Recebi de uma
leitora as seguintes perguntas sobre psicanálise que tentei responder o melhor
e mais simples possível. Há muitas questões técnicas que demandaria uma aula
sobre fundamentos da psicanálise, mas isso não seria interessante e levaria
muito tempo. Essas questões, contudo, são as de muitas pessoas.
1- Existe um valor médio para a sessão?
Sei que muitos psicanalistas acordam com o paciente o valor das sessões, mas
existe um mínimo e máximo? Por exemplo, um valor aproximado... Pra ter uma
noção antes de começar.
Não existe
valor fixo. Cada um pratica o que quer ou o que pode. Só mesmo conversando com
o profissional para saber ou chegar a um acordo. Varia também o local. Cidades
como São Paulo acabam tendo um valor maior, afinal o custo de vida lá é mais
alto. Portanto os honorários de cada psicanalista são matéria de cada um. Para
saber vai ser necessário entrar em contato com o profissional.
2- Uma vez li um texto que dizia que
para a análise iniciar de fato, é necessária a transferência e o analista
precisa ter aceito aquele paciente em análise. O que seria aceitar o paciente
em análise?
Significa o
analista sentir que o analisando pode se beneficiar do processo da análise.
Que, em algum grau, o analisando entende que há uma responsabilidade sua pela
vida que leva, que seja um indivíduo que sofra e que tenha curiosidade sobre si
mesmo, sobre seu mundo interno. Há muitas questões envolvidas para se tomar
alguém em análise, mas esses três fatores são muito levados em consideração.
Sem estas condições fica difícil um analisando levar em frente um processo que
demanda entrar em contato com dores antigas e poderosas. Sem consciência do
sofrimento, sem presença da curiosidade sobre si e sem responsabilidade por si
mesmo não há como uma análise acontecer e aí desistir do tratamento no meio do
caminho é muito frequente. O analista para aceitar alguém deve olhar para essas
questões.
3- As primeiras entrevistas são feitas
numa poltrona geralmente, analisando e analistas ficam de frente um para o
outro. Em que momento o analista leva o paciente ao divã? O que demarca,
exatamente, esse momento? Existe um tempo médio pra que isso aconteça?
Ah, o divã!
Como isso gera dúvidas. Essa peça do mobiliário de um consultório analítico é
algo que deixa muita gente curiosa. A análise, que fique entendido, não depende
do divã. Ela pode acontecer frente a frente, com o paciente sentado na
poltrona. Portanto, é um erro, que até muitos psicanalistas cometem, crer que a
análise necessita do divã invariavelmente. Frente a frente a análise pode
acontecer, porém quando um analisando passa ao divã pode ter um contato maior
com seu mundo interno. Nesse momento o analista e analisando ficam “livres” dos
olhares um do outro para “sonhar” a sessão. Cada um fica entregue às suas
associações livres para cada vez mais dar um sentido ao que se fala e se
escuta. O analista pode convidar o analisando a ir para o divã quando acredita
que podem sonhar mais nesse encontro que vivenciam juntos, mas ir para o divã
jamais deve ser uma imposição. É um convite que pode ser aceito ou não. Ao
estar deitado faz com que o analisando também saia de uma formalidade e possa
ser ele mesmo, mais informal e espontâneo. A análise não se trata de um
encontro formal ou social, mas um encontro de descoberta onde possamos nos
colocar em novas posições em nossas vidas.
4- O que você acha do contato físico
entre paciente e analista? Dois beijos ao cumprimentar, aperto de mão e até
mesmo um abraço? Partindo do paciente esse ato, o que o analista pode fazer
diante disso?
Não há
problema algum, em princípio. A questão não é o beijo, o aperto de mão ou o
abraço, mas qual o sentido deles. Há beijos que não são beijos, mas mordidas
disfarçadas de beijos. Há abraços que são prisão e apertos de mãos que são
apenas hábitos corriqueiros formais. E também há beijos que são beijos e nada
mais. O que importa é qual o clima desse contato físico, qual o sentido que
pode ser apreendido deles. Algo que tem que ser trabalhado, conversado? Algo
que o próprio analisando não percebeu? Depende muito. Psicanálise não é ciência
exata que se enfia o que acontece numa equação. O que se precisa numa sessão é
haver disponibilidade para olhar as coisas com novos olhos. E também muito
respeito entre os envolvidos. Nenhum paciente precisa se sentir mal porque
cumprimentou o analista.
5- E sobre possíveis encontros na rua?
Por exemplo, encontrar com o analista num restaurante ou shopping. Como agir?
Cumprimentar ou não? E por que muitos analistas consideram que o
"simples" fato de encontrar um paciente fora do consultório pode ser
devastador para a análise chegando a ponto de interromper o tratamento?
Ora essa! A
gente encontra pacientes na rua, no supermercado, em restaurantes, em todos os
lugares. Qual é o problema? Se o paciente quiser cumprimentar, cumprimente. O
que tem demais? Se um analisando sente alguma coisa ao encontrar o analista em
algum lugar publico, pode levar isso para a análise. Isso pode ser matéria
importante e interessante para se entender o que se passa. Se alguém interrompe
a análise por causa disso está vivendo sob a ditadura de uma fantasia muito
forte e isso vale tanto para o analisando quanto para o analista. O analista
não deixa de ser uma pessoa comum que come, anda, passeia e por aí vai.
Encontrar-se e cumprimentar-se não significa que tenham que sair juntos,
trocarem figurinhas e terem uma vida social conjunta. Ninguém vai derreter se
analista e analisando se esbarrarem por aí. A análise acontece no consultório e
não fora dele e fantasias que venham a surgir devem ser analisadas.
Apesar de ter
respondido às essas questões quero dar ênfase que a análise é acima de tudo uma
experiência emocional única e intransferível. Ela não pode ser colocada de
maneira intelectual, pois isso mata o sentido. Quando tentamos explicar
demasiadamente algo, morre-se o sentido. Um poema, por exemplo, não foi feito
para ser explicado ou racionalizado, mas sentido. É impossível explicar aquilo
que não foi feito para ser justificado. A análise é uma experiência emocional
entre duas pessoas que provoca e gera transformações. É uma experiência
transformadora onde passamos a nos relacionar conosco e com a vida de uma nova
maneira. Ao viver um processo analítico temos a chance de descobrir quem somos
e como podemos viver cada vez melhor. Melhor do que perguntar sobre psicanálise
é se colocar disponível para a análise e viver uma experiência que pode ser
impactante na vida. Nada substitui a experiência pessoal.