domingo, 7 de fevereiro de 2021

O menino do barril

 

    Saiu a triste notícia de que na cidade de Campinas foi encontrado em uma casa um menino acorrentado dentro de um barril. Nu, faminto, sem poder deitar-se ou ficar totalmente de pé foi mantido por pelo menos um mês nessas condições, sendo alimentado com cascas de bananas e fubá cru. Os vizinhos fizeram denúncia e parece que autoridades já tinham conhecimento desse fato há algum tempo e não tomaram nenhuma atitude. Quando os policias, enfim, foram no local encontraram uma situação miserável e assustadora.
    O pai do menino o torturava e como cúmplices havia sua madrasta e sua meia-irmã mais velha. Naquela casa havia tortura e ninguém fez nada. Será que era casa de fato no sentido de lar? Será que era família de verdade? Podemos pensar que não é porque algumas pessoas compartilham algum laço sanguíneo que isso significa que são uma família. Nem o fato de dividir o mesmo teto torna um grupo de pessoas uma família. É preciso mais para ser família, é preciso humanidade.
    Como sempre costumo dizer aqui nos textos ninguém nasce humano, mas torna-se humano através dos relacionamentos. Porém, não qualquer relacionamento, pois é preciso que estes sejam relacionamentos sadios. Sem isso não desenvolvemos nossa humanidade. É que aprendemos ser humanos com outros humanos. Família necessita de humanos e quando não há os últimos não tem como se formar uma família de fato. 
    O menino no barril me lembra o seriado mexicano Chaves que tanto sucesso faz aqui no Brasil. Chaves era um menino sem pai nem mãe que passava algum tempo dentro de um barril numa vila. Era criança abandonada, mas no seriado contava com os vizinhos que o ajudavam, mesmo que de maneira torta. No fim havia o amor entre os personagens do seriado e ele não estava acorrentado. O menino do barril de Campinas tinha outra história, mais macabra.​
    Sofrendo desnutrição e desidratação o menino do barril foi levado ao hospital onde já conseguiu ganhar alguns quilos. Talvez essas marcas físicas possam ser revertidas. Talvez seu corpo se recupere bem até porque sendo criança tem muito mais condições de recuperação. E as marcas psicológicas? Essas cicatrizes são mais difíceis de apagar. Elas podem se infiltrar e contaminar em como o menino se vê, se trata, se relaciona consigo e com o mundo e podem ser muito nocivas. Essas marcas não têm como ser apagadas, mas podem ser transformadas. O menino já sofreu tortura, mas não precisa carregar torturas psicológicas para o resto da vida. O que vai acontecer não sei, mas é possível haver transformação com muito trabalho.
    Quando vemos notícias assim nos sentimos desestabilizados e podemos facilmente perder as esperanças na humanidade. Contudo, é justamente o contrário que se faz necessário. Que não nos deixemos contaminar por aquilo que não é humano. O que é primitivo e bestial não pode nos deixar acorrentados e imobilizados dentro de nós mesmos. Que possamos sair de nossos barris e buscar sempre se tornar humano. É um trabalho a que todos nós somos convocados a realizar. Não dá mais para permanecermos no barril.

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