segunda-feira, 17 de março de 2014

Venda de Ilusões


            Há um psicoterapeuta americano que anda propagando que consegue curar qualquer distúrbio psicológico em 28 dias. Lançou um livro que vem fazendo estrondoso sucesso e com isso consegue prestar um imenso desfavor às pessoas, pois o que ele faz é vender ilusões e isso é sempre prejudicial.
            Quem se coloca numa psicoterapia e seja ela de qual base for: comportamental, psicanálise, existencial, etc. entra num processo de autoconhecimento que vai trazendo à tona importante revelações que por sua vez vão pedindo por novas elaborações. Não há como fixar o tempo de uma psicoterapia já que a mente não funciona como algo que podemos estabelecer metas fixas. E mais, um distúrbio é indicativo de algo interno, um funcionamento que não anda bem e que exige uma reflexão.
            O que esse psicoterapeuta americano propõe é apenas um apagar incêndios, ou seja, focar no sintoma que tanto assusta um determinado indivíduo sem nem mais ligar para a causa que provocou aquele mesmo sintoma. Talvez uma analogia com a medicina possa ser esclarecedor. Se uma pessoa padece de terríveis dores de cabeça a solução não é ela viver tomando analgésico para o resto da vida. Isso é tapar o sol com a peneira e fingir que o problema está solucionado. O sintoma, nesse caso a dor de cabeça, possui uma causa e esta precisa ser investigada. Pode ser um problema dentário, em algum órgão ou indicativo de uma alergia entre muitas outras possibilidades. Enfim, o problema só pode ser solucionado quando a causa pode ser identificada e tratada. Com a psicoterapia é assim também.
            Quando trabalhamos com algo tão complexo quanto a mente é impossível saber de antemão tudo o que vai surgir e o que teremos, psicoterapeutas e pacientes, de lidar. Portanto é impossível estabelecer metas fixas. Esse terapeuta americano tem um problema que é terrível para alguém que se propõe a exercer a psicoterapia. Ele não suporta estar com seus pacientes. Num processo psicoterápico o sofrimento mental se faz presente e o terapeuta suportar estar com alguém que sofre é vital. A tendência é a gente sempre fugir daquilo que nos causa dor e espanto. Como os terapeutas também são gente eles também tentam evitar sentir qualquer desprazer e querer se livrar de seus pacientes é um meio de fazer isso. Um terapeuta que estabelece metas rígidas para seu trabalho impede que seu paciente se revele e tenha a possibilidade de descobrir quem realmente é. Com essas metas ilusórias o psicoterapeuta não dá espaço para que seu paciente saiba mais acerca de si.
           Não é fácil trabalhar com psicoterapia. Significa desenvolver uma capacidade eficiente para lidar com a frustração e nesse trabalho são muitas. Os próprios limites do psicoterapeuta que descobre que nem tudo pode e nem tudo resolve, estar com alguém que sofre e pede por ajuda muitas vezes de forma desesperada, nunca saber se o desejo do paciente por se cuidar vai ser forte o suficiente para mantê-lo no trabalho psicoterápico e ajuda-lo a progredir, etc. Não é a toa que muitos profissionais começam a trabalhar na clínica e depois de um tempo a abandonam por não suportarem tudo o que são obrigados a sentir e a lidar de uma maneira madura e eficaz. O psicoterapeuta americano sente medo de atender seus pacientes e resolveu isso estabelecendo o tempo que tem com eles. Assim se protege, falsamente, de lidar com coisas mais profundas e verdadeiras e que venham realmente a mexer tanto consigo quanto com quem atende. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário