segunda-feira, 17 de maio de 2021

As várias formas da violência

 


          Esses dias recebi uma ligação de telemarketing insistindo para que eu adquirisse determinado cartão de crédito. Respondi - educadamente, diga-se de passagem - que não tinha interesse. A moça então começou a falar sobre as vantagens do tal cartão como se eu não tivesse já declinado da oferta. Mais uma vez eu afirmei que não queria. Então ela perguntou se eu já tinha cartão e quando eu lhe disse que já tinha ela queria saber quanto de taxa eu pagava e quais benefícios eu tinha do meu cartão. Disse a ela que nem precisávamos estender a conversa porque eu não tinha interesse em outro cartão e agradeci a oferta. Ela então iniciou perguntas como Você gosta de viajar? Você compra on-line? Você quer receber prêmios?  E eu, mais uma vez, a lembrei que não tinha interesse em adquirir o produto. Ela não me ouvia ou fazia que não me ouvia e continuou o questionário: Você trabalha com quê? Tem seguro de vida?. Isso tudo me fez pensar nas mais variadas formas de violência que existem por aí.

          Nem sempre a violência é um embate físico ou de xingamentos, mas pode assumir várias formas. Sei que operadores de telemarketing são pagos para nos ligar e fazer de tudo para que compremos determinados produtos ou serviços, mas chega uma hora que isso se torna invasivo, inconveniente e violento. Invasivo porque nos invade em nossos momentos de trabalho, de lazer e de vida; inconveniente porque incomoda na insistência em oferecer o que não pedimos ou não queremos; e, por fim, violento, porque ataca nossa liberdade de sermos ouvidos e respeitados. Não podemos fechar os olhos para o fato de que essas ligações são, na verdade, uma forma de violência.

          Outra forma de violência a que diariamente somos submetidos é quando estacionamos o carro na rua e somos “obrigados” a pagar para que alguém fique cuidando do veículo. Tudo bem que são apenas moedas que muitas vezes damos e não farão tanta falta, mas isso é violento. A rua é pública e todos temos o direito de usá-la e não podemos tirar dela lucro sem a devida permissão legal. Se, em algumas vezes, nos negamos a pagar para que o carro seja “olhado”, podemos correr o risco dele ser riscado. É ou não violência? Na verdade, é um roubo, estamos sendo assaltados.

          Sei que muitos dos que olham carros na rua são pessoas carentes e necessitadas, não desconheço este fato tão triste, mas estamos todos desamparados: tanto as pessoas necessitadas quanto as que são obrigadas a ser roubadas. O assalto, no caso, não foi com uma arma ou ameaça direta, mas foi uma violência de qualquer forma.

          Somos constantemente submetidos às mais variadas formas de violência e muitas vezes não percebemos. É uma situação que exige que prestemos mais atenção, até porque nós também vamos exercer violências em muitos momentos sem ser, originalmente, nossa intenção. Isso tudo empobrece a qualidade dos relacionamentos que vemos dentro das famílias, do trabalho e da sociedade. Perdemos muito ao não reconhecer quando a violência, disfarçadamente, se faz presente. Desenvolver uma consciência sobre como nos relacionamos é fundamental e um trabalho de todos.

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