segunda-feira, 8 de agosto de 2016

A Função Paterna e a Delinquência




            Em várias pesquisas feitas no Brasil e em outros países foi visto que, mais ou menos, dois terços de todos os jovens infratores e delinquentes não tinham a figura paterna presente. Dois terço é um número expressivo e que mostra que sem a função paterna muitas coisas podem desandar no decorrer do desenvolvimento das pessoas. Mas o que significa essa função paterna?
            Em primeiro lugar o que importa não é o pai em si apenas, mas a função paterna. Esta pode ser exercida por outros homens ou até por mulheres. A mesma coisa é válida para a função materna. Não é a mãe, pessoa concreta tão somente que tem valor, mas a função materna. Pai e mãe, pessoas, são extremamente importantes, apenas enquanto exercem a função parental. Não ter pai ou mãe presentes implica, então, não ter a função presente.
            Para a psicanálise a função paterna é aquela que quebra alguns enganos que vão se criando e tido como verdades ao longo do crescimento, bem como ajuda a estabelecer a internalização da lei. Sem a função paterna uma pessoa fica sem lei dentro de si e possuidor de uma ideia equivocada de si mesmo e de como o mundo funciona.
            Bem no início da vida o bebê é o centro de todas as atenções. Todos os olhares convergem para ele, para as suas gracinhas, para suas manhas e movimentos. Nem poderia ser diferente. Sem toda essa atenção o bebê teria seu desenvolvimento comprometido porque não receberia investimentos afetivos e nem seria estimulado apropriadamente. Nos primeiros anos de vida a criança pequena é tida como um pequeno rei, cujas vontades e necessidades são prontamente atendidas. Não é surpreendente que o pequeno adora essa posição e não quererá perde-la jamais. Contudo, a criança vai crescendo e ficar nessa posição de imperador não dá. Afinal a vida também apresenta, e muitas, frustrações e limitações aos nossos desejos. Entretanto, a criança só vai aprender a aceitar isso se houver contato com a função paterna.
            Neste momento o pai, ou alguém que exerça essa função introduzirá um corte nas ilusões da criança de que é um pequeno rei. A função paterna mostra que o mundo é vasto e tem outras pessoas que também têm direitos e que vão muito além da criança. Mostra também que nem todos os desejos podem ou devem ser atendidos e que alguns deles é melhor, para si mesmo e para o mundo, refrear. É nestes instantes que se forma a noção de lei e lei aqui não é no sentido jurídico, mas no sentido de que nem tudo nessa vida se pode só porque assim queremos e que na vida sempre há um preço a se pagar.
            Essa função quando bem internalizada e vivida, com firmeza, amor e delicadeza, ajuda a criança a ser um ser humano. Ela entenderá que há limites os quais não há como ultrapassar sob o risco de colocar muitas coisas em perigo e desenvolverá um sentido de respeito aos outros e a si mesmo. A lei se tornará interna e promotora de vida. O oposto, quando não há uma experiência de função paterna satisfatória deixará o sujeito entregue aos próprios impulsos e estes são primitivos e de natureza tirânica, que exigem ser atendidos prontamente, qualquer que seja o custo. Daí que se começa a delinquência. Todo delinquente não tem dentro de si a função paterna, não tem lei e apesar de não ser mais um bebê vive como se fosse um, cheio de vontades. Para eles todo ato e desejo é sentido como lícito. Sem a função paterna a civilização corre risco.

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