Todos
sabem que um ser humano desprovido de nutrição, de higiene, de saúde, de
direitos, não tem como desenvolver seu potencial. Entretanto, há uma falta que
nem todos se lembram e que é fundamental: relacionamentos humanos de qualidade.
Sem isto não existe a menor chance de um ser humano tornar-se verdadeiramente
humano. A condição humana não nos é fornecida biologicamente, precisando ser
então desenvolvida e continuamente fortalecida. Sem relações de qualidade
ficamos em falta de algo básico que afeta e influencia como funcionamos na
vida. Infelizmente, relações humanas de qualidade são mercadorias raras.
Veja-se,
por exemplo, o alto número de jovens ao redor do mundo que em vez de se
relacionarem uns com os outros preferem se relacionar e dialogar com máquinas
que pretendem ter uma “personalidade”. Há até namorados eletrônicos, que são
dispositivos que fingem ser um(a) namorado(a) entabulando conversas
superficiais. São aplicativos desenvolvidos para mitigar a solidão que muitos
sentem. Apesar de ficarmos maravilhados com tecnologias cada vez mais
fantásticas temos que compreender que trocar relações reais por máquinas
demonstra que algo não vai muito bem.
Até
mesmo entre os jovens que saem juntos, que estão acompanhados e que o
sentimento de solidão parece estar bem longe a coisa não é bem assim. Apesar de
estarem juntos, faltam relacionamentos. O que esses jovens fazem é alimentar
apenas certo prazer sensorial, ficando juntos, beijando-se e até transando, mas
sem ninguém saber ao certo quem é o outro e nem conseguirem entabular de fato uma
conversa mais íntima. Hoje estamos solitários no meio de uma multidão e os
relacionamentos são muito vagos e superficiais, tendo como objetivo apenas uma
satisfação sensorial e primitiva.
Ninguém
nasce sabendo como se relacionar com o outro, isso é aprendido. Porém, cada vez
mais essas aprendizagens estão escassas. Isso acontece, entre inúmeras razões,
porque se relacionar demanda algo muito doloroso, que é saber tolerar
frustrações. Uma pessoa conseguir suportar dignamente uma frustração está muito
difícil. Parece que frustração tornou-se uma doença que precisa ser erradicada
o mais rápido possível. No entanto, não existe como nos relacionarmos quando
não há capacidade para tolerar as frustrações e para aprendermos a tolerá-las dependemos
de relacionamentos de qualidade.
Uma
criança pequena é dominada por impulsos narcisistas e egoístas. Não há nada de
errado com isso, todas as crianças são assim. Porém, à medida que as crianças
vão crescendo e se relacionando com pessoas ao redor elas podem ir percebendo
que precisam abandonar o narcisismo para poder abrir espaço às pessoas que amam
e pelas quais gostariam de ser amadas. A criança, quando há relacionamento
verdadeiro, percebe que não são apenas os seus interesses que contam, os seus
prazeres, mas que há muitas outras pessoas que precisam também ser levadas em
consideração. Elas podem deixar de desejar apenas os prazeres mais primitivos e
sensoriais para irem construindo toda uma nova forma de se relacionar considerando
o outro e tolerando a frustração de ter que ir abandonando o narcisismo.
Quando
essas relações não existem ou não são de boa qualidade cria-se uma falta básica
que impede as pessoas de tolerarem as frustrações e por consequência os
relacionamentos serão muito superficiais. O outro é visto como um objeto para
atingirmos nossos prazeres. Por isso que os dispositivos de relacionamentos
artificiais fazem tanto sucesso, são apenas objetos que podem ser facilmente
controlados. Sem solucionar essa falta básica não tem como haver humanidade
digna desse nome.
Nenhum comentário:
Postar um comentário