segunda-feira, 2 de novembro de 2020

Raízes fundas


    Quando paramos de buscar a felicidade em outra pessoa podemos nos abrir para a possibilidade de encontrar felicidade em nós mesmos. Uma das coisas mais comuns de se encontrar são pessoas reclamando de seus parceiros amorosos, de eles nunca os satisfazerem plenamente. Primeiro porque ninguém pode satisfazer o outro completamente. Segundo, pode ser que o(a) parceiro(a) amoroso não seja uma pessoa que consiga se comprometer de fato. E terceiro ponto que precisa ser pensado é que talvez se espera do outro o que não é possível.
     Quando ocorre de alguém esperar do outro o que o outro não tem como dar sempre haverá infelicidade. Isso acaba por pesar o relacionamento, pois termina em exigências e relacionamentos não são um bom lugar para exigir o impossível. Aliás, nenhum lugar é. Há tanta gente junta, mas mais por conveniência ou por acreditar que vão encontrar no outro uma casa. A grande verdade é que as pessoas estão sem casa própria e buscam no outro um lugar para habitar e se sentir no lar. É até comum ouvir ou ler por aí declarações de amor como “agora que encontrei você, me sinto em casa”. Isso é muito bonito poeticamente, mas nada verdadeiro. Não podemos, jamais, acreditar que vamos habitar no outro e quem acredita nisso se engana. Quem se engana, por sua vez, uma hora, cedo ou tarde, acaba em desilusão.
     Querer habitar no outro é sempre uma ilusão. Talvez uma tentativa de voltar a viver uma experiência muito similar que já vivemos na vida, que era quando éramos bebês. O bebê precisa viver dentro de sua mãe ou alguém que exerça a função parental. O bebê não tem uma mente própria organizada que permita que ele tenha uma casa para habitar. Ele precisa que alguém empreste a casa (mente) para ele por um tempo e assim, nessa casa, ele terá tempo e segurança para crescer. Depois, ele poderá sair desta casa que já não é mais dele para construir a sua própria.
    Essa experiência sempre nos deixa marcas e muitas saudades. Muitos casais tentam reviver isso em seus relacionamentos, mas acabam sempre se frustrando. É que uma vez que crescemos não podemos mais habitar dentro de outro, mas precisamos construir a casa própria. Não podemos, também, exigir que o outro nos ofereça um lar. Quando alguém insiste nisso num relacionamento insiste na verdade na ilusão. Como se algo do passado pudesse ser recuperado e imobilizar o tempo numa época que só tínhamos necessidade de habitar e não de construir a própria habitação. Ilusão não se sustenta, sempre acaba.
    Infelizmente, há muitas pessoas que iniciam seus relacionamentos amorosos baseados na ilusão. Quando encontramos alguém que vale a pena na vida são duas habitações que se encontram e formam uma terceira, conjunta, dos dois. Porém, ninguém pode abdicar das próprias fundações já que são elas que nos sustentam verdadeiramente. Rupi Kaur escreveu: “Foi quando desisti de procurar uma casa dentro das pessoas e ergui a base de uma casa dentro de mim mesma que descobri que as raízes mais profundas são aquelas entre o corpo e a mente que decidem viver como um”.

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