Uma das maiores tragédias que pode nos acontecer é quando contamos mentiras para nós mesmos. Isso é muito mais comum do que se imagina e todo mundo, em maior ou menor grau, conta mentiras para si próprio. Ao contar mentiras não lidamos com a realidade, enquanto que a vida só pode acontecer sempre com base na realidade.
Por que contamos tantas mentiras para nós mesmos? A mentira é prazerosa e não exige compromisso com nenhuma realidade. Com a mentira podemos nos enganar e por mais incrível que pareça viver sob enganos é algo que gera prazer. Com a mentira podemos contar a história que for, a justificativa mais mequetrefe que existir e achar que se trata da realidade. Triste, porém nada incomum as coisas serem assim.
Um exemplo corriqueiro que acontece frequentemente é quando uma pessoa precisa fazer algo, mas encontra todas as desculpas do mundo para não fazê-lo. Essas desculpas são mentiras que vamos contando e que tomamos como verdades. A mentira está sempre a serviço de uma não mudança, de uma não transformação, mantendo tudo como sempre esteve mesmo que não seja bom.
Sabe quando uma pessoa diz que não pode se exercitar por isso ou aquilo? Bom, na maior parte das vezes essas “razões” para não se fazer algo que se necessita são mentiras tomadas como verdades. E se a pessoa que as conta acredita nelas e fica nelas vai criando toda uma falsidade em sua vida, tornando cada vez mais difícil encarar a realidade. Nunca faltam desculpas, nunca falta criatividade para arranjar as mais variadas justificativas para o que quer que seja.
No entanto, se pararmos de contar mentiras temos apenas um caminho a seguir, que é em frente, só que este caminho sempre leva ao novo e desconhecido e sempre exige de nós. A mentira só leva ao conhecido e já bem estabelecido; a verdade sempre leva ao desconhecido. Não é à toa que a verdade seja sempre mais assustadora e gere inúmeras resistências.
Podemos ver isso muito claramente num processo de análise. O paciente que procura por uma análise sofre por algo, carrega um incômodo que trava a vida ou a faz ficar insuportável. Ao chegar na análise o analista escuta seu paciente, mas não o deixa numa posição passiva, e sim, aponta que o paciente tem responsabilidade pela situação em que se encontra e isso
geralmente levanta muitas resistências. O que faz muita gente correr da própria análise é que se faz necessário encarar determinadas verdades de suas vidas que antes não eram encaradas, mas encobertas com mentiras.
Ao mentir sobre a posição em que se coloca, uma pessoa pode ficar como vítima e não precisa fazer nada, pode apenas “sofrer”. Torna-se uma vítima do destino. Isso é até prazeroso. Agora, sair dessa posição, se responsabilizar pelo lugar onde vai se colocar daqui para frente demanda mudar, transformar como se vinha vivendo. Implica sair da posição de vítima para passar a ser alguém que começa a se
responsabilizar pela própria história. Só que quando nos libertamos das mentiras não sabemos o que a verdade abrirá à nossa frente, não sabemos quem nos tornaremos. Por medo do desconhecido, do que pode ser descoberto, muitas pessoas se acomodam nas mentiras que contam, sem parar, sobre si próprias. É uma tragédia.