segunda-feira, 17 de setembro de 2018

A Desgraça e o Ipê




            Na quinta-feira passada estava no centro de Londrina e vi que uma multidão se reunia numa esquina olhando para cima. O trânsito ficou parado, carros da polícia e bombeiros trancavam as ruas e as pessoas exalavam uma mistura de medo, angústia e excitação. Alguns já sacavam o celular e apontavam para cima. Uns riam, outros colocavam a mão na boca como se estivessem muito ansiosos. Quando olho para cima vejo um homem, parece que jovem, do lado de fora da janela de um edifício ameaçando se jogar. Uma cena de suicídio estava prestes a acontecer.
            Apesar de ser extremamente triste se deparar com aquela situação de uma pessoa, provavelmente desesperada com uma carga de sofrimento alta, ameaçando se jogar me surpreendeu e me deixou desconfortável perceber a reação das pessoas assistindo a cena. Tinha pessoas que até gritavam e ensaiavam um coro de “pula, pula”, outros caçoavam do sujeito do lado de fora da janela dizendo que ele era um perdedor e muitos, quase toda a maioria, estavam com seus aparelhos celulares levantados filmando a cena e mais ainda, esperando poder capturar o momento fatal.
            Sim, havia pessoas torcendo para que o homem pulasse. Claro que também havia aqueles que ficaram incomodados e com empatia pelo sujeito, mas foi muito deprimente notar que a grande maioria queria um show, uma cena para poder registrar e depois compartilhar como se não fosse nada demais. Isso me fez pensar no quanto há alegria na desgraça alheia. Parece que há um prazer em ver o outro numa situação tão ruim e comprometedora. Por que?
            Quando se vê o outro numa situação pior faz com que muita gente se sinta bem consigo própria. Dizem para si “Posso estar ruim e mal, mas esse sujeito está pior, então não estou tão mal assim” Essas pessoas se identificam com o sujeito que está desesperado, mas também se comparam de uma maneira que as façam se sentir melhor ou por cima. Alegram-se que existe gente mais desesperada. Uma cena de acidente, por exemplo, sempre junta vários transeuntes, mas poucos são os que ajudam ou oferecem apoio sendo a maioria curiosos e sedentos pela desgraça alheia. Estão procurando uma confirmação que a vida deles não está tão ruim assim.
            Triste notar que o funcionamento dessas pessoas torna uma situação tão delicada, tão complexa e perigosa quase em um entretenimento. E na era dos smartphones com câmeras precisas o que se registra é o desejo pela desgraça para assim se sentir bem. Quando um lindo ipê no mesmo centro de Londrina abriu-se maravilhosa e fartamente em flor não vi tanta gente ir registrar essa beleza. Passavam inconscientes de que estavam diante de uma mágica da vida muito preciosa. Pois é, estamos nos esquecendo de nos conscientizar da beleza, do bom, daquilo que é vida e estamos com o olhar preparado para a morte e o sofrimento. Isso tudo forma a sociedade em que vivemos e devia nos alertar para nos transformamos urgentemente. Não perco as esperanças, contudo, porque sei que há pessoas buscando com seus olhares aquilo que nos torna humanos, que nos encanta e que buscam e trazem razão para se viver.

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