai. Na grande maioria das vezes, queriam fugir do que sentiam como se isso fosse dar certo.       
     Queriam uma mudança externa e esperavam que esta levasse a uma mudança interna. Se não encaramos esse estranho mundo interno nosso não adianta, para onde quer que formos esse mundo interno, com todos os seus conteúdos, estará sempre nos encontrando. Tal como o servo da historieta medieval não temos como fugir de algo que já tem um encontro marcado. Nosso mundo interno sempre tem um encontro marcado com nossa vida e se pudermos nos deparar com ele poderemos viver com mais qualidade e não desperdiçar energia em fugas ineficazes.

sexta-feira, 24 de abril de 2020

Pergunta de leitora - Há vários encaixes


Sou muito tradicional. Não consigo aceitar algumas “modernidades” muito bem. Vejo que hoje em dia muito se tem discutido sobre os homossexuais. Eu acredito que eles sejam doentes e que necessitam de tratamento, pois não é natural alguém ficar com outro do mesmo sexo. Se analisarmos bem, homem e mulher se encaixam perfeitamente biologicamente. Seja Deus ou a natureza que assim quis não importa mas o que importa é que isso é inegável. Quando dois homens ou duas mulheres ficam juntos não há encaixe. É um tipo de “gambiarra”, ou seja, um arranjo mal feito. Sinto muito dizer assim mas é como vejo as coisas e isso é a biologia quem diz. Como pode os psicólogos não verem isso?

            O sexo é tão complexo que relacioná-lo apenas à biologia é tal qual tapar o sol com a peneira. Não vai funcionar. Claro que o sexo tem a ver com a biologia também, mas a ultrapassa e depende de tantas variáveis que fica ingênuo até falar em sexo, já que este se tornou sexualidade. Se funcionássemos tão somente através da biologia, assim mesmo a sexualidade seria algo complexo e múltiplo, porém contamos também com a mente e esta cria e alimenta fantasias e desejos sem os quais a sexualidade humana não existiria ou seria bem mais empobrecida. 
          A sexualidade, aliás, tem a ver com a cultura de cada povo e com a forma com que a sociedade, em dado momento, se organiza, bem como com as características individuais de cada sujeito. Enfim, a sexualidade é um fenômeno biopsicossocial. Bom, já deu para ter um ideia que falar sobre sexualidade de forma simplista não dá.
            Homossexualidade é mais uma forma, entre inúmeras outras, de se relacionar, de viver e de amar. Você pode até não gostar e achar que se trata de algo “ilegal”, como uma “gambiarra”, mas a maneira como cada um pode viver a sua vida e se realizar independe de você. E ao contrário do que você imagina você não pensa que a homossexualidade seja uma doença, você simplesmente a condena como tal. Provavelmente condena porque teme a complexidade e variedade do psiquismo, especialmente o seu próprio.
            Para sermos de fato humanos necessitamos aceitar o psiquismo e sua influência em nossas vidas. Do contrário corre-se o risco de se cair na onipotência e condenar ao invés de pensar. A força da nossa capacidade de criar é tão imensa que é capaz de inventar encaixes onde parecia não haver encaixe algum. A riqueza e força do humano está justamente na sua possibilidade de se reinventar e escrever a própria história. Em outras palavras, o humano só pode existir enquanto se realiza como ser biopsicossocial. 

segunda-feira, 20 de abril de 2020

O desespero e a busca pelo prazer


          Nesses tempos onde devemos praticar o isolamento como forma de nos proteger e proteger os outros do contágio da Covid-19, muitas pessoas acabam por usar os aplicativos de encontros amorosos com mais intensidade. Tanto para o público heterossexual quanto para o público homossexual esses aplicativos sempre foram usados largamente e mais do que para viabilizar um encontro “amoroso”, serviam como um facilitador de encontros sexuais. As pessoas entravam neles para procurar possíveis parceiros para aventuras sexuais. Geralmente, para uma única aventura, sem maiores compromissos.
          Numa matéria do site UOL foi noticiado que esses aplicativos estão sendo usados mais do que nunca. Segundo o artigo há pessoas apenas “conversando”, se conhecendo e trocando fotos provocativas, mas que há inúmeras pessoas que estão marcando encontros, colocando os outros e a si próprias em risco. Isto é preocupante. Fiquei pensando nesse artigo e refletindo sobre como as pessoas vivem a dimensão sexual.
          Parece que o sexo é vivido por essas pessoas não como algo saudável, mas como algo um tanto quanto desesperador, quase como uma válvula de escape, como uma maneira de se lidar com a ansiedade e o medo. Usam de um mecanismo de defesa chamado negação e atuam como se nada houvesse de perigoso. Geralmente, quem usa da negação está com tanto medo que não consegue processá-lo e aí negam o que sentem como uma forma de se proteger. Só que o tiro, como já diz o ditado, pode sair pela culatra e acarretar sérias consequências.
          Que o sexo traz prazer todo mundo o sabe, mas na vida há prazeres e prazeres. Há prazeres que nos causam muito mal, que nos trazem imensos prejuízos. A droga, por exemplo, é um desses prazeres. É autodestrutivo. As drogas ilícitas, cigarro, bebidas, comidas e até o sexo podem ser vivenciados de forma destrutiva. É o desespero que leva à compulsão, é o não conseguir tolerar dentro de si emoções difíceis, pensar sobre elas e as transformar.
          Muita gente está se dando conta de seus conteúdos internos nesse período de isolamento. No dia a dia esses conteúdos passavam despercebidos devido a tantas obrigações e distrações. Ficavam “abafados”. Agora, com mais tempo consigo próprios, as pessoas estão notando que carregavam emoções e sentimentos que nunca foram devidamente elaborados e que as faziam se arriscar na vida de maneira temerária. Quando vemos que nessa época perigosa pessoas estão saindo para transar com desconhecidos ou para comprar drogas, se colocando em contato com vários outros sujeitos que podem oferecer riscos, é possível dimensionar o quanto as pessoas não sabem lidar com o que sentem e agem com inconsequência.
          O prazer é necessário na vida. É impossível uma vida sem prazer. Mas qual prazer? O sexo pode ser algo muito bom, mas tudo depende de como está sendo vivenciado. Pode ser algo que nos enriquece ou algo que nos empobrece. Um prazer está a serviço da vida, o outro prazer a serviço da destruição. Até mesmo para viver o prazer a gente precisa da mente para elaborar as coisas de forma que sejamos capazes de viver com dignidade.

sexta-feira, 17 de abril de 2020

Pergunta de leitor - Sem bola de cristal


Desde que começou essa loucura do Coronavírus estou com a sensação de que iremos todos morrer. Sou jovem, tenho bronquite e estou afastado do trabalho. Tenho uma filha, pais idosos, e medo de perder as pessoas que amo. O que faço com essa sensação?

            Você diz que tem a sensação de que todos iremos morrer. Bom, a sua sensação está certa. Todos iremos morrer, mas calma, porque não sabemos quando isso se dará e nem sabemos se será por causa do Coronavírus. Você não tem bola de cristal, por isso mesmo não sabe o que o futuro aguarda. Imaginar o pior é o mesmo que alucinar, já que até agora você está bem, seus pais devem estar bem assim como está bem a sua filha.
            Obviamente estamos todos vulneráveis frente a esse vírus que pouco sabemos e que vem causando tanto tumulto. Estar afastado do seu trabalho, da sua rotina, faz com que fique se sentindo desamparado. Afinal, uma quebra ocorreu e quando algo se rompe, quando algo conhecido se quebra o sentimento é mesmo de desamparo porque implica em aprender com o novo e desconhecido. Estamos todos, você, eu e todos nós nesse planeta inteiro, frente a essa situação onde não há referências. Temos que aprender a lidar com o novo, quer gostemos ou não.
            Agora, essa angústia que você sente não é só devido a situação presente que vivenciamos, ela já é coisa antiga. Apenas que por agora essa angústia está mais intensificada. Porém, provavelmente você sente essa angústia já há muito tempo. Ouso levantar a hipótese de que o que te angustia é lidar com as coisas que você não tem controle. Acredito que antes mesmo de existir essa ameaça atual do vírus você já ficava preocupado consigo, com sua filha e seus pais. Será que não era assim? Essa ansiedade está apenas mais nítida agora.
            O que está acontecendo é que devido a todo esse rebuliço causado pela Covid-19 angústias que já carregávamos ao longo da vida ficaram mais ressaltadas. Você irá precisar não só tomar os cuidados necessários para se proteger do vírus, mas também para se proteger de suas ansiedades. Aceitar que na vida pouco ou quase nada controlamos de fato. E de que a morte é nosso destino final. No entanto, não é a morte que importa, mas como você vai viver até lá. Que qualidade de vida alguém se dará para enfrentar tudo o que a vida traz é a coisa mais vital para se pensar.

segunda-feira, 13 de abril de 2020

Estímulos e tortura

   


            Praticamente todos os pais de crianças e adolescentes vão confirmar que seus filhos estão dormindo pouco, muito pouco. Os próprios pais também estão tendo menos horas de sono, principalmente nas grandes cidades. Parece que antes dormia-se mais e, segundo muitas pesquisas recentes, realizadas em várias partes do Planeta, essa redução na quantidade de horas dormidas está realmente acontecendo. Dormir menos é algo sério que pode resultar em vários efeitos nocivos tanto à saúde física quanto mental.
          Sabe-se que a falta de sono de qualidade traz prejuízos para o sistema endócrino, prejudicando a correta formação de hormônios importantes, afeta o sistema cardiovascular e até o sistema neurológico. Fora os prejuízos orgânicos, dormir pouco faz com que nosso psiquismo também seja afetado. Formação de novas memórias, bem estar para se enfrentar a vida e calma são elementos que ficam prejudicados. E é no sono que também elaboramos muito do que nos acontece na vida. Não é à toa que, antigamente, dizia-se que “o sono é um bom conselheiro”. Infelizmente esse ditado hoje não é mais lembrado como deveria. Sem sono comprometemos nossa mente e como vamos lidar com a vida.
         Mas por que será que estamos dormindo menos? Uma das possíveis respostas a essa indagação vem do fato de que é muito difícil se desapegar dos estímulos com que somos bombardeados a toda hora. Quanto mais nos estimulamos, quanto mais nossos sentidos são exigidos, menos conseguimos cuidar de nós mesmos. Os smartphones que carregamos conosco a todo instante nos chamam para dar conta de várias redes sociais. É muita foto para curtir, para postar, há muitos comentários a fazer e responder. É o grupo da família, dos amigos da faculdade, do trabalho, da escola, da academia. É muita série para por em dia, muito filme para assistir. Muita reportagem e notícias para ver ou ler. Enfim, há estímulos de todos os lados e isso pode nos fazer mal.
          Não quero pregar, contudo, a bobagem de dizer que a tecnologia nos está fazendo mal. Ela é extremamente útil e divertida e veio para ficar, não tem volta. A questão não é maldizer a tecnologia e exaltar um passado onde, na verdade, tinha muitos outros problemas. O que se faz pertinente é saber lidar com a vida, saber se desapegar dos estímulos. Isso está na dimensão de se poder dizer não. Os estímulos nos chamam, mas há horas que se faz vital dizer não, trazer limites. Quem não diz “não” fica apegado a tudo o que surge na frente e não se permite viver outras coisas.
         Os estímulos podem ser torturantes apesar de extremamente sedutores. Muitas vezes não conseguimos dizer não aos filhos, mas isso ocorre porque também não estamos conseguindo dizer não a nós mesmos. Estamos hipnotizados pelos estímulos e virando zumbis. Pessoas constantemente estimuladas não têm tempo para sentir e se sentir e por isso mesmo não comem adequadamente, não vivem bem nem dormem bem. Deixam de ser pessoas e passam a ser ávidos consumidores de um estímulo atrás do outro.

sexta-feira, 10 de abril de 2020

Pergunta de leitora - A morte de todos nós


Minha mãe está para morrer. Ela já está bem idosa e doente e segundo as previsões médicas ela não dura muito. Ela sempre me pediu para morrer em casa. Agora ela está no hospital e tenho medo de trazê-la por dois motivos. O primeiro é que acho que no hospital ela recebe cuidados profissionais e que se ela tiver um mal estar, vão saber lidar com ela. O segundo motivo é que tenho medo de que ela morra em casa. Tenho medo de minha casa ficar com esse estigma de que alguém morreu aqui. Ao mesmo tempo eu queria estar mais próxima dela, mas também não consigo deixar ela morrer aqui, já que tenho medo da morte. Tenho medo de quem está para morrer. O que fazer nessas horas?

            O assunto da morte geralmente é tratado como tabu e nunca como algo natural. Estamos todos sujeitos à morte e não há como evitá-la. A morte nada mais é do que um fato natural da vida e brigar contra isso é querer brigar com a natureza. Muitas vezes os humanos se apegam a um sentimento de onipotência e creem que podem controlar tudo, inclusive a morte.
            Como a morte representa o desconhecido, ela é encarada com muito temor. Tendemos a negar aquilo que não entendemos e perdemos a chance de aprender algo novo. Não é fácil ter alguém conhecido e querido para morrer, mas fugir desse evento normal da vida é descartar um momento importante.
            O ato de morrer é solitário e causa ansiedade. Sua mãe deve querer morrer em casa porque isso deve ter um significado importante para diminuir sua ansiedade. Ficar em um ambiente conhecido sempre nos dá mais coragem e paz, tanto que quando ficamos ansiosos e incomodados queremos sempre voltar para nossa casa. Apesar de um hospital contar com recursos e pessoal especializado, ele carece de fornecer o aconchego que também é importante na vida. Principalmente para quem se encontra fragilizado.
            O seu receio de recebê-la em casa para morrer pode ser uma tentativa de querer controlar as emoções que isso te desperta. Talvez você tenha receio de encarar a perda e elaborar o luto, bem como de pensar na sua própria mortalidade, pois é um fato que quando alguém que nos é conhecido morre, nós pensamos na nossa própria morte. Nessas horas de perda somos obrigados a ver a realidade da vida, de que não podemos tudo e de que há coisas que não estão em nosso controle. É se deparar com o fim das coisas e aprender a usar melhor o tempo que dispomos. 
           Apesar de tudo isso ser trabalhoso e custoso de se elaborar, é importante que isso aconteça, para que aceitemos a humanidade e a natureza como realmente é. Se você se permitir aprender a olhar a vida e seus fatos com mais naturalidade, você poderá aceitar a morte da sua mãe com mais tranqüilidade e menos medo.

segunda-feira, 6 de abril de 2020

As cores de cada um

     

      
     Em situações de crise, como a atual, a gente pode ver como muitas pessoas são na verdade. Em inglês existe uma expressão “to show your true colors”, que significa mostrar suas verdadeiras cores. Frequentemente, na vida diária, quando não há nada pressionando mais intensamente, o mau-caratismo de algumas pessoas passa despercebido, mas quando situações limite ocorrem não dá mais para esconder o lado farsante.
     Em Londrina, cidade onde vivo, ouvi a notícia de que um grupo de pessoas estava vendendo álcool gel falsificado. Não é só aqui que essas coisas tristes acontecem, é claro, mas por meio desta notícia vamos quanto há perversidade e pessoas que se aproveitam de quem está desesperado. Quem falsificava álcool em gel vendia gato por lebre, ou seja, tirava proveito e vantagem de uma situação para obter lucros desleais. Isso é perversão. 
     O perverso só quer saber do próprio prazer e não se importa com nada ou com mais ninguém. Por isso, para o perverso é fácil enganar, mentir, corromper e passar por cima dos outros. Fazendo isso, muitas vezes ganha fama e dinheiro e é visto como alguém de sucesso. Contudo, quando as coisas ao redor mudam, quando ficam urgentes algumas necessidades básicas entre a população, caem as máscaras destas pessoas e aí podemos ver que não são pessoas de sucesso, mas apenas aproveitadores que tentam sempre ganhar de forma pérfida.
     Há um ditado bastante conhecido que diz “No escuro todos os gatos são pardos”. Esse ditado fala que quando está escuro não conseguimos ver (discriminar) nitidamente, então, acreditamos que tudo tem, mais ou menos, a mesma cor, como se não houvesse diferenciação. Agora, quando a luz se faz presente podemos diferenciar as cores (particularidades) de cada gato ou gatuno. No dia a dia ficamos meio que adormecidos e não enxergamos bem. Confundimos ações perversas de muitas pessoas, que até acabamos admirando, com inteligência e genialidade. Só que quando acendemos a luz vemos que não era bem assim.
     Nessas situações críticas, como o momento que vivemos, uma luz se acende e, de repente, vemos que algumas pessoas e atitudes nada mais eram do que ações egoístas. Por outro lado, porém, a gente se depara com grandes atitudes de grandes pessoas. Também nesses momentos de calamidade vemos o quão grandiosos e generosos muito seres humanos conseguem ser. São verdadeiros heróis, com uma grande capacidade de empatia. São verdadeiro humanos. Sim, ser herói é ser humano. Coisa tão rara.
     Ao mesmo tempo que ouço sobre pessoas desonestas, o que entristece e pesa o coração, ouço também notícias e relatos de pessoas maravilhosas, o que eleva a alma e traz esperança. Gente trabalhando sério, cada um em sua área, se colocando até em risco, mas com o objetivo de ajudar o próximo, de deixar a vida menos difícil. 
     A alguns médicos, enfermeiros, jornalistas, cozinheiros, entregadores, funcionários de mercado, de postos de combustível, de farmácias e muitos outros que não consigo nem citar aqui, expresso minha gratidão e meu aplauso pela força com que nos ajudam. Essas são as verdadeiras cores que devemos ver e admirar. 
     Muito obrigado.

sexta-feira, 3 de abril de 2020

Pergunta de leitora - Ninguém tapa o Sol


Sou tão ansiosa que quando não consigo resolver algo tenho palpitações cardíacas e passo a noite sem dormir. Devo tomar medicação para isso? Sempre fui ansiosa. Enquanto criança só roía as unhas e comia doces quando me sentia assustada ou insegura, mas passei a sentir palpitações há pouco tempo. Ou se eu sentia eu não percebia, porque tinha uma vida muito corrida. Hoje moro em outro país e sem trabalhar fora, sinto o tempo mais lento e quando fico ansiosa ouço os pulos do meu coração. Isto me causa mais aflição. Às vezes acho que, por estar longe dos meus filhos, mesmo eles sendo adultos, os meus medos tenham aumentado.

         Você sente ansiedade e reconhece as consequências dela no seu corpo. Palpitações, roer unhas, comer doces são sintomas que você percebe e dos quais quer se livrar. Obviamente que os resíduos da ansiedade são desconfortáveis e nada mais natural, então, querer que eles desapareçam deixando um sentimento de paz no lugar. Contudo, nunca nos livramos da ansiedade. Isso é impossível. O que podemos fazer, todavia, é aprender a lidar com ela para que não nos custe tanto.
         A ansiedade não vem do nada. Ela não cai do céu em nosso colo. Entender o que está criando a sua ansiedade é o melhor e o único caminho para você desenvolver recursos que te ajudem a não sofrer com ela. Ao invés de escorraçar seu sentimento de ansiedade, o que não vai funcionar mesmo, o melhor é aprender o que essa ansiedade significa. Você citou que seus medos aumentaram, mas que medos são esses?
         Você também fez uma associação com o fato de ter uma vida corrida antigamente e que isso preenchia sua cabeça, não abrindo espaço para a ansiedade se instalar. Hoje você mora num pais estrangeiro e não trabalha fora, bem como está longe dos filhos. Será que é isso que te deixa mal? Será que você sente que sua vida aí é de fato a sua vida? Talvez valesse a pena considerar cuidadosamente essas questões e compreender se sua mudança de país e vida tenha te afetado mais do que pensava ou acreditava. O que precisa é investigar.
         Tomar medicação é relativamente mais fácil. As medicações são muito úteis quando realmente necessárias, senão são apenas uma forma de tentar tapar o problema. Como já diz o antigo ditado "Ninguém tapa o sol com a peneira". Ninguém faz um sentimento desaparecer só porque toma alguma medicação. Não queira jogar fora o seu sentimento por mais difícil e desagradável que ele seja. Ele é o melhor guia para te ajudar a enxergar o que está se passando com sua mente. E enxergar o que se passa no seu interior é o que você mais necessita. Boa sorte.