segunda-feira, 12 de setembro de 2022

Setembro Amarelo: saúde mental e o suicídio de diversas formas

 


Segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), em 2019 de cada 100 mortes no mundo uma foi por suicídio e 58% desses suicídios ocorreram com pessoas abaixo dos 50 anos de idade. Também há o dado de que em 2019 quase um bilhão de pessoas viviam com algum tipo de transtorno mental, sendo adolescentes 14% dessas pessoas. Não darmos atenção à saúde mental custa vidas. É um preço muito alto.

Com certeza se a saúde mental recebesse mais atenção apropriada muitas pessoas com transtornos mentais teriam recebido cuidados adequados e isso evitaria, sem dúvida, muitos suicídios. Se negamos a realidade e a necessidade de se cuidar da saúde mental continuaremos a viver mal e isso pode gerar sofrimentos tão intensos que suicídios continuarão altamente presente nas tristes estatísticas de mortes.

Ouço de muitos médicos clínicos que percebem em seus pacientes a necessidade deles de procurarem algum tipo de tratamento para transtornos mentais e quando os médicos comentam tal coisa com eles recebem reações negativas. Os pacientes ficam aborrecidos e irritados quando é chamada a atenção que algo em suas vidas psíquicas não vai bem e muitos decidem por fechar os olhos e não pensar sobre isso. A questão é que fechar os olhos não faz com que um problema deixe de existir.

Falta também mais acesso à saúde mental. Na rede particular aqui no Brasil há profissionais dos mais variados tipos, mas na rede pública ainda falta muito. No entanto, o número de pessoas que dependem da rede pública é bem alto e também por lei é assegurado que o cidadão receba todos os atendimentos necessários, inclusive da saúde mental. Porém, não é o que acontece. Falta exigirmos mais. Precisamos também fazer a nossa parte por exigir mais do que recebemos pelos nossos altos impostos.

Agora, no Setembro Amarelo, onde se fala sobre a necessidade da prevenção do suicídio é uma excelente oportunidade de falarmos também da saúde mental. Afinal, um está ligado no outro. Não há como separar esses dois assuntos. O suicídio, em sua grande maior parte, é reflexo da falta de saúde mental.

Saúde mental não é viver de maneira que não existam problemas, dificuldades e sofrimentos, mas implica em saber viver com problemas, dificuldades e sofrimentos de maneira que tudo isso não domine a vida. Ter saúde mental dá a possibilidade de passarmos pelas adversidades sem que elas custem caro, sem que custem a vida. Dificuldades todos teremos, mas como lidar com elas de forma não destrutiva é que a saúde mental pode nos proporcionar.

Aproveito para lembrar nesse Setembro Amarelo dos suicídios que são pessoas que até não se matam concretamente, mas se matam em possibilidades, em sonhos e vivem muito mal. Nem todo suicídio é concreto, mas muita gente se mata por dentro apesar de continuar a andar por aí, a trabalhar, etc. Elas funcionam, mas não vivem propriamente dito. Essa forma de suicídio, por assim dizer, é algo muito sério e que deveria nos alertar que não precisamos viver tão mal assim. Está mais do que na hora de aprendermos a viver melhor, está na hora de falarmos sobre isso tudo.


Saúde mental falada e saúde mental vivida

 



Desde a chegada da pandemia em 2020 nunca se falou tanto sobre saúde mental. Pelo fato de muitas pessoas terem ficado mais ansiosas, deprimidas e por muitos outros mal-estares como consequência do isolamento e do medo que foi imposto pelo clima de terror a procura pela saúde mental foi alta. Na mídia mesmo a saúde mental estava frequentemente presente e continua até hoje. Ao contrário de antes, quando se havia certa vergonha e impedimentos de se falar sobre saúde mental, agora ela é conversa que domina os diálogos corriqueiros entre as pessoas.

Antes da pandemia não se falava tanto assim. Algumas pessoas ficavam encabuladas de admitir que faziam algum tratamento visando a melhora ou a mitigação dos sofrimentos mentais. A mídia também não colocava esse assunto em pauta com tanta frequência, mas as coisas mudaram. Compreender que saúde mental é uma necessidade fundamental que interfere nas nossas vidas profissionais, familiares e sociais é atualmente de conhecimento geral.

Ficou até mesmo ‘chique’ as pessoas falarem que fazem análise, psicoterapia, tomam remédios psiquiátricos, etc. É até esperado que as pessoas debatam sobre o mundo ‘psi’. Só que, infelizmente, esse assunto está presente mais na boca do que no coração das pessoas. Ou seja, está mais nos discursos do que numa real dimensão da experiência. Discursos podem ser lindos, mas só viver verdadeiramente a experiência que realmente transforma.

Aliás, no início da pandemia muito se falava que a humanidade como um todo ia mudar, que a política ia ser mais humana, que os relacionamentos interpessoais seriam modificados para melhor, tudo porque a pandemia teria como consequência buscarmos mais a saúde mental. No entanto, as pessoas, a política e os relacionamentos mudaram muito pouco. Alguns nem mesmo mudaram.

Isso ocorre porque ao mesmo tempo que se fala sobre saúde mental como nunca antes, o número de pessoas que realmente se engajam com seus tratamentos é pequeno. Em outras palavras: a procura por tratamentos ‘psis’ é ampla, mas a permanência nesses mesmos tratamentos é passageira. Sendo curto, esses tratamentos não têm como ser eficazes. No mundo ‘psi’ todo tratamento é um processo que demanda tempo, tolerância e dedicação. E uma boa dose de coragem também.

Uma análise, por exemplo, requer que a pessoa tenha coragem de se deparar consigo mesma, com suas angústias e tenha paciência para esse processo. Precisa também tolerância às frustrações e que aprenda em se responsabilizar pela própria vida ao invés de muitas vezes sentir que é vítima de tudo e de todos. Como pode ver não é mesmo algo que se dá rapidamente, mas implica em todo um envolvimento com o próprio processo que vai se desdobrando ao longo de uma análise. São poucos os que ‘aceitam’ isso. Grande parte das pessoas querem uma mágica, algo que as livre delas mesmas. Nenhum tratamento pode curar alguém de ser a si mesmo.

Remédios psiquiátricos precisam ser ajustados ou trocados conforme o tratamento avança e não são uma operação matemática onde dois mais dois é sempre igual a quatro. Mais uma vez requer paciência e tempo. Não existe mágica nem atalho quando nos referimos à nossa saúde mental. Só há trabalho e muito.

Portanto, apesar de haver tanta conversa sobre saúde mental há pouco comprometimento de fato. Enquanto isso não mudar, não evoluir para o próximo passo, as coisas em nossas vidas e no mundo permanecerão sendo as mesmas.