segunda-feira, 23 de março de 2020

Os efeitos do terror sobre as crianças


      Conversando com um médico pediatra ele me falou dos efeitos que a pandemia do coronavírus está tendo sobre as crianças. Ele citou que muitas delas estão apresentando sintomas como enjoos, mal-estar, vômitos e várias outras coisas, mas que não apresentam nada que fosse identificado de origem orgânica. Isso significa que elas não estão fisicamente doentes. Algumas crianças deixaram de se alimentar, outras pedem para ir ao médico de maneira desesperada porque acreditam que estão morrendo e outras vivem um pânico generalizado, causador de inúmeros sofrimentos. Como não se trata de algo orgânico precisamos nos voltar para o psíquico.
     ​Esse clima de medo que está instaurado não afeta somente os adultos, mas os pequenos também. Se para os adultos já está difícil, imagina então para as crianças e jovens que veem e sentem todo esse pânico. Todas aa crianças e jovens são dependentes dos adultos. Eles não sabem cuidar de si próprios, não possuem condições para tal. Dependem do cuidado e olhar de alguém adulto. Porém, se os adultos que os rodeiam estão com medo e tomados por uma ansiedade sem nome isso vai afetá-los muito.
     ​Quando uma mãe e um pai vivem o “clima de fim de mundo” a criança certamente perceberá, mesmo que isso tudo não seja falado diretamente. As crianças não são debiloides, elas percebem o que se passa ao redor e a “temperatura emocional” é fácil de ser notada. O problema está no que elas vão fazer com o que percebem, porque não têm estrutura para poder digerir conteúdos emocionais tão pesados e difíceis. Dentro das crianças esse pânico todo pode se transformar em algo muito aterrorizador, digno dos piores filmes de terror.
     ​É que por não possuírem condições de pensar sobre os acontecimentos de maneira mais clara ficam com as fantasias ativadas ao máximo. E essas fantasias conterão os piores medos e ansiedades dos pequenos. Então, eles acabam lidando com algo interno de extrema violência e do qual é impossível escapar. Como alguém escapa do que está dentro?
     ​Por haver um conteúdo interno tão apavorante que não é digerido isso se reflete no corpo. Quando ficamos mal com algo que é da mente é muito comum sentirmos os reflexos no corpo. Afinal, mente e corpo estão ligados, não há uma separação rígida. 
      ​O que elas necessitam nesses momentos é que alguém possa ajudá-las a pensar sobre a situação que vivem. Conversar com elas, deixar que seus medos possam se transformar em palavras ou serem demostrados através do brincar. Já dizia uma antigo ditado “Quem canta, seus males espanta”. Nesse caso, quem coloca em palavras ou em brincadeiras seus medos e angústias espanta muitos fantasmas. É preciso que alguém consiga ouvir o que a criança tem a dizer e ouvir é muito mais que um ato passivo. É uma atitude de ouvir, compreender e conversar. Poder ajudar a criança a conter o próprio medo, a lidar com ele de uma forma menos custosa.
     ​Quando a criança pode ser ouvida, sem condenações ou julgamentos, ela pode aprender a ver seus medos com outros olhos, pode aprender uma coisa de extrema importância para levar a vida adiante: discriminar o que é real do que é fantasioso. Isso é fundamental. Se ela for cuidada, se seu psiquismo for cuidado e levado em consideração, ela poderá também aprender a se cuidar e a levar a sua mente a sério. Vivemos, atualmente, um momento propício para avaliar como lidamos com as crianças e como as ajudamos a se desenvolver.

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