segunda-feira, 14 de setembro de 2015

Antes da Primavera Chegar


Parker Palmer disse: “Há uma verdade difícil de ser dita: antes da primavera tornar-se bonita, é uma coisa feia, nada além de lama e sujeira. Eu andei no início da primavera através de campos que vão sugar suas botas, um mundo tão molhado e lamentável que faz você ansiar pelo retorno do gelo. Mas, nesta bagunça enlameada, está sendo criada as condições para o renascimento.” 
Alguém que está em análise, por exemplo, entende bem o significado dessa ideia acima. Quando um indivíduo passa por um processo de análise muito do gelo do seu “inverno interno” vai se derretendo. Porém, mudanças não são, em princípio, sentidas como coisas boas, mas despertam muitas e variadas angústias que fazem com que o indivíduo em análise fique temeroso e se perguntando o que está acontecendo consigo. 
Antes da análise o funcionamento deste suposto indivíduo estava cristalizado em diversas defesas, que podemos comparar aqui a cristais de gelo. Essas defesas serviam-lhe para não entrar em contato com suas dores e lembranças que causam sofrimento. Alguém cristalizar e fazer uso intenso de suas defesas é uma maneira de “congelar” tudo aquilo que lhe traga medo e dor. No entanto, essas mesmas defesas que em algum momento foram úteis e protegeram o indivíduo têm também outro lado e um preço alto. Assim como camadas de gelo impedem a vida de nascer em todo o seu esplendor, defesas psíquicas não permitem viver a vida com prazer e qualidade, pois deixa a mente paralisada (congelada).
Quando mexe-se nessas defesas o que o sujeito em análise sente é um medo terrível. Afinal, as defesas eram seus pontos de referência e a sua única segurança e de repente estas são descongeladas e reviradas. O sentimento que desperta não poderia mesmo ser diferente do puro terror. Muito daquilo que se evitava sentir e tomar conhecimento começa surgir à tona. O indivíduo sente uma verdadeira confusão e há momentos que deseja fortemente que não houvesse havido nenhum degelo de suas defesas. É o que, no pensamento acima, o autor chamou de lama e sujeira e a vontade de que o gelo volte a cobrir os campos novamente.
Só que sem tolerar essa lama e sujeira não há possibilidade de uma vida nova nascer. Esse período feio e desolador mostra que o gelo ficou para trás. Nesse momento de uma análise é necessário muita tolerância. O medo de que fique para sempre uma paisagem sem vida tem que ser tolerado para que algo novo tenha tempo de aparecer. Assim como a grama e outras plantas brotam no seu devido tempo, os recursos mentais para se lidar com aquilo que se sente também começam a ser construídos. A vida torna-se possível e de uma maneira bem mais bonita e prazerosa.
A primavera abre um novo estágio. O gelo ficou no passado e a vida que se estende à frente é muito mais atrativa. Numa análise, esse é o momento em que o indivíduo pode superar seu passado e encontrar soluções bem mais eficazes para as suas dores. A vida mental torna-se rica para o crescimento. Não mais se precisa daquelas antigas defesas, pois novas maneiras de se lidar com os problemas são criadas fazendo com que as dores e angústias encontrem outro desfecho. A pessoa pode renascer e se recriar de uma forma mais proveitosa. A primavera interna é possível para aqueles que suportarem a lama e confusão. 

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